O Segundo Caçador: vencedor...

By BrCrispim

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ROMANCE VENCEDOR DO III PRÊMIO UFES DE LITERATURA "Bruno criou uma história que tem tudo a ver com o nosso te... More

Apresentação
Parte I - Frankestein
Capítulo 1 - Um assalto
Capítulo 2 - Um assassinato
Capítulo 3 - Um levante
Capítulo 4 - Uma investigação
Capítulo 6 - Uma lista
Capítulo 7 - Um fim
Capítulo 8 - Uma investigação
>>> Um anúncio rápido 1 <<<
Capítulo 9 - Um compromisso
Capítulo 10 - Uma mentira
Capítulo 11 - Um alvo
Capítulo 12 - Um reencontro
Parte II - Drácula
Capítulo 13 - A repercussão
Capítulo 14 - O descompasso
Capítulo 15 - O monstro
Capítulo 16 - A rotina
Capítulo 17 - O banquete
Capítulo 18 - O erro
Capítulo 19 - O expert
Capítulo 20 - O resgate
Capítulo 21 - O último
Capítulo 22 - A descoberta
Capítulo 23 - A verdade
Parte III - Duende
Capítulo 24 - Minha nova vida
Capítulo 25 - Meu chamado à ação
Capítulo 26 - Minha decisão
Capítulo 27 - Meu novo amigo
Capítulo 28 - Minha guerra
Capítulo 29 - Meu legado
Capítulo 30 - Minha fuga
Capítulo 31 - Meu adeus
Capítulo 32 - Minha punição
Ebook com 2 capítulos bônus!!!

Capítulo 5 - Um retorno

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By BrCrispim

O desgraçado do telefone toca mais uma vez. Deve ser a milésima vez só hoje e não vai ser desta que vou atender. Minha família, meus amigos, meus colegas de trabalho. Todo mundo está me ligando fingindo querer saber como estou ou me dar apoio. Na verdade, o que realmente querem é fazer perguntas sobre o que aconteceu no ônibus. Confirmar teorias ou aumentar especulações. Não aguento mais responder a essas perguntas. Sendo justo, eu não respondi a nenhuma delas desde que dei entrada no hospital. São sempre as mesmas. "Como você está? É verdade que você matou duas pessoas? Quando você volta a trabalhar?" É insuportável ficar esperando que eles desistam e parem de me ligar.

Mais uma desistência. Dessa vez, a ligação foi feita de um número restrito. Uma nova tentativa para instigar minha curiosidade e me fazer atender. Tão inútil quanto as outras. Minha curiosidade é muito menor do que a vontade de não falar com ninguém. Não sei por que ainda não taquei esse telefone na parede. Ou pelo menos não parei de recarregar. Porém, sempre que a bateria chega perto do final, volto a ligar o aparelho na tomada.

Uma nova chamada logo aparece no visor. Hoje vai ser um daqueles dias difíceis, em que todo mundo me telefona o tempo todo, tentando me infernizar até que eu atenda. O pessoal do escritório costuma fazer isso toda sexta-feira quando retorna do almoço. Todo mundo bebe e volta animado para uma rodada de ligações. Pela quantidade, cada um faz uma. Aposto que me falariam que só estão fazendo isso para me ajudar.

Mas é estranho. Eu jurava que hoje era quinta-feira. Ou eles mudaram o dia ou eu perdi a noção do tempo.

Desta vez, é a foto dela que aparece no visor. É assim que compreendo que venho mentindo para mim mesmo todos estes dias. O telefone não foi destruído e está carregado porque eu estava esperando que ela ligasse. Suportando todos os mil telefonemas à espera de apenas um. Feliz e ansioso, atendo o primeiro em semanas. No segundo toque. Porque durante o primeiro fiquei olhando para o aparelho, sem respirar.

– Alô?

– Aninha?

– E aí, rapaz?

Ela está alegre. Imaginei essa conversa mil vezes nos últimos dias e, em todas, estava triste, se sentindo rejeitada, por eu não ter ligado. Algumas vezes, apenas dizia que queria que eu nunca mais ligasse. O que nem faria sentido, já que era ela que estaria me ligando.

– Você acaba de me deixar rica, sabia? – Ela gargalha e continua. – Apostei com o pessoal do escritório que eu ia ser a primeira pessoa que você ia atender.

Sua alegria me contagia e pela primeira vez desde que saí do ônibus, desde meu encontro com Assassino, desde que tive alta, esboço um sorriso.

– Então era por isso que eles ficavam me ligando o dia inteiro? – Pergunto, com falsa irritação.

– Só pra deixar claro, eu fui contra desde o início. Mas essa gente carente acha que excesso de atenção faz qualquer um se sentir melhor.

– E, por mais atenção, você quer dizer, me infernizar.

– Isso! Aí, como você nunca atendia ninguém, um começou a desafiar o outro. Daí pra virar uma aposta foi um pulo. E as apostas cresceram tanto que eu achei melhor organizar um bolão.

– Que ótimo... Foi ideia de quem?

– Das apostas? Minha, claro.

