Escolha

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Edward apenas deu um cochilo, logo acordou no mesmo horário que estava costumado. Foi até seu armário e lá havia roupas limpas. Roupas indianas, nada de suas roupas inglesas. Ele pegou uma kurta azul escura e se vestiu. Pelo menos lhe deram roupas de cores mais sóbrias, pensou ele.

Seguiu para ala da Rani. Em frente a entrada Surya o esperava. Ela usa um conjunto de calças, blusa e sari vinhos com bordados prateados.

— Indira pediu desculpas por não ter avisado antes, mas pediu que não houvesse aula essa manhã e que poderia voltar a dormir — informou ela.

— Está bem. Sem problemas, apesar que acho que não consigo voltar a dormir.

— Quer me acompanhar num desjejum? Aproveitamos para conversar.

— Parece uma boa ideia — concordou ele.

Os dois caminharam até um jardim. No caminho Surya pediu para uma das criadas trazerem algo para comerem.

Esperaram sentados a uma mesa de madeira em baixo de árvores. Não chovia e não estava muito quente. Uma agradável manhã para estar ao ar livre.

— Tomou sua decisão? — perguntou ela enquanto a criada os servia de suco de manga.

— Minha mente pede para sair correndo daqui o quanto antes, mas eu quero ficar — respondeu ele e ela sorriu.

— Então entende que terá que mentir ao governador-geral? E dizer a ele o que queremos que diga, não é?

— Acho que sim — respondeu ele. O que estava fazendo?

— Eu entendo que não tem nenhum treinamento. Não o colocaria numa situação difícil. Apenas não quero que passe informações importantes de nossas vidas a ele. Apenas isso.

— E eu fico aliviado com suas palavras.

— Mas acho muito perigoso você não saber nada como se defender sozinho. Não apenas contra algum tipo de inimigo, mas até para poder ter mais liberdade na cidade. Podemos colocar um turbante na sua cabeça, mas de longe qualquer um sabe que não é daqui. Se sair dos muros do palácio poderá ter problemas.

— Eu entendo. Mas onde eu poderia ir?

— Eu queria que conhecesse uma pessoa — respondeu ela. — Na verdade, já que não está ocupado e não quer ir dormir poderíamos ir agora mesmo.

— Pode ser — disse ele curioso.

Terminaram de comer e saíram para entrada do palácio.

— Por favor me diga que sabe andar a cavalo — pediu ela.

— Pelo meno isso — respondeu ele. Ela fez um sinal de dois para um dos guardas e ele saiu. Minutos depois voltou com um cavalo branco no qual ele subiu e um cavalo preto que ela subiu.

Fizeram os animais galoparem para fora da construção. Há mais de um mês que Edward não saia do palácio e só agora percebia o quanto estava precisando daquilo.

Por onde passavam as pessoas olhavam curiosas para aquele inglês com vestes indianas andando a cavalo ao lado de uma das irmãs da Rani. Chegaram ao templo de Shiva as margens do Gange. Deixaram os cavalos presos a uma das árvores e entraram.

Edward olhando curioso para as imagens de deuses e oferendas a eles colocadas no chão. Flores, comidas, incensos, velas. Seguiram até a escadaria que levava ao rio. Lá várias pessoas estavam em torno de corpo envolto de vários panos e este estava sendo empurrado para dentro do rio. Parecia que haviam chegado no final de uma cerimônia religiosa. O grupo começou a se dispersar. E o guro da família de Surya, o brâmane responsável por aquele templo se aproximou deles.

— Então resolveu trazer o inglês aqui?— perguntou o brâmane.

— Aconteceram muitas coisas nos últimos dias que me fizeram entender que poderia baixar um pouco a guarda — respondeu ela fazendo o velho homem sorrir.

— Entrem, vamos conversar lá dentro.

Os três entraram no templo. Passaram pelo salão principal e entraram numa das salas na lateral esquerda. Lá havia apenas um grande tapete no chão, almofadas e incensários.

Eles se sentaram. Surya e Edward ao lado do outro e de frente ao guru.

— Queria que o conhecesse, para saber se realmente posso confiar nele — disse ela.

— Surya, você é tão inteligente e tão tola ao mesmo tempo — disse o guru e Edward o olhou surpreso.— Você e suas irmãs possuem um poder um maior do que qualquer comunicação com os deuses que eu possa ter. Ou qualquer tipo de intuição ou previsão.

— Eu vim aqui porque confio no senhor. Isto não quer dizer que eu ache que o senhor seja infalível. Pela milésima vez, o senhor errou. Acertou sobre a Indira, errou sobre mim — retrucou Surya fazendo Edward imaginar o que ainda não sabia sobre ela.

— O avatar é despertado quando foi necessário. Varanasi estava em ruínas quando sua irmã despertou — explicou o guru.

— Eu já estive em grande necessidade — retrucou Surya.— E não vim aqui para falar sobre mim.

— Como disse. Tola. Há quantos anos não medita? Está desconectada do mundo espiritual e por isso possui um véu na sua frente que a está impedindo de enxergar o óbvio. Você que vai me dizer se ele é confiável — teimou o velho homem.

— Então o problema é esse? Está bem então. Vamos tentar — Ela se virou para Edward, fechou os olhos e estendeu as mãos para ele, que a segurou sem fazer ideia do que estava ocorrendo. O brâmane sorriu.

Surya respirou fundo e tentou esvaziar a mente. Era muito difícil depois de tanto tempo sem fazer aquilo. O guru começou a entoar o mantra Swayamvara Parvathi:"Om Hreem Yogini Yogini Yogeswari Yoga Bhayankari Sakala Sthavara Jangamasya Mukha Hrudayam Mama Vasam Akarsha Akarshaya Namaha" repetidamente.

Edward sentiu um forte calor envolver seu corpo, teve medo mas manteve os olhos fechados. Surya sentiu o mesmo calor, porém além dele inúmeras imagens surgiram em sua mente. Imagens de outras vidas. Muitas e muitas vidas. Corpóreas e em lugares que ela não fazia ideia de onde poderia ser. Edward começou a ficar fraco e desmaiou. Surya abriu os olhos assustada. Olhou para ele deitado no chão e depois para o guru.

— Ele vai ficar bem — explicou olhando ela passar as mãos no cabelo dele.— E você? Agora acredita?

— Ele já viveu aqui. Era um de nós e eu...

— É Parvati. Faz sentido você despertar apenas com a chegada dele.

— Mas ele é ainda um inglês, e o Ravi...

— Se quiser continuar teimando, tudo bem. Mas sua resposta já teve.

— Eu preciso conversar com Indira, apenas ela entenderá essas minhas lembranças — disse ela e se virou para Edward. —Vamos acorde.

Ele abriu os olhos lentamente e a viu sorrindo para ele. Com certa dificuldade colocou-se em pé.

— Espero que tenha encontrado o que procurava — disse Edward.

— Encontrei sim. Agora vamos voltar para o palácio pois preciso falar com Indira com urgência.

— Surya? — chamou o guru e ela se virou para ele. — Lembre-se que apenas em grande necessidade acontece o despertar. Tenha cuidado sobre o que pode estar por vir.

Ela apenas assentiu e Edward a seguiu até os cavalos. Voltaram rapidamente ao palácio.

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