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By olimpia_valdez

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๐จ๐ง๐ž, choice
๐ญ๐ฐ๐จ, had not notice
๐ญ๐ก๐ซ๐ž๐ž, fair
๐Ÿ๐จ๐ฎ๐ซ, liar
๐Ÿ๐ข๐ฏ๐ž, fault
๐ฌ๐ข๐ฑ, fear
๐ฌ๐ž๐ฏ๐ž๐ง, empty promises and apologies
๐ž๐ข๐ ๐ก๐ญ, count on me
๐ง๐ข๐ง๐ž, audience
๐ญ๐ž๐ง, sober
๐ž๐ฅ๐ž๐ฏ๐ž๐ง, illusory euphoria
๐ญ๐ฐ๐ž๐ฅ๐ฏ๐ž, hope
๐ญ๐ก๐ข๐ซ๐ญ๐ž๐ž๐ง, trust
๐Ÿ๐จ๐ฎ๐ซ๐ญ๐ž๐ž๐ง, invisible barriers
๐Ÿ๐ข๐Ÿ๐ญ๐ž๐ž๐ง, jealousy
๐ฌ๐ข๐ฑ๐ญ๐ž๐ž๐ง, failed love
๐ฌ๐ž๐ฏ๐ž๐ง๐ญ๐ž๐ž๐ง, relapse
๐ž๐ข๐ ๐ก๐ญ๐ž๐ž๐ง, shame
๐ž๐ฌ๐ฉ๐ž๐œ๐ข๐š๐ฅ, 50k!
๐ง๐ข๐ง๐ž๐ญ๐ž๐ž๐ง, save him
๐ญ๐ฐ๐ž๐ง๐ญ๐ฒ ๐จ๐ง๐ž, time traveller
๐ญ๐ฐ๐ž๐ง๐ญ๐ฒ ๐ญ๐ฐ๐จ, good luck
๐ญ๐ฐ๐ž๐ง๐ญ๐ฒ ๐ญ๐ก๐ซ๐ž๐ž, useless
๐ญ๐ฐ๐ž๐ง๐ญ๐ฒ ๐Ÿ๐จ๐ฎ๐ซ, favorite person
๐ญ๐ฐ๐ž๐ง๐ญ๐ฒ ๐Ÿ๐ข๐ฏ๐ž, selfish
๐ž๐ฌ๐ฉ๐ž๐œ๐ข๐š๐ฅ, 100k!
๐ญ๐ฐ๐ž๐ง๐ญ๐ฒ ๐ฌ๐ข๐ฑ, darkness

๐ญ๐ฐ๐ž๐ง๐ญ๐ฒ, mirror

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By olimpia_valdez

Oi gente!! Como vocês estão?!

ESTAVA COM SAUDADE DE ATUALIZAR 😭😭

Ai sério, a vida de adulta e universitária não é pra qualquer um, tá tudo tão corrido que nem quero entrar em detalhes pra não surtar KKKKKK

Como já tem um tempinho que atualizei, recomendo MUITO vocês lerem o capítulo 19 de novo antes de lerem esse, porque tem referências ao que foi contado nele, além de ser uma continuação direta na linha temporal!

Com isso, desejo uma excelente leitura e também peço, com todo o carinho do mundo, para quem votem! Eu juro que vocês não fazem IDEIA do tanto que essa estrelinha é importante para nós autores aqui dentro do Wattpad!

Espero que gostem do cap <3








🔥




TW/CW: indício de crise de ansiedade, manipulação e menção a práticas
de violência doméstica





Mikey assoprou um pouco a caneca, antes de tomar um gole longo do café que tinha recém preparado, e sentiu o sabor levemente adocicado invadir sua boca. Quando era mais novo, não gostava tanto da bebida cafeinada, mas com o tempo, e principalmente a experiência de ser um estudante universitário, começou a apreciar o poder e a energia que conseguia da bebida.

Além de que ajudava a mascarar a necessidade de um "frenesi", algo que antes conseguia de uma maneira muito mais rápida, como tinha acontecido de novo alguns dias atrás. O pensamento logo tomou a sua mente, como um vendaval, uma confusão de opiniões sobre a própria vida e os erros que cometia quase que diariamente, mas tentou ignorá-lo, fechando os olhos, se concentrando, também, em esquecer o leve tremor que tomava suas mãos.

Se encostou contra a bancada de quartzo da cozinha e voltou a abrir os olhos, observando a casa praticamente silenciosa. O único som que conseguia escutar era o canto de alguns poucos pássaros que sempre apareciam no quintal da casa, o que o fez sorrir um pouco, somente um repuxar no canto dos lábios, mas até que estava sendo uma maneira decente de começar o dia. Ele não tem o costume de acordar tão cedo assim, as aulas dele só começam mais tarde e acaba aproveitando para tentar conseguir dormir de alguma maneira, mas hoje seria um dia diferente.

Afinal, é 8 de setembro.

Mesmo com toda a confusão que aconteceu na última semana, inclusive a própria recaída perante a cocaína, ele não esqueceria do que Kazutora tinha o confidenciado, que hoje seria o dia em que visitaria o pai depois de cinco anos. Por causa das grades horárias serem diferentes, geralmente só conseguem se ver na hora do almoço e nos treinos, já que no resto do dia tinham suas próprias obrigações para cumprir.

Assim, Mikey se viu determinado a acordar cedo para poder conversar com o melhor amigo, ou no mínimo o abraçar e dizer que daria certo, o que ele torcia com toda a vontade do mundo. Ele se lembrava com clareza de como tudo tinha sido um caos há cinco anos atrás e como tinha reagido ao descobrir a existência das cicatrizes de Kazutora. Inclusive, a memória do dia em que as tocou pela primeira vez ainda era vívida em sua mente, como passou os dedos pelas profundidades, sentiu a textura da pele e imaginou qual tinha sido a força colocada naquilo para deixar tal marca.

Até hoje, nunca aceitou plenamente o que tinha acontecido com o melhor amigo.

Então, quebrando o silêncio que estava instalado no andar de baixo, passos foram escutados, vindos dos degraus da escada, e Mikey logo teve Kazutora aparecendo no campo de visão. Em um primeiro momento, o moreno não tinha percebido o outro ali, completamente preso na própria mente, mas reparou algo de estranho ao sentir o cheiro de café, já que ele sempre era o primeiro a acordar.

— O que você está fazendo aqui tão cedo?

— Bom dia pra você também — Mikey falou, com um sorriso travesso no rosto, e Kazutora balançou a cabeça em negação, terminando de se aproximar.

— Bom dia, mas ainda não respondeu a minha pergunta.

— Não posso simplesmente acordar cedo?

— Não.

Mikey olhou o melhor amigo completamente indignado por causa da resposta, o que fez, inclusive, Kazutora rir um pouco, enquanto pegava uma caneca do armário, para também se servir de café.

— Sei que você não acordaria cedo sem motivo. Então, por que?

— Bem, hoje é dia 8 de setembro.

— E o que tem haver?

— Realmente acha que eu te deixaria ver aquele cara sem falar com você antes?

Kazutora não soube o que responder e aproveitou para desviar o olhar, terminando de colocar o café na caneca e tomar um gole em seguida, não gostava de por açúcar.

— Você não quer ir — Mikey quebrou o silêncio, conseguindo a atenção dos olhos dourados de volta.

— Não mesmo.

— Fale.

Kazutora não entendeu de primeira o pedido do melhor amigo, o que fez o loiro suspirar e colocar a caneca da bancada, cruzando os braços na altura do peito.

— Fale o que você está pensando sobre tudo isso, nem que seja só um pouco.

O moreno sabia que essa era a forma de Mikey o ajudar, o fazendo falar sobre o que sentia, mas nem na terapia, que foi obrigado judicialmente a fazer por seis meses, resolveu muita coisa e acaba que mesmo que tente, nunca consegue realmente explicar o que sente. Afinal, Kazutora ficou preso por muito tempo, sem a liberdade de poder crescer, falar e ser o que quiser.

