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RAFE CAMERON

       Eu não esperava ser acordado daquela forma por ninguém, ainda mais por Ivanna Howe. E para variar, a Sarah deixou ela entrar em casa como se fosse alguém da família, não mediu nem as consequências.

Mesmo puto da vida, resolvi me arrumar e ir para o "trabalho". Não deu tempo nem de morder uma maçã, só de tomar um banho rápido e vestir uma roupa qualquer do armário.

Quando cheguei na loja, Ivanna estava atendendo um cliente e logo ergueu o olhar para mim, notei por seus olhos que ela não estava nem um pouco feliz pelo meu atraso e tenho certeza de que me lembraria disso pelo resto do dia. Ela aponta para o fundo e resmungo internamente ao lembrar de que teria trabalho a fazer, trabalho com os peixes.

Quinze minutos depois, já havia vestido um avental apropriado e me concentrava em cortar os peixes da mesma forma que Howe havia me ensinado. Escuto seus passos pela madeira e ergo o olhar para vê-la, o que faz com que eu quase corte um pedaço do meu dedo.

— Cuidado pra não babar em cima do peixe e nem perder um dedo, Cameron. — Ironiza, me encarando com seus olhos castanhos, que nessa manhã, estavam mais claros do que antes. Noto um fio escuro sobre seus olhos e sinto uma vontade de parar tudo para ajeita-lo. 

Foco.

— Vai deixar eu fazer o meu trabalho ou vai ficar fofocando? Cuidado, minha chefe pode achar ruim e jogar um copo d'água em você. — Resmungo com um tom de ironia e vejo seus lábios se curvarem um pouquinho, como se quisesse rir.

— Primeiro que eu posso falar quando eu quiser com você. — Enfatiza o "eu" e eu reviro os olhos, enquanto volto a me concentrar nos peixes. — E segundo, hoje é seu dia no caixa. Essa parte eu posso cuidar.

Finalmente.

Deixo um sorriso escapar dos lábios de alívio por saber que não preciso cortar mais peixes pelo resto do dia.

— Mas nada de gracinhas, Cameron. Vou te ensinar tudo que precisa saber para ficar no caixa, vem.

Resolvo tirar as luvas e o avental, enquanto higienizo as mãos com o álcool em gel. Sigo para o caixa e vejo Ivanna atrás dele, ela puxa um caderno junto com uma caneta e coloca em cima da mesa.

— Presta bem atenção, Rafe, por favor. — Resolvo me aproximar e fico em sua frente, atento no que ela fala. — Nessa tabela têm os clientes que precisam fazer o pagamento e nesse outro lado, você vai anotar os pedidos e caso eles já paguem, você anota também. Precisamos ter o controle de tudo.

É um trabalho fácil.

— E além disso, você precisa atender bem os clientes, tá bem? — Ergue o caderno e me entrega à caneta. 

Olho para os rabiscos e arqueio a sobrancelha.

— Com esses garranchos eu não vou entender nada. — Resmungo, pegando o caderno e aproximando do rosto para tentar decifrar o que estava escrito. Noto seu rosto tranquilo se transformar numa carranca, como se quisesse me esganar ali mesmo com as próprias mãos.

— Me mostra como é sua letra então, quero só ver.

Dou de ombros e resolvo escrever uma palavra qualquer no verso da folha, viro em sua direção e vejo que ela não diz nada nos primeiros segundos, demonstrava até surpresa.

— Hum... é um garrancho, não entendi nada. 

Mentirosa.

— Pelo menos é melhor do que a sua. — Abro um sorriso cínico e antes que ela pudesse avançar sobre mim, um cliente entra e eu resolvo atendê-lo.

Ivanna ficou ao meu lado por alguns minutos só para ver como estava sendo o atendimento e por mais que eu não recebesse nenhum elogio, sabia que tinha ido bem. Apesar de odiar o cheiro de alguns frutos do mar, o trabalho não estava sendo tão ruim como eu imaginara.

Dava até para aturar.

...

A melhor parte de Outer Banks é o pôr do sol, no final da tarde, o céu se abre para uma paleta de cores. E nessa tarde, o céu estava rosado e muitas pessoas circulavam pela praia, estava bastante movimentado para uma segunda-feira normal. Outros se aventuravam no mar e eu senti uma pontada de desgosto ao lembrar que não sabia nem o mínimo de como surfar, nunca tive a oportunidade de pegar uma prancha e ir.

O movimento na loja estava mais tranquilo depois das cinco, então, saí um pouco do caixa e como à praia estava de frente, aproveitei aqueles breves minutos para visualizar a pintura de artes que estava sendo desenvolvida no céu.

Aproveito para sentar na areia e sentir um pouco de alívio. Fecho os olhos, respirando o ar puro e sinto o vento bagunçar alguns fios do cabelo, o que me traz uma sensação gostosa e nostálgica. 

— Rafe, o que está fazendo aqui? — Escuto a voz de Ivanna atrás de mim e abro os olhos na hora, virando o rosto para encará-la e tenho uma visão ótima daqui. Seus fios escuros balançam de acordo com o vento e seu olhar não está em mim, está no mar onde algumas pessoas parecem se divertir ao surfar.

De repente, ela parece sair do transe e me encara, ainda esperando uma resposta.

— Nada, só admirando essa vista.

Dou de ombros sendo sincero e me surpreendo quando ela se senta ao meu lado, cruzando as pernas e se vira para me olhar.

— Vou apreciar junto com você.

Responde simplesmente e eu tenho vontade de perguntar sobre o trabalho, no entanto, sinto que estragaria tudo isso. Então, resolvo ficar quieto e apreciar o silêncio confortável que se instaurou entre nós dois.

 — Sabe surfar, Rafe? — Pergunta, enquanto vejo seus braços se apoiarem na areia e ela vira o rosto para me encarar.

— Não, mas eu até que queria.

Respiro fundo, voltando o olhar para o mar onde um grupo de garotos de no máximo 14 anos estavam saindo do mar com a prancha. Não iria retribuir a pergunta, pois sabia que ela com certeza sabe e inclusive, já a vi participar de algumas competições e até ganhar como uma das maiores surfistas da ilha.

Ela é foda. 

— E se eu te ensinar?

O quê? Isso está acontecendo mesmo?

Encaro seus olhos e noto uma sinceridade ali, sem um pingo de brincadeira. Molho os lábios querendo responder um "claro" e reavalio se aquilo não é uma pergunta irônica ou qualquer coisa do tipo.

— Você me ensinaria? — Arqueio a sobrancelha, olhando para seus olhos e acabo seguindo para seus lábios, que na hora, estavam entreabertos.

— Sim, eu te ensinei a cortar um peixe, Cameron. — Resmunga, enquanto noto ela morder seu lábio inferior. — Mas com uma condição...

— Diga.

— Só não pode chegar atrasado de novo, caso contrário, eu pego uma mangueira de bombeiro e jogo em você. 

Dou uma gargalhada e ela ri junto comigo, e nesse momento, noto que não estávamos brigando feito cão e gato, e sim, numa conversa boa que me fez desejar mais momentos como esse.

𝐒𝐔𝐌𝐌𝐄𝐑; RAFE CAMERON ✓Where stories live. Discover now