Capítulo XXI

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-Dave, por favor pare. - pedi.

-Emily, me escute, você acha mesmo que vai dar certo quando você se formar? Acha mesmo que não terão mais perigo algum e ser um casal feliz e assumido? - ele perguntou com expressão.

-Não, claro que não, mas quando eu me formar... - comecei com a voz embargada.

-Ele vai embora, Emily! - ele soltou de uma vez.

O choque daquelas palavras percorreram meu corpo e eu me desvencilhei de Dave, chateada.

-Do que está falando, Dave? - perguntei meio incrédula. Dave suspirou e colocou as duas mãos na cintura.

-Meu irmão tem planos de fazer mestrado em escrita criativa... em Londres. Ele está esperando apenas a formatura da turma de vocês no ano que vem e também, recebeu uma proposta de emprego em uma faculdade famosa de lá é o encaixe perfeito para ele. - explicou Dave. - é o sonho dele, Emily.

-Por que esperar pela formatura? - perguntei atônita.

-Porque vocês foram a primeira turma dele do ensino médio Emily, não é só isso, já pensou em como vai ficar a reputação do meu irmão depois que o mundo da mídia descobrir esse caso dele? - a palavra caso me pegou desprevenida e me pisoteou. - Dener é um adulto de prestígio na sociedade, tem sua certa influência, se isso for descoberto, a moral do meu irmão será questionada e a sua também. - afirmou. - por favor, pense!

Eram coisas demais para pensar, minha cabeça ficou cheia de ideias desconhecidas e torturantes sobre o assunto em questão. Dener era um homem-feito, com uma vida encaminhada, como eu poderia simplesmente aparecer e viver a suas custas, estragando tudo, inclusive sua moral? Eu não poderia. Um turbilhão de pensamentos ocorreram-me, me apertando e me sufocando com uma precisão incrível.

-Srta. Dan-i! - chamou-me Dener, tirando-me dos meus pensamentos por um momento.

Ele se aproximou com a testa franzida (algo de seu feitio, na verdade) e encarou de modo antagonista seu irmão caçula. Virei-me para ele com um tanto de impaciência.

-Professor...

-Tudo bem? - ele perguntou me olhando.

-Sim. Vamos. - olhei para o chão e pensei um pouco antes de completar: - vamos embora.

Andei a sua frente com pretensão de sair ligeiramente, escutei o professor me seguir atento aos meus passos e deixando Dave na biblioteca. Ao chegar do lado de fora onde não havia mais ninguém, encarei o céu e as nuvens carregadas que começavam a se aproximar, senti a nostalgia daquilo e uma tristeza imensa, porém, a confusão era ainda maior do que ela.

Voltamos para casa em um silêncio completo no carro, assim que entramos, eu subi as escadas sem lhe dizer nenhuma palavra. Tomei um banho já sentindo um frio que antecedia a chuva. Algumas horas depois, quando a chuva forte começou, era tarde da noite e eu não tive mais condições de permanecer no quarto, os lençóis pareciam gelo puro e o ar parecia congelado, bem que o professor falou que sua casa esfriava demais quando chovia. Desci as escadas com cuidado e quando cheguei a sala, avistei Dener sentado no chão de frente para a lareira como da última vez. Imaginei que ele estivesse ali. Me aproximei receosa e sentei-me ao seu lado parecendo incomodada com algo, mas eu já sabia o que precisava fazer, por baixo das minhas cobertas geladas e em cima da cama macia, eu já havia tomado uma decisão.

-Eu sabia que você viria. - ele disse de repente. Suas mãos se apertavam uma contra a outra e seguravam seus dois joelhos sem inquietação nenhuma.

-O quê? - retruquei.

-Eu sabia que não aguentaria o frio. - ele disse me olhando. - tenho outro livro para te entregar. - anunciou.

Ele retirou de debaixo de uma almofada vermelha que se encontrava atrás dele e me mostrou a capa.

-É um diário? - perguntei encarando aquele livro de couro marrom sem título algum.