— Você me julgaria se eu dissesse que ainda tenho medo dele? — perguntou, envolvendo a caneca com as duas mãos — Me sinto meio ridículo falando isso em voz alta — riu fraco, mesmo que o tom ácido também estivesse ali.

— Não é ridículo sentir isso.

— Realmente acha?

— Com certeza — Mikey sentia um aperto no peito por sequer imaginar que Kazutora poderia duvidar disso, achar que ter medo daquele cara fosse errado.

— Já tem cinco anos e eu não sou mais um adolescente, então tipo, por que ainda sentiria isso? Na real, por que ainda "sinto" alguma coisa em relação a ele?

— O Jacob poderia ter matado você — a voz do loiro era séria, enquanto olhava o melhor amigo nos olhos — As suas costas são a prova viva disso.

Os olhos de Kazutora arregalaram um pouco, porque mesmo que seja uma verdade, é uma que ele nunca quis admitir.

— Isso me assusta até hoje, sabia?

— Como assim?

— Saber que ele poderia ter te matado, eu não gosto de lembrar que isso poderia acabar acontecendo.

Depois de ter descoberto sobre o que acontecia com o próprio melhor amigo, Mikey se viu pensando sobre a quantidade de coisas que poderiam ter ocorrido, caso você não tivesse convencido Kazutora a levar tudo para a polícia. São tantas possibilidades que em algum momento simplesmente desistiu de continuar pensando nelas, sabia que poderia enlouquecer, e também se frustrava em pensar que essa é uma realidade que milhões de famílias passam ao redor do mundo.

Kazutora se viu, por alguns segundos, em silêncio, com as palavras presas na garganta, ele realmente não sabia o que responder. Por muito tempo, ele soube que essa era uma possibilidade, principalmente ao começar a falar em voz alta sobre o que tinha passado.

Nunca se esqueceria da expressão da juíza e dos componentes do júri popular no dia do julgamento que condenou Jacob por todos os seus crimes.

Nunca esqueceria das reações das pessoas ao verem as fotos das cicatrizes nas costas, que foram utilizadas como prova.

— Não é errado sentir medo de alguém que poderia ter tirado a sua vida, Kazutora.

— Mesmo sendo o meu próprio pai?

A pergunta pegou Mikey de surpresa, principalmente pela expressão que tomava o rosto do moreno, repleta de insegurança.

— Mesmo ele sendo o seu pai.

— Às vezes eu tento ignorar isso — admitiu, mesmo que ainda sentisse uma espécie de nó se formando dentro do peito.

— Que ele é o seu pai?

— Exato. Não sei, parece mais fácil pensar que tudo aquilo que aconteceu foi um estranho que fez.

— Eu sei que não é só isso.

— Que?

— Eu sei que não é só por isso que você quer ignorar que ele é o seu pai.

— Mikey...

— Eu sei o que realmente tá passando pelo a sua cabeça, mas, em algum momento, você vai ter que falar isso em voz alta ou, no mínimo, admitir que sente isso.

— Já pensou em fazer psicologia? — resmungou, o que fez o outro rir.

— Você sabe que a resposta é sim.

Revirou os olhos, ouvindo mais uma vez a risada de Mikey ecoar pela cozinha, se lembrava de como tinha ajudado o amigo a escolher educação física.

— Talvez um dia eu fale sobre isso.

— E eu vou estar aqui para ouvir.

— Adoro os momentos em que você não age como um completo babaca.

— Posso dizer o mesmo sobre você, amor da minha vida.

Kazutora simplesmente balançou a cabeça em negação, deixando que um leve sorriso estampasse o rosto, principalmente quando Mikey se aproximou com os braços abertos. Não admitiria que estava precisando desse abraço e dessa breve conversa, sabia que isso inflaria o ego do loiro de uma maneira tão grande que não aguentaria conviver com ele por uns bons dias, mas sempre, sempre, sentiria gratidão por ter Manjiro Sano como melhor amigo.

— Agora, você está relativamente melhor? — Mikey perguntou, ao terminar o abraço e ficar, agora, de frente para Kazutora.

— Um pouco, tipo, eu ainda não sei quem eu vou encontrar lá e isso me assusta um pouco.

— Como assim?

— Eu não sei mais quem ele é — tentou explicar, não sabendo se o que pensava fazia sentido — Ele é o meu pai? Jacob Hanemiya? Um criminoso? Ou alguém de alguma maneira mudou?

— E você quer descobrir?

— Não — suspirou — Por isso que eu falo que eu gostaria que ele fosse um estranho, não teria que sentir tantas coisas se ele não fosse nada pra mim. Se ele, realmente, pudesse desaparecer.

Mikey não soube o que dizer de primeira, principalmente por ainda se ver em uma situação que se sentia incerto, escutar Kazutora falar sobre ele mesmo, sobre os pensamentos que o atormentam dia e noite. Até hoje, mesmo depois de praticamente uma vida sendo melhores amigos, nunca conseguiu entender como o moreno não tinha surtado, ou no mínimo ter tido algum momento em que permitiu realmente ser vulnerável.

Nem quanto você descobriu tudo ele foi completamente, ainda tinhas as barreiras de proteção levantadas, ele só tinha deixado que você passasse por elas.

— Eu ainda estou torcendo para que algo aconteça e você e a Maddy não precisem encontrar ele.

— Também estou torcendo pra isso. Eu só...

As palavras ainda estavam presas na garganta, como se uma cortina de fumaça estivesse presa ali, impossibilitando que elas fossem ditas, reveladas, como se aqueles pensamentos, os medos e as verdades que Kazutora carregava sobre si mesmo e sua relação com o próprio pai, tivessem vida própria, de maneira que não queriam ser revelados, queriam morrer no anonimato do silêncio.

— Não precisa se forçar a falar.

— Eu sei... — Kazutora respondeu, sentindo uma espécie de angústia, desistindo, também, de ficar parado.

Saiu de onde estava e andou alguns passos pela cozinha, sentindo os olhos escuros de Mikey o acompanharam a cada passo.

— Se sabe, por que está agindo assim?

— Eu não quero, mas também sei que preciso. Sou obrigado a falar em algum momento.

— Quem está te obrigando a isso? — a pergunta veio de forma automática na língua de Mikey, mas ele não pensou que veria o corpo do melhor amigo tensionar, conseguiu notar a leve rigidez nos ombros.

— Eu mesmo.

A resposta veio segundos depois, demarcando um silêncio tenso e complexo, perante a dupla, que não sabia mais o que dizer e mesmo que fosse uma situação não ideal, Mikey saiu de onde estava e apoiou a testa no ombro de Kazutora.

— Não diga. Não fale isso pra mim hoje. Por favor.

A súplica perfurou o coração de Mikey como uma navalha e o loiro engoliu, com uma certa dificuldade, o pedido de desculpas e se permitiu ficar em silêncio, deixando que o som dos pássaros fosse a única coisa que ecoasse pela cozinha.

— Eu não vou estar completamente sozinho lá — Kazutora falou, com voz baixa e quebrando o silêncio.

— Como assim?

— A [Nome] falou que vai comigo.

— Isso te dá pelo menos algum conforto, não é?

— Você não faz ideia.

Kazutora se permitiu suspirar e ser guiado, em seguida, na direção do balcão da cozinha, sentando em uma das banquetas e somente observando Mikey fazer o café da manhã. Se fosse em um outro dia, já estaria reclamando e não deixando que o loiro fizesse tal coisa, não gosta de quando pessoas fazem algo assim por ele, não gosta de "dar trabalho", mas o moreno não tem forças para fazer isso, pelo menos não hoje.

Os dois acabaram não falando mais nada ao longo do breve café da manhã, com direito a receita de panquecas de Mary, mesmo que não tenham ficado tão boas quanto geralmente ficam, quando Kazutora as faz. Porém, o Hanemiya nunca reclamaria ou falaria algo sobre, afinal, pra ele, atitudes sempre valem mais do que palavras e ele sabe muito bem como Mikey odeia cozinhar.

