Capítulo 11 - Fim da Temporada

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A cada parabéns que recebia e agradecia com um sorriso e palavras cordiais, Morena morria um pouquinho. Era como se estivessem rasgando seu coração com gentileza, um elogio de cada vez. Não era possível que ninguém tivesse reparado que tinha algo errado na prova, que não só havia sido construída cuidadosamente para que Aleksey chegasse até o fim e não conseguisse obter o título; mas que também tinha sido construída para que só Morena se titulasse. Fazia pouco mais de meia hora do fim da prova, e quanto mais ela pensava, mais claro ficava: do Al'Saghir na seção de fogo, uma criatura com a qual só ela teria total familiaridade, à prova da água, tão trivial para uma titulação, os desafios foram moldados para ajudá-la no que tinha dificuldade, e em potencializar o que já dominava. Era uma farsa, um teatro cruel desenhado para causar o máximo de dor possível. Ela não queria mais aquele título. Não queria se tornar Extraodinária pela vontade de Yakov Yulievich.

Ela se desvencilhou do emaranhado de pessoas com uma desculpa qualquer e caminhou até a mesa onde serviam vinho quente e outras bebidas. Parecia estar dentro de um sonho, assistindo aos acontecimentos de longe, o corpo se movendo contra sua vontade. Agradeceu a seja lá quem enfiou um copo de quentão na sua mão e tomou um gole. Onde estava Ivan? Onde estava Aleksey? Onde estava sua irmã? Onde estava o resto da sua turma? Parecia que ela não conhecia ninguém que estava naquele pátio, sozinha e sem saber para onde ir.

— Masha! — Tamara a chamou de algum lugar à esquerda. Ela se aproximou com passos largos e se jogou contra Morena em um abraço, da mesma forma que fazia quando era pequena. — Eu não consegui te encontrar em lugar nenhum, fiquei com medo de você ter desmaiado depois da prova.

— Está tudo bem, Mara. — Morena abraçou a irmã de volta, apertando-a contra si, aliviada. — Eu estou bem.

Tamara se afastou, ainda com a irmã entre seus braços, e abriu um sorriso gigantesco, o orgulho estampado em seu rosto. Morena sentiu uma pressão nos olhos, piscando algumas vezes.

— Eu estou tão orgulhosa de você! Tão, tão, tão orgulhosa! — ela exclamou. — Mamãe também estaria orgulhosa. Estou muito feliz por você, Extraordinária com um ano de antecedência! É inacreditável.

A irmã estava radiante, a pele negra refletindo a iluminação bruxuleante do pátio, fazendo parecer que a luz vinha dela, os cachos vermelhos como uma auréola em sua cabeça, a felicidade quase palpável. Ela não tiraria aquela animação de Tamara, e sentiu o ódio subir pela garganta. Até isso Yakov tinha roubado dela, a felicidade compartilhada com a irmã, a certeza de que sua mãe estaria orgulhosa se ainda estivesse viva, a alegria de conseguir algo que sempre quis.

— Realmente, parece até que tem algo errado — Morena fez piada, tentando não deixar transparecer nenhum dos seus sentimentos. Ela era a irmã mais velha, não podia deixar Tamara preocupada.

A irmã gargalhou junto com ela, mas depois a encarou, e uma ruga de preocupação surgiu em sua testa. Tamara a abraçou novamente, e Morena encostou a cabeça em seu ombro, suspirando pesadamente, apertando-a contra si. Não lembrava quando Tamara tinha ficado tão alta, quando sua irmãzinha havia deixado de ser uma menininha com janelinhas nos dentes e se tornado um protótipo de adulto, mais alta que a própria Morena. Era possível sentir saudades de alguém que ainda estava com você? Porque só de pensar que no próximo ano não a veria com tanta frequência, que não estaria ali, na Azote, junto à sua irmã, sentia uma dorzinha no peito.

— Você quer que eu pegue algo para você comer? — perguntou Tamara, ainda no abraço, o queixo encostado na cabeça de Morena. — Ou quer que eu cumpra meu papel de irmã mais nova e mantenha esses interesseiros distraídos com o meu grande poder de falar muito sobre nada em particular? Você realmente não parece bem, acho que é melhor achar Ivan pra vocês irem embora e poder descansar.

Tratado sobre Tempestades e outros fenômenos extraordináriosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora