Capítulo 4: Osan part. II

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— Dormi tudo isso?

— É, dormiu — o olho de soslaio e ele observa a janela fechada, provavelmente também lembrando do tempo fechado, que se assemelha mais a um fim de tarde do que o começo de uma manhã. — Sem gritos. — ele acrescenta, obviamente vendo em minha face que necessito dessa informação e então sorrio sem mostrar os dentes, pegando o garfo pequeno para fisgar um morango em meio a pedaços de melancia e amora cortadas.

— Uma boa notícia. Eu acho. — Dou de ombros e aos poucos vou devorando toda a comida da bandeja, a todo segundo sentindo os olhos apreensivos e surpresos de Chen sobre mim, já que é um milagre me ver comendo tão bem.

— Sua mãe quer vê-la no jantar. Quer conversar com você.

— E o almoço, não vou vê-la? — largo o garfo e bebo um gole de suco.

— Não, infelizmente. Almoçará com investidores em uma reunião de negócios. Por isso quer vê-la no jantar.

— Tudo bem — bebo um gole do suco. Laranja.

Chen se remexe na poltrona, esfrega o rosto e agora faz de tudo para não ter os olhos presos em mim. Por que tem uma pergunta entalada na garganta e não tem coragem o suficiente, ainda, para perguntar. Lhe dou um empurrãozinho.

Devolvo o copo a bandeja e passo rapidamente os olhos sobre o pão de forma recheado com ovos e bacon. Passo a língua sobre os lábios e me locomovo até a esquina na cama, ficando um pouco mais próxima de ele. Mas nem tanto.

— O que quer perguntar? — Pergunto baixo e lentamente seu olhar me encontra, seus dentes maltratando os lábios finos, repreendendo o que está na ponta da língua e não deixa sair.

Ele suspira, esfrega a testa e se joga para trás, deixa o corpo relaxar sobre a enorme poltrona. Logo aperta os olhos e enfim me olha mais uma vez.

— A biblioteca. Mobi, o que aconteceu lá?

Agora entendo a luta contra si mesmo para perguntar, pois a mesma é direta, atinge certeiro a ferida que nem está perto de cicatrizar.

Lucas passa novamente diante dos meus olhos, o sorriso largo e gentil, arrancando-me um meu tão sincero em um lugar tão mórbido que até parece ser irônico.

Acontece mais uma vez. Ele é engolido e me deixa. O mal o leva e nem olha para trás, quando o que quero mais que tudo é que me leve invés daqueles que amo. Quero que os deixem em paz.

— Não lembro — minto, pegando o pão e o mordendo, enchendo a boca para não falar.

Lembro-me de tudo, do motivo de termos ido a biblioteca e de quando o fogo começou e não conseguimos parar, quando fui levada para fora em um piscar de olhos e Lucas ficou lá, sendo consumido, assim como os tantos livros, virando cinzas e nada mais que isso. Seguro o ímpeto de soluçar, de deixar as lágrimas vir a tona, mesmo que ele seja merecedor de cada uma delas, já chorei demais desde que fui acusada de assassinato por todos e seus pais. Se antes me odiavam, agora odeiam mais. Não julgo. É verdade. Tirei alguém querido, o condenei. Matei alguém que não deveria ter morrido. Matei Lucas no instante em que passei a chamá-lo de amigo.

Chen não insiste no assunto, não repete a pergunta até que eu fale como o doutor Choi praticamente fazia quando eu ainda estava lá. Depois do acidente – como prefiro chamar –, era a primeira pergunta que ele me fazia assim que eu sentava contra a minha vontade na cadeira a sua frente e repetia antes de eu ir, assombrando-me, fazendo isso até que eu lhe falasse o que tanto queria ouvir. Torturando-me sem ao menos fazer esforço, com apenas uma pergunta, que de longe parece até medíocre. O que aconteceu naquela noite. Até ontem, quando enfim abri minha boca e lhe disse o que tanto queria ouvir. O que houve. Não há explicação certa para isso. Para o que aconteceu naquela noite e na noite em que meu pai e minha irmã foram tirados de mim também. E se eu os dissesse o que eu vi, não acreditariam. Me internariam mais uma vez e por isso permaneço calada.

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⏰ Last updated: Jan 23, 2021 ⏰

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Never Far Away | Pjm | Série Amor e Fúria - Livro 2Where stories live. Discover now