A conversa que tiveram ainda se perpetuaria pela cabeça de Mikey por um bom tempo, principalmente ao observar, da janela da sala de estar, Kazutora sair pela porta e subir na moto, na intenção de ir até as aulas que teria na parte da manhã. Ainda sentia o aperto do último abraço que deram antes de despedidas breves, mas algo dentro dele o fazia se sentir ansioso, como se gritasse que algo aconteceria e que não seria bom.

Mikey respirou fundo, na tentativa de diminuir a ansiedade crescente, e deixou que o barulho do motor da Harley de Kazutora o preenchesse, reverberando pelos ouvidos. Tinha que continuar torcendo para que tudo desse certo, tinha que acreditar que o seu melhor amigo voltaria dessa visita ainda o mesmo, mas isso é algo praticamente impossível, o próprio Kazutora sabe disso.

Por isso ainda tem medo do próprio pai, porque sabe o tanto de poder que o mais velho ainda tem sobre ele, sabe que algumas poucas palavras vindas de Jacob conseguem o atingir de maneiras absolutas.

E foi assim, com a mente cheia de memórias e lembranças amargas, que Kazutora passou a manhã, sabendo que não tinha aproveitado quase nada das aulas, nem sabia ao certo porque tinha vindo, mas uma parte de si dizia que foi bom, pelo menos por breves minutos ele conseguiu se perder em meio as matérias do curso que tanto gostava. Inclusive, não achou muito justo as horas terem passado tão rapidamente, parecia que o próprio universo conspirava para que a visita acontecesse logo.

Como se o mundo gritasse que Kazutora teria que enfrentar, de uma vez por todas, as verdades e os medos que guarda na parte mais profunda do próprio coração.

Suspirou ao chegar no estacionamento do prédio e desejou, nem que por poucos segundos, que pelo menos te visse e pudesse falar com você. Sabia que somente te veria mais tarde, no horário que tinham combinado de você ir até a casa dele para irem até a prisão estadual que Jacob está preso, já que ela fica na cidade de Lancaster, mais de uma hora de distância de Los Angeles.

Ao não te encontrar, Kazutora subiu na moto, colocou o capacete e logo deu partida, seguindo o caminho para casa. Tinha decidido que faltaria a única aula que tinha no período da tarde e avisou o treinador Scott sobre o que aconteceria. Se pudesse, ninguém além de você, Mikey e a própria família saberiam da visita, mas como teria que faltar ao treino, não teve muita opção. Não é como se o Hanemiya não gostasse do treinador, inclusive, ele é um dos homens que mais respeita e admira na vida, mas quando se trata de assuntos assim, que mexem com suas maiores inseguranças, não se sente à vontade o suficiente para conversar sobre eles com qualquer pessoa.

O caminho para casa também não foi tão demorado, afinal, a UCLA fica relativamente perto de Beverly Hills e da parte do bairro em que você e Kazutora cresceram. Assim, o moreno logo se viu pegando a chave da casa na mochila e abrindo a porta, sendo recebido pelo cheiro incrível da comida de Tony, o namorado de Mary.

— Cheguei! — gritou do hall de entrada, deixando o capacete e a mochila na cômoda de madeira escura que decorava o espaço.

— Estava com saudade de você aparecendo aqui pra almoçar — Mary disse, se aproximando do filho com um sorriso no rosto.

— E eu estava com saudade de comer a comida do Tony.

— Zero saudades de mim? — brincou e riu com a revirada de olhos de Kazutora, o abraçando de volta.

— Você nem comece a imitar a carência da Maddy, mãe.

Mary se permitiu rir mais uma vez e, ao finalizar o abraço com o filho, levantou o rosto para o encarar nos olhos, percebendo como não estavam tão brilhantes como de costume. Suprimiu a vontade de dizer alguma coisa, sabia que não adiantaria de nada, além de, até mesmo, abrir feridas que aos poucos cicatrizavam nela mesma.

— Pensei que o Tony estaria de plantão hoje — o moreno comentou, enquanto seguia a mãe pela sala de jantar para irem até a cozinha.

— Ele trocou o dia, ele vai fazer domingo.

— Por causa de hoje?

— Sim — Mary respondeu, olhando para o filho por cima do ombro — Ele queria ficar aqui, caso algum de nós precisasse de algo.

Não foram poucas vezes que Kazutora se viu desejando ter tido Anthony como pai, ou pelo menos que ele fosse o pai de Madeleine. Coisas como essas, trocar um plantão de sexta para domingo e bagunçar toda uma agenda de trabalho por causa deles, o faz desejar isso ainda mais. O moreno só se viu conseguindo assentir, não saberia o que dizer plenamente como resposta em relação a isso, sabe que a própria mãe pensa da mesma maneira.

A figura do bombeiro logo entrou no campo de visão de Kazutora, que sorriu de leve ao sentir o cheiro de uma de suas comida favoritas do livro de receitas da família do padrasto, bucatini all'amatriciana, um prato extremamente tradicional da cidade de Amatrice, que fica na região central da Itália e é o local de nascimento de Tony, que se mudou para os Estados Unidos aos dez anos de idade junto com os pais.

— Você está querendo me deixar mimado, Tony — Kazutora falou, conseguindo a atenção do padrasto, que simplesmente sorriu e se aproximou no mais novo, o abraçando levemente de lado.

— Acho que uma vez ou outra não tem problema.

O moreno sorriu de volta com a resposta e se encostou em uma das bancadas, começando a observar a dinâmica dos dois adultos na cozinha.

— A Maddy vai almoçar aqui também?

— Não, ela preferiu comer na escola.

— Por que?

— Ela tem uma prova segunda-feira e o professor falou que ele faria uma revisão antes, só que a aula dele é de tarde.

— Sempre esqueço que a Maddy se esforça na escola.

— Ela decidiu recentemente o curso que quer fazer na faculdade, então acaba que ela já quer começar a se preparar e arrumar o boletim.

— Sério? Ela decidiu o que?

— Não podemos dizer, ela mesma quer te contar.

— Mas isso não é justo! — Kazutora argumentou e Mary riu, enquanto terminava de preparar a salada — Vocês me soltam uma novidade dessas e recuam?

— Sempre soube que você era do tipo de fofoqueiro — Anthony provocou.

— É que você não viu como ele e a [Nome] eram na época da escola. Passavam horas falando da vida dos outros.

— Nem vem, mãe! Você ficava escutando e ainda dava palpite!

Mary soltou uma risada alta e, por um instante, Kazutora se permitiu somente apreciar o som e como pareceu fácil ele ter saído.

— Tá bom, pelo menos isso eu tenho que admitir.

— Então me conta! Não quero ter que esperar algumas horas pra Maddy me falar.

— Não podemos dizer diretamente, mas acho que podemos dizer algo parecido, bellisima.

— Talvez — Mary disse pensativa, enquanto tentava não demonstrar como tinha ficado vermelha com o apelido.

Tony sempre chamou Mary de "bellisima", que é "linda" em italiano, e mesmo depois de quase três anos juntos, nada faria com que o efeito de tal coisa mudasse nela.

— Você se lembra da primeira opção de graduação da [Nome]?

— Claro — Kazutora respondeu automaticamente, sem pensar muito, mas não demorou para que a realização batesse — Espera, é sério?

— Sim.

O moreno ficou em silêncio, somente absorvendo a ideia, mas logo um leve sorriso apareceu no rosto dele. Nunca tinha passado pela sua cabeça que Maddy um dia poderia querer ser médica, mas agora que possui essa informação para si, a situação é completamente outra. Por muito tempo, você quis fazer medicina, mas depois de pesquisar mais sobre a área, percebeu que aquilo não era o que queria, achando na enfermagem a sua verdadeira paixão.

— Tive a mesma surpresa que você quando ela me contou.

— Simplesmente faz muito sentido — Kazutora falou, ainda um pouco admirado.

