Capítulo 21. Linfonodo Sentinela

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– Eu não sou a única que está procurando pelo fim da doença. – Revelei, fazendo uma sobrancelha se erguer no seu rosto. – Alguns Áulicos também estão. E eles podem nos ajudar.

Kadi abriu o sorriso de alguém que sabia que estava prestes a encarar o perigo – e que não fugiria dele.

– Então vamos fazer outra parada antes do núcleo?

Confirmei com a cabeça.

– No Distrito de Proteção.

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Depois de dois noxdiems de viagem, nós estávamos às portas de um dos mais poderosos territórios de Ítopis e, quanto mais eu o encarava atrás das janelas da nave, mais sentia um tremor se apossar dos meus joelhos. Eu nunca tinha pisado ali antes, mas então por que sentia como se tivesse jurado que não o faria? Talvez fosse por causa daquela sensação de iminência de morte que pairava ao redor até mesmo para além dos limites da sua atmosfera... E por todos os avisos que minha mãe me deixara em suas cartas sobre aquele lugar.

– Você deveria ficar na nave. – Sugeri para Kadi, fingindo que eu tinha uma coragem que não sabia se tinha.

– Se você não voltar, eu estou morto. – Ele deu de ombros. – Ajudá-la é a minha melhor alternativa. – E eu não ia negar o auxílio.

Desembarcamos diante dos portões do palácio do Distrito de Proteção. As formas da construção eram curvas e suaves, seguindo uma espiral até o topo da torre central, como se ali tivesse sido abandonada a concha de um gigantesco ser marinho que já não precisava mais da sua proteção; e, antes de ser destruída pelo tempo, fora aproveitada pelos Áulicos.

Antes que os guardas à frente dos portões pudessem me alvejar eu pronunciei uma palavra, uma senha, que minha mãe tinha anotado para mim: compatibilidade. E então eles me deixaram passar. Caminhei pelos corredores curvos com a cabeça mais erguida do que eu achava conseguir e ouvi meus passos ecoando pelo vazio, conforme eu seguia o mapa desenhado naquelas cartas e então cravado na minha mente porque eu nunca queria correr o risco de me perder na casa de um Áulico.

Quando irrompi pela porta do salão central, pisar ali pareceu mais certo do que qualquer outra coisa que eu tinha feito até agora.

Seres brancos como nuvens e esguios como filetes de água seguravam com seus pseudópodes leitosos armas diretamente apontadas para os nossos rostos. Eram soldados fageines, criaturas cujo papel principal era proteger o Império de invasores, tanto externos, quanto internos. Seus rostos eram massas ovoides e pálidas envolvidas por películas cristalinas que permitiam à vida boiar dentro dos seus limites. Entre a camada transparente e aquela branca como marfim logo abaixo se acumulavam pequenos buracos negros, pupilas, que absorviam toda a luz ao redor pela chance de nos enxergar em um dos raios dela. Quando os fageines nos perceberam, essas pupilas se aglomeraram em crateras, focando como se pudessem nos perfurar com a escuridão que continham atrás... E com os projéteis de suas armas.

Mas, antes que pudessem disparar, uma criatura emergiu por trás dos soldados, parando tudo no controle da sua presença. Era como se ela tivesse sido atraída por mim, flutuando com a delicadeza de um dente de leão soprado pelo desejo de alguém e etérea de uma forma que não parecia pertencer a mundo nenhum. O tecido que a cobria parecia ter sido feito de pó de estrelas, com fendas laterais por onde emergiam seus pseudópodes e decorado com broches opulentes que a diferenciavam dos demais seres. Ela era a Áulica do Distrito de Proteção, uma criatura cujo nome eu já tinha ouvido e lido algumas vezes antes: Bleine.

– Você tem os olhos de Gaxy... – Ela sibilou na minha mente, porque os fageines não falavam com suas vozes, mas com ideias puras, que afloravam dentro mim como palavras nunca teriam sido capazes. Bleine imediatamente me trouxe a imagem do rosto da minha mãe, com aqueles seus olhos insilenciáveis afogados na mesma fonte de mel que os meus... E eu pisquei para escapar daquela memória.

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