Capítulo XXIV - Deuteronômio

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Capítulo XXIV – Deuteronômio

O antigo empresário sentou-se em uma cadeira e apoiou-se na mesa, estava em choque, uma lágrima surgiu no seu rosto. O mentor olhava pasmo para aquele homem frágil, sentiu-se momentaneamente com repugnância, não conseguia entender a reação de choque em que entrara o mesmo. O homem caminhou para longe da cozinha como se desviasse daquela atmosfera lúgubre, respirou profundamente na varanda e sentiu-se calmo, o sol da Califórnia parecia afastar o clima de morte que dominava o interior do apartamento de Alice.

Dias mais tarde, o Mentor chegou até Alice que assistia alguma neuroprogramação qualquer:

__O tio tá chorando lá no quarto...

Alice arregalou os olhos surpresa, suspirou e pôs-se de pé, o Mentor prosseguia:

__Não sei o que deu nele? – E emendou perplexo – Não sabia que ele gostava tanto assim do Julian...

A jovem fechou o rosto e afirmou:

__Você nunca vai entender, você provavelmente não choraria nem no velório da sua mãe...

O Mentor ficou pensativo e ao mesmo tempo desapontado, não havia de fato chorado naquela ocasião. Alice completou saindo da sala:

__Só há algoritmos na sua cabeça e nenhum sentimento...

__Não é verdade... – E após refletir alguns instantes pareceu ficar em dúvida e levemente constrangido.

Ellsworth estava sentado na beirada da cama com as mãos segurando a cabeça, ao escutar passos apenas disse sem se mover:

__Deixe-me só...

Alice não obedeceu, sentou-se próximo do antigo patrão e não disse nada. Ellsworth é que tomou a palavra:

__Ele não podia ter feito isso.

__Ele quem?

__Você sabe...

Alice pensativa parou alguns segundos e respondeu concordando com a cabeça:

__Sim, eu sei.

__Eu não posso confiar nem sequer em mim...

__Não diga isso Senhor Ellsworth...

O antigo empresário rebateu de modo ríspido:

__Meu nome é Thomas.

__Sim, Thomas... – Tomou o ar e prosseguiu em tom sereno – Não se compare a ele...

A voz de Thomas tornou-se novamente ríspida:

__Ele sou eu.

__Não.

__Não seja estúpida, Alice.

__Ellsworth não choraria...

__Sim, ele choraria. – Antes que ela rebatesse, Thomas completou - Eu me conheço melhor do que você...

__Certo, Thomas, mas você acha mesmo que você hoje agiria do modo pelo qual ele agiu?

__Se eu mandaria matar meu antigo eu?

Ela mordeu os lábios pensativa e ele respondeu de modo confuso:

__Se eu perguntar a mim, estarei perguntando a ele...

__Você é uma nova pessoa...

__Dois anos, quantos dados me separam dele?

__Thomas, há dois anos, eu era outra mulher...

Ele suspirou tentando conter as lágrimas e respondeu com a voz cortada:

__O problema é que... – Inspirou profundamente, olhos se tornaram úmidos, narinas expiraram ruidosamente – Eu acho que se eu estivesse no meu lugar, eu teria agido do mesmo modo...

Alice aturdida abaixou os olhos e ficou imobilizada por algum tempo na beirada da cama. 

Amor maior que 2Onde as histórias ganham vida. Descobre agora