— E aí é por isso que ela já quer mudar algumas coisas perante a escola. Mesmo que tenha toda a situação de que a especialização de medicina só venha depois, ela já quer meio que preparar o caminho.

O curso de medicina acontece de uma maneira diferente nos Estados Unidos. Antes, já em uma universidade, deve-se fazer uma sequência específica de matérias durante quatro anos, que são conhecidas como "Pre-med", e só depois tentar uma vaga na própria faculdade de medicina, que dura mais quatro anos e é extremamente concorrida. Kazutora bem sabe quais são os empecilhos de fazer tal curso, se lembrava das conversas que teve com a mãe de Baji na época que ainda estava definindo qual curso faria na faculdade, mas também tem a total certeza de que Maddy conseguiria e que ainda seria uma profissional incrível.

Assim, a conversa entre os três foi fluindo entre os mais diversos assuntos, desde a própria escolha de Maddy para a faculdade até o jogo que Kazutora teria no dia seguinte, no sábado, contra o time de Stanford, sendo o primeiro jogo fora de casa, acontecendo em San Francisco. Com a rotina de Anthony repleta dos plantões e a própria Mary cuidando e administrando a pequena escola de culinária que tinha aberto no início do ano, não conseguiam ver todos os jogos pessoalmente, mas sempre programavam para gravarem e verem depois ou até mesmo assistiam ao vivo pela TV, principalmente nesses casos de serem em outras cidades.

Inclusive, Kazutora se sentiu extremamente feliz ao ver a mãe falar tão animada sobre as aulas e de como estava pensando em abrir mais uma turma. Depois que Maddy criou contas nas redes sociais para divulgar o trabalho da mãe, cada vez mais pessoas começaram a se interessar pelas aulas de "culinária prática" que Mary proporciona, de maneira que, hoje, a loira já tem uma pequena loja no centro de Los Angeles, onde grava algumas receitas e ministra as aulas.

Mary não precisaria trabalhar, o dinheiro que ganhou das ações e investimentos de Jacob no momento do divórcio seria o suficiente para que ela e os filhos mantivessem o alto padrão de vida californiano e ainda sobrasse, mas ela se negou a continuar sendo quem era enquanto ainda estava com o ex-marido. Decidiu abrir a loja por sempre ter sido apaixonada por culinária, inovando, refazendo receitas antigas ou criando novas, e não poderia estar mais animada com as mudanças e o sucesso que estava conseguindo.

Momentos como esse, recheados de uma normalidade aconchegante faziam com que Kazutora aceitasse um pouco mais a maneira em que a sua vida se encontrava, que ele tem, hoje, uma família incrível e que o futuro ainda pode lhe proporcionar muitas coisas e as possibilidades são, e sempre foram, infinitas. Porém, ele tinha um conflito interno dentro de si, algo que ele nunca verbalizou, mas que é a principal cicatriz que Jacob deixou nele.

Assim, não demorou para que o horário do final das aulas de Maddy chegasse e Kazutora logo estava indo de moto até a escola da mais nova, faria uma surpresa em aparecer lá, mesmo que a distância a pé entre os dois lugares fosse de menos 15 minutos. Ao chegar na antiga escola, o moreno se viu recheado de uma espécie de nostalgia, tinha sido, ao mesmo tempo, o orgulho e a fonte de dor de cabeça da diretoria por muitos anos, sabia que tinha deixado uma marca naquele lugar.

Estacionou a moto relativamente perto da entrada e tirou o capacete, deixando que o cabelo caísse pelos ombros, enquanto esperava o sinal tocar e uma multidão de alunos aparecer na porta da escola. Aproveitou para checar o celular, vendo somente algumas mensagens em grupos, como o do time e o da fraternidade, mas não se deu o trabalho de responder nenhuma, lidaria com o resto do mundo depois.

Praticamente cinco minutos depois, os primeiros alunos começaram a sair, completamente extasiados por finalmente ser sexta-feira e Kazutora tinha quase certeza de que hoje seria uma noite de jogo na escola, as faixas vermelhas e pretas denunciavam como a temporada de futebol americano escolar também tinha começado. Assim, não demorou a ver os jogadores, que usavam suas jaquetas com orgulho, inclusive conteve a vontade de rir, agiu daquela maneira por todos os anos do ensino médio.

Porém, a alegria do moreno sumiu quando os olhos bateram na própria irmã, que tinha o braço de Hakkai passado pelo pescoço, enquanto saiam da escola, Kazutora ainda não tinha aceitado o fato de que a sua irmã caçula estava, literalmente, beijando um cara e ainda dizendo que gostava dele. Se isso fosse o inferno, já poderia dizer que é melhor amigo do próprio diabo.

— Madeleine! — gritou o nome da irmã, que escutou, só não percebendo de onde vinha o som, balançando a cabeça em procura por quem tinha a chamado.

Assim, gritou de novo o nome dela e foi aí que a mais nova percebeu a presença de Kazutora. Maddy se desgrudou de Hakkai e saiu correndo na direção do irmão que, nesse meio tempo, se levantou da moto, para receber o abraço que sabia que a irmã o daria. Dito e feito, a caçula praticamente voou nele, o abraçando pela cintura com força.

— Não sabia que me amava tanto assim — o mais alto provocou e escutou a risada abafada da irmã como resposta.

— Não vai se achando tanto.

Kazutora abraçou Maddy na mesma intensidade que ela, deixando que a caçula ficasse ali o tempo que precisasse. Conseguiu notar alguns olhares sobre si, principalmente do time de futebol, que tinham o reconhecido e o olhavam com animação e admiração no rosto, o próprio Hakkai se encontrava como os colegas de time, porque mesmo que tivesse praticamente crescido ao redor de vocês, nunca esconderia a admiração que sentia.

— Está tudo bem?

— Você sabe a resposta... — a caçula respondeu, levantando o rosto e Kazutora não conseguiu encarar por muito tempo os olhos verdes da irmã.

— Eu quero conversar com você antes de irmos pra lá — foi o que conseguiu dizer e Maddy suspirou, aceitando o capacete que o irmão lhe entregava.

— Sobre o que?

— As regras de lá e só alguns avisos.

A morena sentia a ansiedade quase que queimar no estômago, mal focou no que realmente acontecia nas aulas, tendo que se esforçar muito para prestar atenção na revisão do professor Johnson, realmente não queria ir mal na prova de cálculo que teria na segunda-feira, mas se sentia perdida, não queria ter que encontrar alguém que já tinha praticamente apagado da própria mente. Jacob nunca foi o pai de Madeleine, quem cumpriu esse papel por anos a fio foi o próprio Kazutora, que assumiu a responsabilidade de a proteger sem nem pensar duas vezes, mesmo sendo uma criança.

— Vai querer se despedir de seus amigos?

— Se eu for lá, vão me pedir autógrafo ou fotos com você, ou seja, não quero.

Kazutora riu com gosto e balançou a cabeça em negação, enquanto subia na moto e colocava de volta capacete, sendo seguido por Maddy, que o abraçou pela cintura quando girou a chave e o motor da Harley ecoou pelo estacionamento. O trajeto da volta foi tão rápido quanto a ida, a pouca distância entre a escola e a casa facilitava muito e não demorou para que os dois irmãos estivessem entrando em casa, sendo recebidos brevemente pela mãe e pelo padrasto, mas logo estavam subindo as escadas na direção do quarto da caçula.

Se o quarto de Kazutora sempre foi limpo e meticulosamente organizado, tendo como exemplo os livros organizados em ordem alfabética e por cor, o de Maddy é o completo oposto, com os mais diversos posters colados na parede, porta-retratos em todos os cantos, papéis jogados pela mesa de estudos e as dezenas de pelúcias, que decoram a cama de tamanho queen, que ficava bem no meio de uma das paredes do cômodo.

— Tem algum código de roupa?

— Não pode usar roupa laranja e as peças devem ser simples, sem acessórios chamativos. Também fazem a sugestão do uso de calças jeans.

— Por que não pode laranja? — Maddy perguntou um pouco curiosa, enquanto observava o irmão se jogar e deitar de costas na cama.

