65. (Pedro)

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-...por favor Pedro, eu só confio em você! -Lukas já estava a horas tentando me convencer a virar sub do morro, eu respirava fundo, tinha muito medo de aceitar.

-Eu não posso, você sabe disso, minha família não aceita nem nossa amizade, nunca que vão aceitar eu virar sub do morro! -digo caminhando de um lado para o outro na antiga sala do seu João Menezes.

-Ninguém precisa saber por enquanto, você ajuda sua família, eles nem vão saber, por favor Pedro, você sabe que eu estou perdido, preciso de você irmão...

Fecho meus olhos sentindo o vento bater no meu rosto, o barulho das ondas batendo na areia, nunca pensei que fosse tão alto, o cheiro de queijo derretendo, vindo das barracas, e toda aquela gente conversando alto, eram tantos sons, de todos os lados, não pareciam tão relevantes antes, na verdade nem ouvia esses sons antes. 

Caminho descalço, sentindo à fina areia sobre meus pés, ja estava ali à alguns minutos, tinha vindo do hospital, direto para cá, não sabia muito bem o que estava acontecendo, eu estava nervoso, meu coração batia muito forte, eu sentia o barulho de cada batida, minha mão estava tremendo, eu só conseguia olhar para a lua, que estava cheia, bilhava mais do que qualquer lâmpada da cidade.

Me sento, apoiando meus braços nos meus joelhos, olho para além daquele mar, minha mente viaja para além daquelas estrelas brilhantes no céu, eu estava tão atordoado, só conseguia lembrar da sua voz.

-... vêm Pedro, você precisa conhecer meu pai, ele chamou você para jantar lá em casa! -já era a terceira vez que Lukas virava no meio da aula de ciências para falar sobre esse convite.

-Lukas, eu vou! -digo revirando meus olhos, enquando ele sorrir todo debochado. -Mas não vou demorar, se minha mãe descobrir que eu estive na sua casa, ela me mata!

-Não se preocupa, meu pai disse que não vai deixar ela saber! -ele sorrir e logo percebo que a professora nos olha de braços cruzados, ferrou.

-Meninos, a conversa está tão boa assim...

Éramos mais do que amigos, ele era meu irmão, meu companheiro, eu daria minha vida por ele, entregaria tudo por ele, e sei que ele faria o mesmo por mim. A culpa me consome por inteiro, sinto minhas costas tão pesadas, só queria me desculpar por isso, queria lhe dizer o quanto sinto muito, queria que fosse eu em seu lugar, queria que tivéssemos tempo para conversarmos, para relembrar de tudo, e nos abraçar, eu daria tudo por um abraço dele.

Sinto meu celular vibrar no meu bolso, mesmo sem nenhuma vontade, tiro do bolso e vejo VN brilhar na tela, atendo antes de cair.

-Oi! -digo assim que atendo.

-Oi irmão! Ce ta onde? -sua voz é baixa, quase como um sussurro.

-Estou longe do morro, por que?

-Eu tô aguentando a barra aqui com a Geovana, mas tá foda, ela se trancou no quarto, e eu nem consigo sentir nada, pedi para Amanda cuidar de tudo no hospital, eu não sei mais o que estou fazendo, eu preciso de você aqui Pedro... -ouço sua respiração forte na linha, sinto algumas lágrimas  descerem no meu rosto -Só tenta aparecer...

-VN! -digo antes que ele desligue, consigo ouvir alguma vozes de fundo, mas nada muito alto, ele demora um pouco pra responder, mas logo fala.

-irmão...

-me desculpa Vinicius... -ouço sua respiração abafada, ele parece estar chorando, mas bem baixo. Tento manter minha voz o mais firme que eu posso. -Eu preciso que fique ai, por ela!

-É claro que eu vou ficar, nunca vou deixar ela sozinha... -ouço alguma voz de fundo, percebo que ele parece impaciente.

-Eu vou voltar pro morro, vou passar no hospital e pegar a Amanda, ela não pode ficar sozinha agora, nenhum de nós deve.

Nos despedimos, guardo meu celular no bolso e me levanto me limpando de toda aquela areia, caminho de volta até minha moto, e assim que me sento nela, várias lembranças dessa noite voltam fortes na minha cabeça, sinto uma dor maior no peito. Ligo a moto e saiu em direção ao hospital.