– Isso eu sabia. Todas as apostas que você ganha são sempre ideias suas. Mas eu tava falando das ligações. De quem foi a grande ideia de pedir pra tudo mundo me ligar?

– Da sogrinha, lógico – pela voz, sei que ela está sorrindo e me testando.

– Quer dizer que a minha mãezinha querida espalhou pros meus colegas do escritório que o filhinho dela de quase trinta anos estava precisando de ajuda? Agora sim, me sinto melhor.

Minha mãe foi uma das poucas pessoas que não me ligaram. Não que eu reclame disso. Nem eu nem ela suportaríamos mais do que alguns segundos de conversa. Até por isso, é esquisito vê-la buscando contato por intermédio de meus amigos. Pensei que ela já não se importasse comigo.

– Mas você precisava de apoio, Gatinho. Só que eu acho que você precisava mais de tempo do que de apoio. Você passou por muita coisa.

Sinto o peito esquentar de dentro para fora. Meu corpo ficar mais leve. As crueldades e injustiças que tanto me atormentaram nesses dias não me importam mais. Só imagens dela me vêm à mente. Do rosto lindo e delicado. E principalmente de seu sorriso fácil. Uma das primeiras coisas que me atraíram nela foi sua alegria espontânea. Ela nasceu para ser feliz e tornar felizes todos os que estão por perto. Depois de incontáveis horas de agonia, ela conseguiu o que ninguém conseguiria. E fez isso em um minuto de conversa. Estou em paz, finalmente. Não acredito que ainda não pedi essa menina em namoro.

– Mas não consegui aguentar de saudade e te liguei – continua, com a voz mais doce que tem. – Espero que não tenha feito mal?

– Quer dizer que você não vai respeitar o meu tempo para superar essa tragédia? – Pergunto, com falsa descrença.

– Gatinho, se você quiser, eu até desisto de passar hoje aí na sua casa para te curar de vez. Mas jurava que você ia preferir que eu fosse aí...

– Não acho que é o melhor para a minha saúde mental, mas, por você, e apenas por você, vou te receber aqui em casa.

Ela gargalha feliz. Eu rio também. A vida é mais fácil e melhor com ela.

– Tenho que desligar agora, Gatinho. Tem um pessoal aqui tentando cancelar a aposta e roubar o meu dinheiro.

Depois de evitar tantas ligações, eu não quero desligar esta. Estou cansado de ficar sozinho com meus pensamentos. E, falando com ela, acredito que não devo temer as ameaças de Assassino. Ele, agora, faz parte de meu passado, não do futuro.

– E você já pensou no que vai fazer com tanto dinheiro?

– Já. Vou comprar um vestido lindo. Você vai amar. Ele é preto e tem um decote enorme nas costas.

Se a conheço bem, ela já comprou um vestido contando que iria ganhar a aposta, e vai comprar outro para comemorar a vitória.

– Então você comprou pensando em mim. Você vem hoje com ele?

– Sim e não. Pensei em você, lógico, mas esse é pra uma festa chique. Tipo formatura ou casamento. Beijos.

– Só mais uma coisa. Fala pro pessoal do escritório parar de me ligar. E fala que eu volto a trabalhar na segunda.

– Mas hoje é terça! – Protesta, indignada.

– Não é quinta? Viu só como eu estou abalado?

– Sei... Agora você tá se aproveitando.

Ela fica em silêncio por um tempo. Ela vai desligar, mas eu ainda não disse o principal, o que preciso dizer. Reúno os frangalhos de minha coragem.

– Desculpa não ter te ligado antes. Eu sabia que você tava preocupada e mesmo assim não te liguei.

– Esquece isso, Gatinho – suplica, com a voz suave. – Eu sei que tá sendo difícil pra você. Sei que você não ia deixar de me ligar se não precisasse desse tempo. A gente se liga umas quinze vezes por dia, mesmo trabalhando juntos.

Meus olhos enchem de lágrimas, mas sorrio. Tenho tanta sorte de ter encontrado uma pessoa como ela. Nesses dias de caos, preciso mais que nunca de sua compreensão e carinho.

– Quando, e se, você quiser conversar sobre isso, é só me falar – garante, com voz séria.

– Eu queria ter te ligado antes – digo, com a voz embargada. – Estava morrendo de saudades.

– Estava? Não está mais? – Provoca, com raiva fingida.

– É – digo. – Agora já estou tranquilo.

– Então podemos desmarcar hoje, certo?

– Certo! – Quase consigo ver seu sorriso.

– Oito horas, então?

– E nem um minuto depois!

– Mais uma última coisa, eu fiz outra aposta – confessa. – Você vai ter que ligar pro Pedrão o quanto antes. Aí eu vou poder comprar uma sandalinha linda pra combinar com o meu vestido novo! Você vai adorar! Mas precisa ser rápido!

– Você tá ganhando dinheiro às minhas custas!

– Sempre! Beijos!

– Beijos.

Deito na cama com o telefone no peito. Em meio a tanta desgraça, só ela para conseguir me fazer sentir tão bem. Para me lembrar o sentido da vida. Ontem, só tinha pensamentos mórbidos. Hoje, estou feliz por ter a oportunidade de estar vivo. Finalmente, acredito que vou superar tudo isso e, quem sabe algum dia, esquecer todo o mal que fiz.