— É a cor do uniforme dos detentos e por questões de segurança, pedem para evitar que usem roupas de tons parecidos.

— Entendi — respondeu em voz baixa, levando o olhar, agora, para o armário.

Kazutora percebeu o nervosismo no tom de voz da irmã e se xingou mentalmente por não poder fazer nada para evitar que ela tivesse que passar por tudo isso, mesmo que ela mesma seja bem mais resolvida do que ele em relação a tudo que envolve Jacob. Além do fato de Maddy ter sido uma criança no auge de tudo, ela realmente fez terapia e continuou por anos, atualmente tem somente uma sessão mensal.

Maddy conversou sobre e trata os traumas que ganhou na infância, como a síndrome do pânico, que foi diagnosticada quando ela tinha onze anos. Kazutora não conseguiu evitar completamente que o pai não atingisse a irmã, pode até ter a protegido de maneira física, sendo o único que carrega cicatrizes entre os dois, mas o abuso psicológico também conseguiu destruir aos poucos a mente da garota.

Suspirou ao ouvir a porta do banheiro se fechando, a indicação de que Maddy estava trocando de roupa, e fechou os olhos, tentando se concentrar na própria respiração, mesmo que o coração começasse a acelerar. O tempo estava passando e a visita deles marcada para às 17:30 horas também, já tinha conferido o olhar no celular umas quatro vezes. Teriam que sair de casa precisamente às 16 para não se atrasarem, mas o seu sumiço o estava preocupando.

Kazutora aproveitou esse tempo que a irmã se arrumava para te mandar mensagem, mas não recebeu respostas e muito menos qualquer indício de que você estava disponível. Ligou, caindo na caixa postal em poucos toques, o que também o preocupou, você sempre atende o telefone, independente da hora e do lugar. Sabia que estava, talvez, pensando demais, nutrindo a própria ansiedade que queimava na boca do estômago como fogo, mas como ele conseguiria evitar?

Anos atrás, ele só tinha enfrentado o pai por sua causa, mas ele conseguiria, hoje, o enfrentar sem você?

Uma pergunta a qual Kazutora não quer saber a resposta.

Desviou a atenção do celular ao ouvir o barulho da porta abrindo e se deparou com a irmã praticamente pronta, calça jeans de lavagem clara, uma blusa azul de mangas curtas e um all star preto.

— Nós vamos que horas? — Maddy perguntou, enquanto colocava a roupa que tinha usado na escola no cesto de roupas sujas.

— Às 16 horas.

— Temos uns minutos então.

O relógio tinha acabado de marcar 15:35.

— Você disse que queria conversar comigo antes de irmos — falou, um pouco receosa, enquanto se deitava na cama também.

Kazutora suspirou, ainda encarando o teto, sabia que não conseguiria falar desse tipo de coisa observando os olhos verdes da irmã, tão iguais aos olhos da mãe que o deixam desnorteado, dependendo do momento.

— Lá é um local controlado, vão nos revistar várias vezes e conferir nossos documentos. Nós vamos o encontrar na sala de visita comum, então vão ter outras pessoas lá também fazendo visitas.

— Não vamos ficar sozinhos com ele, né?

— Não. A sala sempre vai ter pessoas e ainda tem os agentes penitenciários.

Maddy só conseguia assentir e absorver as falas do irmão, estava se preparando para ficar calada, mas a possibilidade de encontrar Jacob depois de tanto tempo a assustava.

— Você não precisa dizer nada pra ele, pode ficar calada e fingir que ele não existe.

— Você sabe melhor do que eu que isso é impossível.

Kazutora tomou coragem e virou o rosto para o lado, encontrando a irmã abraçada com uma das pelúcias, enquanto o observava com atenção.

— Nós vamos entrar lá, ficaremos calados, esperamos o tempo mínimo de visita passar e vamos embora, tudo bem?

— Tudo bem — a garota suspirou e se encostou no irmão, sentindo um carinho ser depositado nos fios de cabelo.

Maddy sempre foi o mundo de Kazutora e desde o momento em que Mary contou que estava grávida, não teve um dia que tal coisa sequer cogitou em ser alterada. Eles podem não se ver mais todos os dias, terem rotinas completamente diferentes, mas sempre estavam se falando, trocando mensagens ou até mesmo ligações, mantendo firme e forte a ligação que existe entre eles desde o momento em que se conheceram, com Maddy ainda sendo uma recém-nascida.

— A mamãe falou que você tem uma novidade pra me contar... — Kazutora cutucou a costela da irmã, que se contorceu, evitando que o mais velho começasse um ataque de cosquinhas.

— Ela já te contou, não é?

— Ela me deu uma dica e eu adivinhei, é completamente diferente.

— Não é! — Maddy tentou argumentar e Kazutora riu, beliscando o nariz da mais nova.

— Eu já posso te chamar de Dra. Madeleine?

— Você é um chato — reclamou de novo, mas não poderia esconder como estava levemente animada com a conversa.

— Só estou adiantando o futuro!

— Virou um viajante no tempo?

— Seria a realização de um sonho.

Maddy sentiu, como um soco no estômago, a fala do irmão, porque ela já imaginava o que poderia se passar pela cabeça dele. Eles praticamente nunca falaram sobre Jacob, só em poucas ocasiões e que foram tão desconfortáveis que nenhum dos dois quer relembrá-las, mas a morena sabe o tanto que o irmão deseja poder mudar o passado e não necessariamente por ele, mas por ela e pela mãe.

— Só que infelizmente não podemos mudar o passado — Kazutora voltou a falar, quebrando o silêncio que tinha se instalado no quarto, pintado quase que majoritariamente de um tom suave de lilás.

— Mas podemos garantir que o futuro seja diferente.

— Podemos — um sorriso fraco apareceu no rosto de moreno, que tinha voltado a encarar o teto, perdido no próprio turbilhão de pensamentos, um que Maddy nunca conseguiu entrar.

Os dois irmãos ficaram ali, juntos, deitados na cama e somente sentindo o conforto que a presença um do outro causava, completamente inebriados pela paz que sentiam, no meio da confusão do dia a dia. Porém, isso significava a passagem do tempo e Kazutora quase pegou o próprio celular e o jogou contra a parede quando o alarme que tinha programado para apitar às 16 horas tocou, reverberando pelo quarto como uma explosão de uma bomba, destruindo toda a miragem que tinha se formando em torno dos Hanemiya.

— Já tá na hora? — a voz de Maddy era como um sussurro, como se tivesse medo do que falava.

— Está.

Kazutora suspirou ao se levantar da cama, checando mais uma vez o celular, procurando algum sinal de vida seu, mas não tinha nada ali, como se você tivesse simplesmente desaparecido.

— Pega a sua bolsa e confere se não está esquecendo nenhum documento — pediu para a irmã antes de sair do quarto, já ligando para o seu número.

Desceu as escadas com o celular na orelha e esperava a ligação ser concluída, enquanto mexia na mochila, pegando a pasta que já tinha organizado com as autorizações e formulários que deveria entregar na entrada do presídio, junto com uma cópia da própria decisão judicial, gostaria de deixar evidente que não estava ali pela mais pura vontade. Porém, mais uma vez a ligação tinha caído na caixa postal e Kazutora se viu frustrado, sentindo uma sensação ruim se espalhar pelo próprio corpo, como se mãos fantasmagóricas do próprio passado passassem por ele e quisessem dominar cada milímetro da mente dele.

— Vocês já vão, não é? — foi a voz de Mary que o acordou do transe, de encarar o próprio celular em busca de respostas que sabia que não conseguiria.

— Isso.

— Olha, filho, eu realmente não queria que vocês tivessem que fazer isso...

— Eu sei, mãe, de verdade. Essa é a última coisa que você tem que se preocupar.

Mary só conseguiu assentir, se aproximando e dando a única coisa que conseguiria, um abraço apertado, um que Kazutora sabia que precisava e que nunca recusaria. Assim, Maddy não demorou a aparecer e a morena praticamente voou escada a abaixo se enfiando no meio daquele abraço, sentindo os braços do irmão envolverem ela e a mãe.

