O sol brilhava no céu límpido naquela manhã. Jude Andrews encarava o profundo rio diante de si; Tão profundo quanto sua própria alma. Os demônios que tanto temia ainda perseguiam-na. A maquiagem da noite anterior encontrava-se borrada em seu rosto de traços perfeitos. As botas pretas de salto alto estavam jogadas no gramado. Ela respirava fundo várias vezes na desesperada tentativa de encontrar sua sensatez. Tinha medo!
Encarou o estranho seminu ao seu lado e sentiu seus olhos marejarem quase que instantaneamente. Tinha absolutamente tudo que um dia desejara, mas olhava ao redor e sentia-se parte de lugar nenhum. De repente era como se nada mais fizesse sentido. Sua vida, seus sonhos, suas conquistas... Para onde ela estava caminhando, afinal de contas? Seria a vida, toda a hipocrisia com a qual ela agora se deparava?
Inspirei fundo, prendi o fôlego por alguns segundos e expirei lentamente. Repeti a ação mais duas vezes. Isso costumava me acalmar, mas não hoje. Havia tanta coisa na minha cabeça que eu mal conseguia lembrar meu próprio nome. As luzes se acenderam e Ellen Holmes entrou no palco com um sorriso simpático no rosto. Ela cumprimentou a plateia e todos os outros telespectadores antes de chamar o meu nome. Travei. De repente era como se eu tivesse criado o meu duplo e pudesse observar a mim mesma.
− Ande logo! − Cochichou Stevie ao meu ouvido, para em seguida me empurrar para a cova dos leões.
Sorri e acenei. O que mais eu podia fazer? Ellen me cumprimentou com um pequeno abraço e em seguida indicou a poltrona ao seu lado para que eu me sentasse. O fiz ainda com um sorriso no rosto. Cruzei as pernas e mexi no cabelo. Eu sempre mexia no cabelo quando estava nervosa. Um bolo havia se formado na minha garganta, a ansiedade havia se transformado em uma enorme vontade de vomitar.
− Mia! − Ela disse com aquela voz estridente que eu costumava caçoar. – É tão bom finalmente recebê-la em meu programa - concordei levemente e sorri de novo. – Mas e então, depois do sucesso que foi o seu último livro, o que podemos esperar desse que está por vir?
Abri a boca. Para o meu total alívio, não vomitei. As palavras começaram a sair de maneira natural e vendo-me pelo meu duplo, eu até parecia simpática e graciosa. Eu não estava me esforçando para isso, mas era algo que acontecia quando a escritora dentro de mim assumia o controle.
− Vamos lá, Mia, sorria! Você foi ótima, todos a adoram − Stevie estava entusiasmado por nós dois, como de costume. Eu sorri e ele me abraçou bem forte. Ao menos, era mais seguro que as minhas palavras.
Saímos do estúdio e nos detemos na cafeteria próxima à minha casa. Stevie, meu melhor amigo desde o colegial e agora meu agente, me conhecia bem demais para deixar passar meu comportamento estranho dos últimos dois meses. Ele sabia do que se tratava, mas eu não queria falar do assunto e por consideração a mim, ele também se calava. Mas cedo ou tarde a paciência dele acabaria. E algo estava me dizendo que esse dia havia chegado.