Uma garoa fina começa a cair do céu e faz com que a minha pele se arrepie sob as roupas, me obrigando a envolver o meu próprio corpo em um abraço enquanto observo Grisha parado diante de mim. Não posso deixar de notar que o homem parece ligeiramente assustado e hesitante, enquanto coloca a mão sobre o paletó, onde está guardada a caixa aveludada que ele tinha em mãos. Seus olhos estão marejados e a cada instante cogito a possibilidade de sair correndo de volta para o quartel. Entretanto, minha curiosidade e a voz dentro da minha cabeça a qual chamo de intuição gritam para que eu fique e escute o que ele tem a dizer.
–– Sabe, Sofia. Marco a amava como uma filha e faria de tudo para proteger você. –– Grisha passa a caminhar e eu o sigo. –– Foi isso que ele me pediu, que ficasse de olho em você.
Balanço a cabeça, ligeiramente confusa.
–– Nós nunca nem nos encontramos depois que ele morreu.
–– Eu sei. –– Ele suspira. –– Eu sei do que você é capaz, deduzi que não precisaria de mim. E realmente não precisa.
Ele faz uma pausa.
–– Mas... o fato de você ter encontrado aquele diário muda as coisas. Marco era... cauteloso com aquele maldito livro. O escondeu muito bem para que ficasse longe do seu alcance.
–– Se ele não queria que eu o encontrasse, então por que deixou uma nota para mim?
–– Ele não a subestimava.
Me calo diante de sua resposta. Há um silêncio nem um pouco confortável entre nós enquanto caminhamos pelas ruas estreitas de Shiganshina na calada da noite, apenas o som dos nossos passos ecoando ao redor. Me pergunto quanto disso é realmente necessário enquanto sigo a figura alta e esguia para onde quer que ele esteja me levando. Entretanto, Grisha Yeager e sua forma física não são nem um pouco intimidadores agora.
Aos poucos, a cidade vai ficando para trás quando atravessamos os portões, caminhando na direção oposta à pequena vila que há depois de Shiganshina. A pequena floresta se faz pouco visível no horizonte escuro e paro de caminhar no mesmo momento, perdendo a paciência no vento frio, desejando estar de volta nos braços quentes de Levi, debaixo dos cobertores.
–– O que é isso? –– Disparo para ele, que engole a seco. –– Não ligo para o que você vai dizer, só quero que me conte a verdade!
–– Eu não posso, Sofia! –– Grisha eleva sua voz trêmula e ergue as mãos na frente do corpo. –– Eu... Preciso proteger o Eren!
Balanço a cabeça veementemente em negativa, dando um passo para trás enquanto meus pensamentos tentam encaixar Eren nos segredos que envolviam meu pai e Grisha Yeager.
–– Do que você está falando? –– Minha voz soa ligeiramente mais aguda do que deveria. –– Seu filho não tem nada a ver com isso, ele ao menos conheceu o meu pai!
–– Isso é verdade, mas... –– Grisha hesita, tomando em suas mãos novamente a caixa aveludada que antes havia sido guardada no bolso interno de seu paletó e a aperta com firmeza nas mãos até os nós de seus dedos ficarem brancos.
Não posso deixar de pensar em como isso foi uma péssima ideia quando lágrimas começam a saltar de seus olhos. Francamente, o homem parece estar além de perturbado.
–– Essas muralhas... vão cair um dia, Sofia. –– Grisha ergue os olhos para mim. –– Você é inteligente demais para saber que há algo lá fora nos esperando mesmo sem ler o que está escrito naquelas páginas.
Minha cabeça parece girar outra vez. No entorno, não há nada além da vegetação rasteira e as lamparinas dos soldados da Guarnição indo de um lado para o outro no alto da Muralha Maria. Não posso deixar de pensar no que seria de nós no dia em que aquele muro caísse. Solto um longo suspiro e passo as mãos pelo rosto, me sentindo farta disso.
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O Rouxinol - L. Ackerman
FanfictionSofia sempre foi uma soldado exemplar e de habilidades notáveis, sendo uma das melhores armas da Divisão de Reconhecimento contra os titãs. Designada para missões dadas a ela pessoalmente pelo comandante Keith Shadis sob o codinome de Rouxinol, Sofi...