— Qualquer coisa, me liguem, tudo bem? — pediu para os dois filhos, que assentiram com a cabeça.

Anthony também apareceu para se despedir dos enteados, mas nada disse, aquele momento não era dele e ele respeitaria isso até o fim. Kazutora se viu respirando fundo várias vezes ao andar até a garagem da casa, com as chaves do carro da mãe em mãos, uma BMW X3 da cor branca, já que Mary tinha pedido para que eles usassem o carro dela, não queria que fossem de moto. A loira nunca gostou realmente do veículo de duas rodas, até mesmo tinha se colocado contra o fato do filho ter ganhado a Harley de Shinichiro quando ele completou 17 anos, mas ninguém conseguia dizer "não" para o primogênito dos Sano.

Kazutora olhou o celular mais uma vez, enquanto arrumava o banco e os retrovisores para que pudesse sair da garagem com o carro, uma ação que não passou despercebida por Maddy, que já tinha se ajeitado no banco do passageiro.

— Está esperando a mensagem de alguém? — perguntou, curiosa, pensando em uma possibilidade de provocar o irmão, mas a expressão séria de Kazutora fez com que Maddy logo descartasse essa possibilidade.

— Não mais.

A resposta foi tão vaga que causou uma espécie de silêncio no carro, que só começou a ser quebrado pelo barulho do motor.

— Posso saber quem é? — Maddy achou coragem para perguntar, enquanto o irmão tirava o carro da garagem e por um momento ela pensou que ele não a responderia.

O silêncio se prolongou pelos metros que percorreram ainda na rua deles e a morena já tinha aberto a boca para dizer que ele não precisava responder, mas ela foi interrompida pela própria voz do irmão.

— A [Nome].

— Por que você está esperando alguma mensagem dela? — a curiosidade bateu mais forte.

— Porque ela tinha dito que viria com a gente.

— Mas então por que ela não veio? — a pergunta verbalizada fez Kazutora apertar o volante com um pouco mais de força.

— Eu não sei.

Maddy se viu novamente em silêncio, contemplando o rosto do irmão, que não tirava os olhos da rua, nem por um instantes sequer. A garota se viu um pouco derrotada ao começar a analisar as entrelinhas de toda a situação, ela sabe o tanto que você significa pra ele, principalmente quando envolve o pai deles. Suspirou ao conectar o próprio celular no bluetooth do carro e colocou uma de suas playlists para tocar, deixando que a música preenchesse o carro, em uma mínima tentativa de amenizar a tensão que se formava ao longo de Kazutora.

Saíram do mar de prédios e da muvuca de carros de Los Angeles para a paisagem desértica que decorava o percurso entre as duas cidades, até a estrada mudou, virando uma via de mão dupla, com somente uma faixa indo e outra voltando, quando estavam chegando mais perto de Lancaster. Maddy tentou o caminho inteiro se distrair, cantarolando músicas e trocando mensagens com as amigas e o próprio Hakkai, que ficou atualizando a morena dos preparativos para o jogo que teriam a noite, o segundo da temporada escolar.

Porém, a atenção da mais nova realmente estava no irmão, que continuou praticamente imóvel a viagem inteira, os olhos fixos na estrada e uma tensão muscular tão nítida que ela começou a se preocupar mais do que já estava, mas ela não achou mais coragem para perguntar se ele queria conversar, muito menos desabar de alguma maneira.

Maddy sempre soube que o irmão tinha limites e a única vez que o viu perder a razão foi no dia anterior à denúncia contra Jacob.

Todos esses pensamentos da garota foram sufocados em instantes com a visão do terreno do presídio, uma construção de concreto no meio do deserto. Uma infinidade de areia e arbustos secos circundam o complexo e Maddy se viu com medo quando Kazutora entrou na fila para entrar no estacionamento.

Um guarda os abordou, já pedindo para conferir parte da documentação, logo os liberando para entrar, indicando o local em que deveriam estacionar. Enquanto isso, os olhos verdes de Madeleine vagavam pelo lugar, observando atentamente os guardas, as armas que seguravam e as próprias pessoas que estavam ali pelo mesmo motivos que eles, ela até se pegou imaginando quais poderiam ser os crimes cometidos pelos conhecidos/familiares dos outros visitantes, mas logo balançou a cabeça em negação, colocando esses pensamentos em segundo plano.

Quando estacionou de vez o carro, Kazutora sentiu como se pudesse vomitar, colocar pra fora tudo o que tinha comido durante o dia inteiro. Ficou bons segundos com as mãos ainda no volante, encarando fixamente o símbolo da BMW que decorava a peça, parecia que os próprios ouvidos zuniam, mas ele se forçou a se recompor, tirando a chave da ignição e saindo do carro, carregando a pasta com os documentos.

Maddy já sentiu uma vontade de chorar, sabia que o irmão só estava ali porque ela teria que estar e não suportaria o fato de saber que estava o "forçando" a ver quem o quebrou, de forma literal e metafórica. Porém, Kazutora nunca a culparia por qualquer coisa que ela poderia estar pensando de ruim em relação a si mesma e o que eles teriam que fazer.

O moreno abriu a porta pra ela e estendeu a mão para ajudar a sair do carro, uma ajuda que a mais nova prontamente aceitou e ela só esperou o irmão trancar o carro para ficar grudada nele. O coração de Kazutora se apertou ao passar o braço direito pelos ombros de Maddy, sentindo o braço esquerdo dela o abraçar pela cintura, ele sabia que ela estava com medo, afinal, ele também estava.

Os dois seguiram o pequeno grupo de visitantes que também estava ali, observando o céu começar a se colorir pelos mais diversos tons de vermelho e laranja por causa do pôr do sol, um céu tão bonito que chegou a ser uma espécie de conforto para ambos, que olharam uma última vez para aquela pintura antes de entrarem de vez no prédio de visitação do presídio.

— Kazu, eu quero ir embora — Maddy sussurrou, sentindo um arrepio subir por todo o seu corpo.

— Eu sei... — Kazutora achava que o próprio coração iria se partir ali — Mas a gente não pode.

A atmosfera do ambiente chega a ser tão desconfortável e tensa que parecia que uma nuvem de tempestade estava ali, sugando qualquer vibração positiva. É claro que os agentes penitenciários tentavam deixar o processo o mais humano possível, mesmo com todas as regras e protocolos de segurança que tinham de seguir. Falavam tranquilamente, eram simpáticos com todos, principalmente com as crianças, e tentavam manter alguma espécie de conforto e confiança no próprio trabalho.

Porém, nem tudo poderia sair como desejam.

Kazutora tentou ignorar o olhar que a agente penitenciária que os atendeu lhe deu ao ler seus respectivos nomes e conferir os dados de ambos, principalmente ao ainda o sentir quando se afastou para a revista física, sabia que ela encarava as suas costas. O fato de Jacob ter sido, e ainda ser, uma figura pública na comunidade californiana não facilitou as coisas para a família Hanemiya depois da prisão dele, além do fato de que um caso considerado "escandaloso" não é facilmente esquecido.

Tudo parecia tão difícil que por um instante Kazutora pensou que não respirava, principalmente quando um outro agente penitenciário se aproximou dele e de Maddy, que aguardavam na sala de espera, em completo silêncio. Os dois já não estavam com seus respectivos pertences, guardados em um guarda-volumes disponibilizado pela própria prisão, assim, Kazutora não veria as suas mensagens chegando.

Não veria o seu pedido de desculpas.

— Visitantes de Jacob Hanemiya? — a pergunta do agente ecoou por todos os ossos de Kazutora quando ele se levantou, abraçando Maddy de lado no meio do processo. — Me acompanhem, por favor.

Os dois irmãos só escutavam os próprios passos no corredor cinzento que levava até a devida sala de visitação, sentindo como se estivessem entrando em um pesadelo corpóreo, o que não chegava a ser uma mentira.