Assim que Amanda sai da enfermaria, tento ajudá-la à caminhar, ela parece bem fraca, sinto a necessidade de cuidar dela, ela está tão frágil, a enfermeira fez um curativo em todo seu braço, ela estava toda cortada, ela não quis me contar o que aconteceu, mas eu imagino o por que da mesinha não estar mais no meio da sala. De vez em quando ela abre um sorriso, e finge que está tudo bem, nos sentamos em um banco no corredor do posto, para esperar os resultados dos exames.

-Amanda, eu... -começo a falar mas ela me interrompe.

-Ta tudo bem Pedro, eu sei que deve estar assustado, mas não foi a pior coisa que já me aconteceu... -sua voz doce fraca saí como um sussurro, até imagino ela se esforçando ao máximo para dizer isso.

-Eu não deveria dizer nada, mas preciso, de qualquer maneira você irá voltar para lá, e eu só poderei trazê-la de volta ao hospital. Sinto Amanda! -Ouço ela respirar fundo, ela estava imóvel, mas eu sentia ela se remexer algumas vezes, queria abraça-la, eu realmente sinto muito.

Desço da moto em frente ao hospital, o mesmo que já estive milhares de vezes com Amanda, não sei se ela pensa dessa forma, mas eu não paro de imaginar como seria se ela não tivesse aparecido em nossas vidas, todos iriam sofrer menos, mas seria muito injusto com ela, tenho certeza.

-Pedro. -Não tinha reparado o quanto eu já estava dentro do hospital. Me viro e a vejo lá, seu rosto inchado, e seus olhos tão vermelhos. -Você deveria estar aqui. -sinto suas mãos bater em meu peito, e sem reação, apenas fecho os olhos e a deixo me bater, era o que eu merecia naquele momente certo. -Tem noção do que eu tive que fazer, tive que ver ele Pedro, ver ele e assinar malditos papeis para doar seus órgãos, você tem noção, você não tem, PORQUE NÃO ESTAVA AQUIa

Ela só cai, a seguro em meus braços e ela chora tão alto que eu ouviria a quilômetros daqui, ajudo ela a se sentar e ela não me olha em nenhum momento, ela deveria ter se mantido forte para todos, ela precisava daquilo, eu não podia julga-lá.

-Já tem 3 horas Pedro, se ele não reagir nas próximas 4 horas, ele estará oficialmente morto. Eu não posso ficar aqui agora, você fica, eu preciso sair. -Ainda em silêncio, apenas abano com a cabeça, eu não iria segura-la, nem tinha forças para isso, sinto que ela me culpa, não por não estar aqui, mas por tudo isso. E sinto que é minha culpa.

Ele mantinha seus olhos vidrados naquela latinha de conserva, já estávamos ali a horas, e ele não avia acertado uma se quer, segurava a arma com tanta força que ela estava para se quebrar, revirava meus olhos a cada tiro que ele dava, ele apenas dizia "na próxima eu consigo", e adivinhem, ele não conseguia, mas admirava sua força de vontade.

-Vamos Lukas, não aguento mais ficar aqui. -digo derrubando uma de suas latinhas.

-Não. E me chame de LK cara, tem que se acostumar, as pessoas teram que se acostumar. -ele apenasse abaixa e pega a latinha a colocando no lugar. -Venha, tente você!

Pego a arma de sua mão, e atiro nas latinhas, eu realmente não estava nem prestando atenção, mas dos 3 tiros que eu dei, ainda acertei uma, mais do que ele, solto uma risada, e ele apenas arfa com irritação.

-Você no mínimo leva jeito, ainda preciso de um sub. -ele diz e novamente eu reviro os olhos, eu já avia dito que não seria seu sub, eu não poderia, não com a mãe que eu tinha. -Vamos Pedro, eu preciso muito de você, não confio em ninguém, como confio em você.

Eu já deveria saber que de alguma maneira, eu queria aquela posição, eu nubca seria outra coisa na vida, estava preste a cair naquela tentação, Lukas precisava de mim, e eu ajudaria meu irmão, ele não faria nada certo.

-Está bem, eu aceito Luk... LK.

Sinto uma cutucada no meu ombro, abro os olhos e vejo uma enfermeira, ela estava parada na minha frente e parecisa desconfortável, balancei minha cabeça e ela abriu sua boca, eu estava esperando ela dizer algo, e quando disse, eu senti a última lágrima do meu corpo descer, lentamente.

-Ele reagiu.
















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Continua...

A Menina Do MorroOnde as histórias ganham vida. Descobre agora