18.

19 1 2
                                    

18.

Tiago chegou à conclusão de que não deveria ter ido dar aula naquele dia. As emoções dele estavam a mil quilômetros por hora, o coração retumbando no peito, a ansiedade o estrangulando. Tinha o dinheiro em mãos. Graças aos seus pais, como os amava! Agora, precisava manter a calma.

Tinha voltado da casa de um dos adolescentes para quem dava aulas particulares. Uma mãe havia insistido tanto que ele se sentiu na obrigação de ceder por conta dos dias em que deixara de dar aulas particulares. Acontece que o filho dela estava precisando de ajuda com a matéria de Eletrônica Digital. Ao ver as notas do menino pessoalmente, Tiago teve a sensação de que o buraco era muito mais embaixo.

O professor suspeitava que não houvesse possibilidade de o menino se recuperar, mesmo com suas orientações. Veja bem, o garoto tinha a incrível pontuação de três pontos nos primeiros dois bimestres. Eram quatro bimestres, num todo. Em cada bimestre, a nota mínima era a de seis pontos, para que no final se somassem vinte e quatro pontos para a aprovação. Sabe o que era pior? Ele só tinha os seis pontos no total porque na recuperação bimestral conseguiu substituir o seu grande e redondo ZERO do segundo bimestre.

Tiago ficou pelo menos quarenta minutos explicando a ele a função de cada circuito lógico. O aluno havia contado para Tiago que achava esse assunto deveras complicado e que tinha dificuldades com as tabelas verdade. Nesse momento, Tiago concluiu que aquele tal buraco não tinha fundo. Respirou profundamente. Decerto, não deveria ter saído de casa para ir dar aula.

Lembrou-se que noite passada Jessica tinha implorado para dormir com ele. Não aceitou e agora se arrependia, poderia estar menos tenso, um pouco menos estressado. Tinha um tempo que não dormia com Jessica, desde que descobrira que ela andava gastando o dinheiro que ele dava a ela com jogos de azar. Ficou possesso ao descobrir isso e deixou de mandar para ela o dinheiro que sua mãe lhe mandava todo mês. Não se orgulhava de receber aquele dinheiro da mãe, mas não mediu esforços para ajudar a amiga necessitada.

Desde que começara nos jogos de azar, Jessica perdeu tudo. Perdeu namorado, amigos e dinheiro. O vício a fazia pegar dinheiro emprestado e não pagar, fazia ela roubar objetos na casa dos outros e vender. Era como se ela estivesse viciada em cocaína, tudo que ela tinha se tornava pó. Tiago fora o único que ficara do lado dela. Confiaria sua vida a ela de olhos vendados.

Contudo, seu apreço por Jessica vacilou no retorno para casa. Reconheceria aquele rosto nojento em qualquer lugar, um homem ao lado de Jessica.

— O que ele quer? — direcionou a palavra a Jessica assim que saltou do carro.

— Podemos entrar pra conversar? — Felipe descruzou os braços e andou alguns centímetros na direção de Tiago, ele não recuou.

— Não, não podemos —Tiago fez que ia entrar, Jessica segurou seu braço e o encarou.

— Tiago... escute pelo menos. Vocês têm um objetivo em comum. Nós três temos.

Tiago mapeou o rosto de Jessica enquanto tentava absorver o que ela havia falado. Notou que estava implícito algum tipo de proposta que Felipe faria.

— Tá certo...

Acomodaram-se na sala. Minutos antes, Sombra, o pitbull de pelagem preta, correu até Tiago e rosnou para Felipe que se assustou com o tamanho do garoto e deu para trás. Tiago adorou ver ele assustado e depois tentando se recompor, pensando que ninguém tinha visto. Afagou os locais preferidos do Sombra e logo depois começaram a conversação.

— Eu sei que... temos nossas diferenças — Felipe começou com uma frase clichê que enervou Tiago, pois queria que ele fosse direto ao ponto — já brigamos muitas vezes e...

O Inverno Mais Frio | Livro UMWhere stories live. Discover now