Fica comigo

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Justin a narrar

Tenho que admitir que fiquei um pouco chocado com o pedido dela, uma vez que nos conhecíamos há pouco mais de 4 meses. Não é que não queira fazê-la minha, mas não tenho bem a certeza se ela está pronta para perder a virgindade, muito menos na noite antes de morrer.

Lambi os lábios, segurando a mão dela e acariciando a mesma com o polegar.

- Angie... tens a certeza? – Vi-a olhar para mim com uma expressão confusa, pelo que me deu a entender que ela não percebia o motivo da minha hesitação. – Quer dizer, não é que eu não queira... Porque, eu quero, muito... Mas... - Respirei fundo, tentando escolher as palavras para que aquela noite quase perfeita não se transformasse num momento constrangedor e desconfortável para os dois. – Quer dizer, nós só nos conhecemos há uns 4 meses... E não me parece que a noite antes da tua morte seja a noite ideal para perderes a virgindade... - Falei do assunto com naturalidade, tal como ela costumava fazer, mesmo que me deixasse desconfortável.

Vi-a esboçar um sorriso tímido, e tenho que admitir que fiquei aliviado quando ela o fez.

- Eu estou a morrer de qualquer maneira. – Murmurou simplesmente, olhando-me diretamente nos olhos, como se me tentasse hipnotizar, e quase conseguiu, se o toque dos seus dedos a entrelaçarem-se nos meus não me trouxesse de volta à realidade. – Eu quero-te... E quero ser tua antes de desaparecer... Eu quero sentir-me viva, e tu tens-me ajudado a ter isso, a sentir isso, por isso peço-te que não recues agora... - Falava pausadamente, embora não parecesse doente nem tivesse dificuldade em pronunciar cada palavra.

Engoli em seco, lambendo mais uma vez os lábios e acabando por assentir.

Devagar, levei uma mão à cintura dela, acariciando-a com o polegar enquanto a puxava para mim com carinho, começando um beijo cheio de amor, cuidado e hesitação e sorrindo quando senti os seus braços, finos e trémulos, enrolarem-se no meu pescoço e puxarem-me para si.

Sempre com muito cuidado e tentando não lhe fazer peso em cima, ainda com os nossos lábios unidos num beijo apaixonado, enrolei as pernas dela à volta da minha cintura e passei a estar em cima dela, sentindo o pouco calor do seu corpo chocar contra o meu. Num instante, o que restava das nossas roupas desapareceu e o ambiente constrangedor de há minutos atrás transformou-se numa atmosfera cheia de paixão intensa, desejo insaciável e carinho eterno, as nossas respirações, já ofegantes, chocavam uma com a outra, fundiam-se no ar e flutuavam, para sempre juntas, num segredo de um amor impossível, até aos céus.

Só existíamos nós dois, o resto do mundo desapareceu enquanto os nossos corpos ansiavam pelo toque do outro e os nossos nomes fugiam em sussurros dos nossos lábios.

Num último esforço, com um último suspiro de prazer e desejo saciado, vi-a cair contra o colchão, enquanto eu deixava que o meu corpo caísse, exausto, e se aninhasse entre as suas curvas.

- Oh meu... - Sussurrou, entre suspiros curtos de cansaço, rindo baixinho ao meu ouvido logo depois, gargalhada essa que eu imitei.

Respirei fundo e saí de dentro dela, deitando-me depois ao seu lado e cobrindo-nos com as mantas, gentilmente dispensadas pela minha mãe, que nos fariam sobreviver à gélida brisa marítima noturna.

- Não te magoei, pois não? – Murmurei baixinho, rodeando os ombros dela com o braço enquanto ela se enroscava em mim, em busca de calor e conforto.

Vi-a negar levemente com a cabeça, em resposta à minha pergunta, e o ambiente estava ótimo, não tinha havido grandes complicações até aí e talvez ela aguentasse mesmo até ao pôr-do-sol do dia que se avizinhava, mas tenho que admitir que tive um acesso de pânico quando ela começou a tossir compulsivamente e quando bolsas de sangue lhe saíram da garganta.

Angela a narrar

Aquela noite estava a ser simplesmente perfeita, e eu até me sentia bem; sim, pronto, ok, talvez estivesse cansada, mas sentia-me bem. Tudo piorou quando senti o meu peito a arder e juro que conseguia sentir os meus pulmões a encherem-se de sangue enquanto tentava, desesperadamente, obrigar o ar a entrar para dentro deles à força. Quanto tomei esta decisão, não sabia que ia doer tanto...

Sentei-me, tapando o meu corpo nu com os lençóis e as mantas enquanto lutava contra as minhas mãos trémulas, tossindo roucamente e com dificuldade.

- Angie? Angie, o que se passa? – Ouvi-o perguntar, num tom preocupado, enquanto passava uma mão pelas minhas costas, lentamente, para cima e para baixo.

Quando consegui, finalmente, respirar alguma coisa de jeito, suspirei e deitei-me de novo, sentindo-me repentinamente zonza.

- Não sei... o meu peito... - Levei uma mão à boca quando voltei a tossir, embora mais calmamente desta vez. – Dói... - Choraminguei, vendo-o envolver-me nos seus braços e sentindo os seus músculos retesarem-se enquanto movia o meu corpo para que eu ficasse de costas para ele.

Pediu-me que não dissesse mais nada e que tentasse poupar forças enquanto ele ia buscar a máscara e as botijas de oxigénio que os médicos lhe tinham dado mais cedo nessa noite, voltando depois para perto de mim.

- Toma, põe isto, vai ajudar. – Pediu gentilmente, colocando-me a pequena máscara de latex sobre o nariz e a boca e ligando as botijas, fazendo com que um vento suave e puro batesse contra a minha cara. Não tinha forças para protestar, por isso não o fiz, limitei-me a render-me à sensação de alívio que senti quando o meu peito se encheu de ar. – Tem calma, tu vais ficar bem...

Fechei os olhos com força, tentando obrigar o ar a entrar, sentindo as carícias trémulas que ele me fazia nas costas com uma mão enquanto segurava a máscara com a outra.

- Justin... - Ouvi a minha voz soar abafada, mas apercebi-me de que era normal uma vez que tinha uma barreira entre a minha boca e o ar. – Vai-te embora... - Pedi, ouvindo a sua respiração, que até agora se tinha mantido profunda e regular, ficar trémula.

Por mais que ele insistisse, o que eu queria é que ele não ficasse ali, a ver-me morrer, e muito menos queria que a última imagem que ele tivesse minha fosse ver-me naquele estado.

- Não, mas é que nem sequer penses... - Murmurou, com a voz a tremer, e logo senti gotas frias a caírem no meu pescoço, o que me deu a entender que ele se tinha ido abaixo e chorava antecipadamente a minha morte. – À beira-mar, durante o pôr-do-sol, lembras-te? – Insistiu, relembrando-me do meu desejo de morte, desejo esse que eu lhe tinha dito no dia em que nos conhecemos.

Limitei-me a assentir e concentrei-me na respiração, ouvindo baixos murmúrios da parte dele, que diziam maioritariamente 'fica comigo', 'concentra-te', 'mantém o coração a bater', e coisas afins deste género.

Sentia a vida a esvair-se do meu corpo a cada segundo que passava, e o que me assustava é que não sabia quanto tempo mais teria com ele.


ParaísoWhere stories live. Discover now