Não foi Maddy que travou no meio da sala ao ter a visão de Jacob depois de longos cincos anos.

Não foi ela que simplesmente encarou o pai por uma eternidade de segundos, não conseguindo desviar o olhar.

Kazutora foi quem parou, as pernas pesando como chumbo, sentia como se tivessem fundido os próprios pés no concreto do chão, ele não conseguia se mover.

Não conseguia se mover enquanto encarava aquele que tinha destruído a sua infância e adolescência, acabado com todas as possibilidades dele ter sido uma criança normal, de não se odiar quando se olha no espelho.

— Kazutora? — Maddy sussurrou, mas pareceu que ela tinha gritado dentro da cabeça dele, o que o fez piscar os olhos e finalmente conseguir desviar o olhar.

Não tinha percebido que a irmã tinha se desgrudado dele e que, agora, estava a poucos passos da mesa em que Jacob estava sentado, não tinha percebido que tinha paralizado por causa da mais pura sensação de medo.

Tentou respirar fundo quando andava a pequena distância que o separava do homem, tentando não focar no sorriso que estava no rosto dele, o sorriso que tinha aprendido a temer enquanto crescia.

Kazutora se sentou em uma das cadeiras metálicas e Maddy logo fez a mesma coisa, colocando as mãos sobre as coxas, diferentemente do irmão, que cruzou os braços na altura do peito, entrando automaticamente em uma posição defensiva, levantando todas as muralhas que foi obrigado a construir para se proteger, guardar alguma parte genuína de si mesmo.

Porém, mesmo depois de tantos anos, Jacob ainda conhecia muito bem o próprio filho.

— Acho que não vou precisar pedir para o meu advogado trazer um espelho na próxima visita.

E foi assim, com uma única frase, que todas, todas, as muralhas de Kazutora começaram a rachar.

— Cala a boca, Jacob — a voz de Kazutora saiu ríspida e o mais velho sorriu um pouco mais, se ajeitando na cadeira como se fosse um rei.

— É assim que você trata o seu pai? Essa é a educação que a Mary deu pra você?

— Você não tem o direito de falar da nossa mãe — Maddy rebateu, tendo, agora, os olhos dourados de Jacob voltados para si, o que a fez estremecer.

Ela odeia o fato daqueles olhos serem os mesmos dos de Kazutora.

— Vejo que você virou uma cópia lambida do seu irmão — desdém recheava a voz de Jacob, que já tinha voltado a olhar para o filho, se divertindo com a visão que tinha.

— Você fala como se isso fosse ruim — Maddy conseguiu rebater, mas isso só fez com que o mais velho soltasse uma risada ácida, uma risada que ecoou por cada célula de Kazutora.

— E não é? — inclinou o corpo um pouco para trás, como se agora analisasse os detalhes do crescimento do filho — Sei que o seu irmão tem a mesma opinião do que eu. Estou certo, Kazutora?

Ele queria conseguir dizer "não", queria achar força suficiente para abrir a boca e rebater, mas ali estava a parte mais vulnerável de Kazutora, a que ele guarda dentro de todas as muralhas e de um cofre, lacrado com sete chaves.

Kazutora se odeia por concordar com todas as coisas que Jacob pensava sobre ele.

Todas, sem exceção.

Kazutora se odeia por ter os mesmos olhos.

Kazutora se odeia por ter a mesma cor de cabelo.

Kazutora se odeia por ter a mesma altura e porte físico.

Kazutora se odeia por ser a cópia do pai.

Kazutora se odeia por ser quem é.

Por isso, anos atrás, quando você descobriu tudo, ele disse que não te merecia, que não merecia alguém como você se importando com alguém como ele.

Alguém que é tão igual a um criminoso ao ponto de poder se passar, quase que fielmente, como a versão mais jovem dele.

Kazutora é a cara de Jacob Hanemiya no auge dos seus vinte anos.

E a pior parte disso tudo é que Jacob sempre soube disso, sempre soube da repulsa que o filho tinha em relação a si mesmo por causa dele e isso sempre foi um ponto muito importante na hora que tinha que "discipliná-lo", o ensinar a ser um homem de verdade.

Afinal, estava ensinando Kazutora a ser que nem ele e Jacob sabia como isso queimava no filho como gasolina.

O furo na orelha esquerda não tinha sido só porque Mikey tinha dado o brinco de presente.

As tatuagens não surgiram só porque ele achou os desenhos legais.

As mechas loiras no cabelo nunca foram somente por estética.

Passar horas na academia nunca foi somente pelo time de futebol.

Poucas coisas que Kazutora fez em relação a si mesmo foram por realmente gostar delas, a maioria foi para que parasse de ser tão igual a Jacob.

Parar de ser igual ao agressor da mãe.

Parar de ser igual ao próprio agressor.

Para Kazutora, nunca foi fácil se olhar no espelho e encontrar os olhos da pessoa que machucava e destruía quem ele mais ama.

Olhar no espelho e encontrar o mesmo dourado que o encarou enquanto um soco era desferido, o mesmo dourado que gritava com Maddy ao ponto de fazer chorar de soluçar do mais puro medo.

Nunca foi fácil aceitar que quando crescesse, se tornaria Jacob.

Entre todos vocês, o único que sabe disso é Mikey, por isso ele disse no café da manhã que sabia o que estava se passando pela cabeça de Kazutora quando o moreno falou que não queria que Jacob fosse seu pai.

Porque se Jacob não fosse o pai dele, eles não seriam iguais.

A mesma face de uma mesma moeda.

— Você sempre tinha uma resposta na ponta da língua quando mais novo, até me surpreendia com a sua criatividade. Para onde será que tudo aquilo foi? — Jacob tinha voltado a falar, o que fez Kazutora sentir a vontade de desaparecer.

Cada palavra entrava nele como navalhas, cortando e arrancando pedaço por pedaço.

Destruindo o que foram esses cinco anos separados.

Cinco anos que, se comparados aos outros dezessete, não são nada.

— Não vai me responder, Kazutora? — a provocação estava nítida, estampada no rosto e na voz do mais velho.

Para o próprio Kazutora, ouvir o seu nome ser dito de tal forma se comparava ao mais mortal veneno, corroendo e queimando cada mínima parte dele, dentro das rachaduras, agora expostas.

— Para com isso — Maddy se viu falando mais uma vez e por um segundo, pareceu que os olhos do pai tinham brilhado ainda mais.

— São só perguntas, Madeleine. O seu irmão não se importaria com algo tão bobo como perguntas, não é, filho?

A realização apareceu para Kazutora no momento em que ele tinha entrado na sala, encontrado os olhos do pai no meio de todos aqueles presos, e perceber que aquela visita de Maddy não era necessariamente para ela e sim para ele.

A visita está sendo a vingança de Jacob contra o próprio filho.

E estava funcionando, os dois sabiam muito bem que estava.

— O que você quer com tudo isso? — Kazutora conseguiu perguntar, mas se odiou ainda mais pela sua voz ter saído mais baixa do que queria.

— Com o que? — perguntou, cínico — Só estou recebendo uma visita dos meus filhos.

— Mentiroso.

— Está acusando o seu pai de tal forma? — fingiu ter se ofendido — Parece que você realmente ganhou experiência com isso...

— Pare.

— Com o que? — fez a mesma pergunta, de novo, e faria quantas vezes forem necessárias até que conseguisse o seu objetivo.

Kazutora sentia o estômago queimar, tentava manter o contato visual com o pai, mas sentia uma tremenda vontade de vomitar por se encontrar naqueles olhos dourados.

— Só pare. Eu não sou mais aquela criança.

— Não? — mais uma risada ácida — Porque eu só consigo ver aquela mesma criança que sempre foge das respostas que não quer ouvir.

— Eu não sou mais aquela criança — precisou reafirmar a frase, ouvir a própria voz falando tal coisa, para ver se também conseguia acreditar nisso.

— Não acho isso.