Ligo para Pedrão.

– Eu. Não. Acredito! – Grita. – Essa menina é sinistra mesmo, hein?

Ele ri por um bom minuto e eu rio com ele. Não acredito que não atendi a suas ligações. Tudo que fiz nestas semanas, fiz errado. Como pude achar que ia sair de minha pior crise sem a ajuda de meus melhores amigos, as pessoas mais importantes em minha vida? A cada dia ficava mais para baixo, mais depressivo. Sem eles, o pior poderia acontecer.

– Adivinha onde eu estou – instiga.

– Não tenho a mínima ideia.

– Sério. Adivinha!

– Não sei. Na sua casa? Na praia?

– Cara, eu sabia que ela ia vencer a aposta, aí decidi partir para o ataque. Contratei um chaveiro e gastei metade da aposta para arrombar a sua casa.

Saio do quarto e vou até a sala e o encontro lá, sorrindo. O chaveiro, visivelmente constrangido com a situação, pede desculpas. Nem minha gargalhada o tranquiliza, e quando Pedrão o paga, ele desaparece pela porta.

– E agora meu prejú só aumentou – declara, ainda pelo telefone. – Eu não deveria, mas eu gosto dessa menina!

Vou até ele e o abraço. Ele me abraça de volta. E assim, em um segundo, está tudo resolvido. Aninha e Pedrão. Que eu nunca esqueça o quanto preciso deles em minha vida.

– Desculpa não ter atendido suas ligações – digo.

– Desculpa não ter arrombado a sua casa antes – zomba. – Agora, é sério, qualquer um consegue entrar nesse prédio com um chaveiro e abrir um apê.

– Ah, não exagera, o porteiro te conhece!

– Corrigindo... – insiste – Qualquer um que tenha algum amigo que more aqui pode entrar no prédio com um chaveiro e abrir o apê que escolher.

– Aí sim! – Digo, e ambos rimos.

Ele me olha com atenção por um momento. Sei que está me avaliando. Quer saber se estou bem. Quase não comi nada nesses dias, então devo estar abatido. Também não fiz a barba nem cortei o cabelo, e estou usando apenas uma samba-canção. Devo estar parecendo um pedinte louco.

– E então, chopezinho? – Me pergunta.

– Que horas são? Não tá muito cedo pra isso, não?

– Que isso, cara, são quase cinco da tarde!

Meu relógio marca quatro e meia. Tá cedo para beber e ainda nem almocei. Agora percebo a fome chegando.

– Que barulho é esse? É a sua barriga? – Indaga, rindo.

– Talvez...

– Cara, agora olhando pra você... Você deu uma boa emagrecida. Tá fininho, hein? Tá com o quê, uns 130 quilos, agora? – Brinca, entre gargalhadas.

– E é por isso que eu não te atendi nenhuma vez.

– Nossa, como ele está sensível. Mais uma coisa – continua –, há quantos dias não toma um banho, seu mendigo imundo? Cê tá fedendo pra caralho!

Penso um pouco, mas não tenho essa resposta. Alguns, com certeza. Talvez uma semana. E eu não sou o único imundo nessa casa. Tem lixo jogado pela sala, principalmente em volta do sofá. E Aninha vem aqui hoje. Preciso limpar esse apartamento agora. Ainda bem que ela me ligou antes. Se chegasse aqui nesse chiqueiro não ia rolar nada, com certeza. E, se bobear, essa imagem iria ficar presa na cabeça dela como um exemplo eterno do que não se deve fazer num encontro.

Vou em direção ao sofá e começo a recolher o lixo. Pedrão segura meu braço.

– Cara, vai tomar seu banhinho e deixa que eu limpo essa merdalhada. Vai demorar mais tempo pra você tirar essa sua catinga do que pra eu limpar a casa. Cê tá horrível. Realmente tá parecendo um mendigo.

– Muito obrigado... – Digo, olhando para o espelho.

– E eu quero beber contigo antes que Aninha chegue e estrague nossa conversa de macho. Depois que ela chegar, vocês vão ficar falando sobre quem gosta mais de quem. Você sabe que eu não suporto ficar ouvindo essas balelas açucaradas nem segurar vela.

Eu estreito os olhos, esperando que ele confesse.

– Sim, eu combinei tudo com ela – confessa, cruzando os braços. – Já te falei que essa menina é perigosa, cara? Cuidado com ela!

Eu sigo rindo para o banho. Não vai dar tempo para raspar a cabeça, mas pelo menos a barba eu tenho que fazer.

Depois de semanas de reclusão e tristeza, remoendo as coisas terríveis que fiz e pensando em mil formas de tê-las evitado, com esses dois eu estou feliz novamente. Não posso me esquecer disso nunca. Sem eles, estou sozinho mesmo numa multidão. Eles são as pessoas mais importantes para mim. Mais que meu pai, muito mais que minha mãe. Soa estranho pensar assim, mas não é por isso que deixa de ser verdade. Os dois são as pessoas que mais amo neste mundo e me sinto completo com eles.

Não consigo parar de sorrir.

***

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