-Mais ou menos e se você se aproximar, posso até ler pra você. - ele disse com um ar divertido e irônico.

Ponderei aquela situação e resolvi aceitar sua proposta mesmo estando um tanto hesitante. Me aproximei ficando na mesma posição que da última vez; de coxas recostadas no chão. Ele saiu de sua posição para uma que jugara mais confortável, deitou o corpo todo no chão e bem ao meu lado, próximo as minhas pernas, deixou a cabeça apoiada em uma mão e com a outra segurava o livro aberto. Alguns minutos depois, ele começou a citar:

-O que há de interessante em uma pequena criatura enlutada? O que há de intrigante em um ser tão minúsculo envolto em uma roupa preta? A perda que lhe atribui ausência nos olhos gélidos e molhados? Ou a sagacidade de um ser de pernas curtas, correndo para fora da funerária? - ele recitava aqueles versos com a voz precisa e calma, como se contasse uma história, a minha história - Posso vê claramente que o atrativo viria mais ainda do que àquele ser consequentemente se tornou. Não era mais tão pequena, mas sim, interessantemente um pouco maior, mais carregada de algo comum, ausência, solidão, exílio... seria ela alguém capaz de pegar esta mão, ou agora, seria ela alguém mais sensata do que isso? A moça, agora coberta por um cachecol marrom-escuro em seu pescoço, correu pelo corredor nunca imaginando que ao observar também era observada, ela era tão brilhante e moça que me era impossuível, era impossível...

Ele parou tomou folegou e me encarou. Inclinei minha cabeça para baixo a fim de fitá-lo também. Ele notou que usei seu cachecol no ano passado, na verdade, ele notou mais do que isso e mais do que meus olhos poderiam ver. Àquele era um poema feito sobre mim e eu me pergunto se estou quase esquecendo do que planejei fazer.

-Um poema sobre mim? - perguntei timidamente.

-Um não... bem, são alguns. - ele folheou o diário que parecia um livro. - lerei mais alguns se quiser, mas antes, eu gostaria de perguntar uma coisa. - ele segurou minha mão que repousava em minha coxa.

-Dave falou algo para você? Algo que te deixou incomodada? - ele levantou o rosto para mim e ajeitou os óculos. - ele andou me dizendo umas coisas também... - pigarreou e balançou a cabeça como se tivesse aversão as ideias de Dave - mas...

Meus olhos se arregalaram levemente assim que ele citou Dave e eu lembrei de tudo que ele me disse, talvez se Dener não tivesse citado aquilo, só talvez, eu não teria reagido da forma que reagi, eu não teria prosseguido com a minha decisão ou, pelo menos, tentado.

Interrompi Dener tomando seus lábios com força em um beijo curto, quando deixei os lábios dele continuei com minha testa colada à sua e meu nome saiu sussurrado de sua garganta e cheio de confusão.

-Emily?

Foi aí que tomei seus lábios de volta com mais ferocidade, segurando seu rosto entre minhas mãos. Ele levantou o corpo sem quebrar o beijo e voltou a ficar mais alto do que eu, mas eu não podia deixá-lo dominar àquela situação, porque naquele momento eu havia decidido de vez, dar tudo a Dener, ao meu professor de literatura, dar tudo o que eu sentia para ele e depois deixá-lo viver sua vida que lutou tanto para estabelecer sem os pais e sem ajuda de ninguém. Eu não podia ficar e tirar tudo dele, mas também não poderia sair sem dar a ele cada gota do que eu sinto, cada gota que há em mim desses sentimentos fortes e conturbados. Então, eu soube naquele momento, que talvez eu não fosse tão madura assim quanto todos dizem.

Oi pessoas, às coisas ficaram complicadas hein? Vamos ver no sábado ou no domingo, o que se sucederá com esses dois

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Oi pessoas, às coisas ficaram complicadas hein? Vamos ver no sábado ou no domingo, o que se sucederá com esses dois. Se vocês estão gostando da história, me deixem feliz com uma ⭐ e comentem a opinião de vocês. 😁❤️🥺

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