11. Timotheé

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TIMOTHEÉ GIBRAN

"Sempre vivi em Utah, Salt Lake. Minha casa era situada em um condomínio tranquilo repleto de árvores, levava vinte minutos de carro para chegarmos ao centro da cidade.

Quando eu nasci Henrique já tinha
treze anos, meu irmão de olhos verdes, sorridente, tranquilo. Ele raramente contava quando estava pensando ou planejando algo, sempre dava um jeito de concertar algo de errado.

Rosie, nossa mãe era a mulher mais linda que eu já vi, e também a pessoa mais bondosa. Ela trabalhava em um Museu de História Natural, um lugar repleto de acervo de fósseis de dinossauros, onde consequentemente passei boa parte da infância com ela.

Aos finais de semana, mesmo cansada, ela se reunia com algumas amigas da igreja para levar conforto a algumas pessoas em fase terminal em um hospital de câncer, já que possuía grande empatia aquela circunstancia devido haver perdido sua mãe e pai para a doençao quando era adolescente.

Meu pai, Carlos, erra corretor de imóveis por uma empresa renomada. Não era de falar muito, não sentava conosco para contar histórias no final da tarde, nunca o ouvi dizer que amava a mim ou o meu irmão, Henrique aprendeu a odiá-lo muito cedo.

Quando completei meus onze anos de idade, meu irmão começou a cursar faculdade de contabilidade e a trabalhar na farmácia de um tio de terceiro grau da minha mãe. Foi neste mesmo período que meu pai começou a chegar embriagado todos os dias em casa, gritando conosco.

Rique começou a se revoltar com o modo cada vez mais desprezível que nossa mãe era tratada por Carlos, e isso se intensificou no ano seguinte, em um dia de ação de graças: como de costume nós três estávamos jantando, ele chegou jogando os vasos de porcelana pelo chão na casa lustrada a impecável, e sem mais nem menos estapeou minha mãe no rosto.

Henrique pulou nele, quebrou seu nariz a base de socos e na manhã seguinte Carlos mandou prendê-lo.

Nas duas semanas que meu irmão ficou confinado em uma cela, sendo alimentado pelo ódio e humilhação, eu também me abastecia de ódio, e não entendia por que minha mãe não o abandonava e por que ainda tinha esperança que ele mudasse.

Meu irmão não voltou a morar conosco, e por um tempo sentiu raiva da escolha de nossa mãe, por continuar naquela casa e me manter ali.

Dois anos depois, quando Henrique se formou, começou a trabalhar em um banco, ao passo que Carlos estava vendendo nossa casa para pagar dividas.

Começaram a surgir boatos do envolvimento com drogas do meu irmão, e eu era o garoto cuja família estava na boca de cada colega na escola.

No exato dia em que completei quatorze anos de idade, em 20 de janeiro de 2010, Henrique apareceu no apartamento em que eu, minha mãe e Carlos estávamos morando após nossa casa ter sido vendida.

A expressão do meu irmão, quando minha mãe correu para abraçá-lo de saudade é inesquecível. A caixa azul com o presente que ele levou para mim caiu no chão e seus olhos fundos se fecharam quando ela o aconchegou em um abraço forte amassando seu moletom escuro.

Naquele momento, quando vimos seu esqueleto e as dezenas de tatuagens, percebi o quanto ele havia mudado e que parecia estar bêbado. Carlos chegou um minuto depois, gritando, minha mãe me mandou para o quarto e não vi oque havia acontecido.
Ouvi gritos e móveis quebrando, e quando o silencio se seguiu, corri para ver: Henrique estava tremendo com as mãos ensaguentadas em um canto na parede da sala, meu pai inconsciente sobre os cacos de vidro da antiga mesa de centro, e minha mãe aos prantos, pedia que algum dos vizinhos ligasse para uma ambulância.

VIVAWhere stories live. Discover now