— Você não tem que achar porra nenhuma sobre a minha vida. Você não tem o direito de falar nada em relação a mim — a raiva já começava a transbordar no tom de voz de Kazutora.

— Não tenho direito? — um sorriso — Pelo o que eu sei, o meu nome ainda está na sua certidão de nascimento, Kazutora. E não só isso, nós somos praticamente iguais, e mesmo assim você vai me dizer que não tenho direito de falar nada em relação a você mesmo? Um pouco patético, filho.

— Você parou de ter qualquer direito sobre mim quando bateu na minha mãe pela primeira vez.

— Então antes mesmo de você nascer?

— O que? — a surpresa não tinha sido só de Kazutora, Maddy encarava o pai com os olhos arregalados.

— Mary não contou para vocês? Pensei que ela confiasse nos filhos... Principalmente em você, Kazutora, o maior protetor dela.

— Explique. Agora.

— Tão autoritário... — a manipulação estava ali, nas entrelinhas na escolha de cada mínima palavra — Mas sabe, mesmo com a clara falta de educação, vou te responder.

— Chega disso, Jacob. Chega.

— Logo quando estava pra contar a história? — ele pareceu, mais uma vez ofendido, mas ainda sorria.

— Não quero mais saber.

— Está se contradizendo, Kazutora. Me diga, conte para o seu pai, o que você quer saber?

— Nada, não quero nada vindo de você.

— Nada? — uma risadinha — Que estranho te ver assim, tão... Qual palavra eu posso usar para descrever?

Jacob estava ali, se divertindo às custas do próprio filho, às custas do trauma que ele mesmo causou e nutriu por anos.

— Já sei! Covarde. É estranho te ver tão covarde, Kazutora. Você era tão corajoso, tão firme nas respostas, o que aconteceu? Ou esse é só quem você é de verdade? Onde tudo isso estava escondido?

Perguntas e mais perguntas com respostas que, agora, estavam estampadas no próprio rosto de Kazutora.

— Você sabe porra nenhuma sobre mim.

— Claro que sei e isso te enfurece. Não se negue, você sabe como isso só piora.

— Não.

— É uma pena te ver assim, Kazutora. Por alguma razão, estou sentindo saudade da sua antiga versão.

— Não sinto e nunca vou sentir sua falta.

— Isso não é algo que se diz para o próprio pai, Kazutora.

— Você nunca foi o meu pai.

— Não? — uma risada um pouco mais alta — Os seus olhos dizem o contrário, filho.

— Pra mim já deu. Nós vamos embora, Maddy.

— Fugindo com o rabo entre as pernas? — a voz de Jacob ecoou no momento que Kazutora tinha se levantado.

— Estou cansado das suas merdas.

— Minhas merdas? Só estou falando verdades, não sabia que isso era um problema. Ou esse é mais um crime que eu cometi contra você?

— Filho da puta — ódio queimava por Kazutora e o sorriso no rosto de Jacob só piorou tudo.

— Eu ainda me lembro da primeira vez que você me xingou assim — a fala mansa disfarçava a verdadeira intenção de cada palavra — Foi no dia anterior que a polícia apareceu na nossa casa. Você se lembra daquele dia?

Kazutora sabia que a resposta seria "não", as memórias daquela briga nunca ficaram claras e até hoje ele tem dúvidas do que realmente aconteceu, mas algo no brilho dourado dos olhos de Jacob dizia que o homem sabia perfeitamente de cada detalhe daquele dia.

E o silêncio do filho foi o convite para que ele continuasse a falar.

— Você ficou tão irritado que chegou a me bater, fiquei com um olho roxo por dias por causa daquele soco.

— Você mereceu.

— Mereci? — inclinou a cabeça suavemente a cabeça para o lado, olhando para o filho de baixo para cima.

— Mereceu, como merece apodrecer nessa merda de lugar.

— Desejando a morte de alguém, Kazutora?

— A sua? — agora quem soltou uma risada ácida foi o próprio Kazutora, que tinha as mãos fechadas em punho ao lado do corpo — Todo santo dia.

— Interessante, muito interessante...

— O que? — a pergunta veio automática e Jacob sorriu por causa disso.

— Logo você desejar algo assim... Afinal, o dia que você explodiu comigo também foi o dia que eu falei que poderia matar a sua mãe.

Tudo foi um borrão.

Uma confusão de sentimentos, gestos e gritos.

Mas quando a mente de Kazutora entrou em foco, ele erguia o pai pelo colarinho do uniforme da penitenciária, com dois agentes o segurando e ordenando que ele soltasse Jacob.

Pai e filho se encaravam olho no olho, mas de maneiras completamente diferentes.

Kazutora estava ofegante, com os olhos arregalados.

Jacob sorria, mesmo que o seu corpo estivesse inclinado pra frente, e as mãos, ainda presas por algemas, estivessem em uma posição desconfortável, mas ele tinha concluído a sua vingança.

Tinha atingido o objetivo que queria.

— Eu realmente não vou precisar de um espelho.

Se as muralhas de Kazutora tinham rachado no início da visita, agora, tinham sido derrubadas, completamente destruídas.

Soltou o pai com aversão e o barulho do corpo do pai caindo na cadeira foi o único escutado na sala, além das vozes dos agentes penitenciários, que mais pareciam sussurros na mente de Kazutora, que estava em completa confusão, choque e horror.

As memórias daquele dia voltaram como um tsunami.

Jacob estava bêbado demais, mais estressado e agressivo do que o normal, e quando levantou a mão para atingir Mary, gritou que poderia muito bem matá-la e que nada aconteceria com ele por causa disso.

O limite de Kazutora tinha sido infringido naquele dia.

Ele não percebeu como Maddy se colocou na frente dele, o tirando das mãos dos agentes, e argumentou em nome dele, conseguindo que ambos saíssem dali sem muitos problemas, além da constatação que o nome de Kazutora seria retirado da lista de pessoas habilitadas para visitação, o que até mesmo chega a ser um alívio.

Não perceberia a própria irmã pegando as coisas deles no guarda-volumes.

Mal notaria quando chegassem no carro, só percebendo onde plenamente estava ao encarar o veículo branco, enquanto se lembrava, mais uma vez, de como respirar.

— Kazutora, eu... — Maddy tentou falar alguma coisa, mas o moreno simplesmente ergueu a mão na direção da irmã, pedindo para que ela não falasse nada.

— A chave do carro.

— Eu posso ligar pra mamãe e pro Thony e pedir para que eles possam buscar a gente...

— A porra da chave do carro, Madeleine.

A garota quase pulou de susto ao ouvir esse tom de voz sendo usado pelo irmão, mas ela não imaginou, também, que veria uma expressão tão fechada no rosto dele, uma expressão da qual sentiu medo, de forma que entregasse a chave do carro e mal conseguisse o encarar nos olhos. Não ousou demorar para entrar no carro, logo colocando o cinto e se ajeitando no banco, não querendo encarar o irmão, não querendo associar Jacob a ele.

A viagem de volta pareceu mais rápida do que a volta, Maddy não conseguiria dizer se foi por causa da ansiedade para a visita ou pela velocidade que estampava o velocímetro do carro. Ela também não tinha mais certeza do que fazer, principalmente com o irmão de um jeito que só tinha visto uma única vez, no dia que ele tinha revidado Jacob, no dia que ele se colocou, mais uma vez, na posição de lutar pela vida dela e da mãe deles.

Mas a que custo tudo isso?

A própria vida dele?

Maddy percebia as mãos do irmão tremendo um pouco enquanto segurava o volante e ela sentia medo disso, não necessariamente da direção dele, mas o que esse tremor significava.

Por muito tempo, ela se sentiu culpada por ter deixado Kazutora ser, também, o escudo dela, mas o que ela poderia ter feito naquela época? Ela era somente uma criança, alguém que ainda tinha ingenuidade e pureza suficiente para desfrutar de coisas pequenas, o ar de fantasia que só a infância consegue trazer de certa maneira, sendo algo que Kazutora decidiu que tentaria proteger até o fim.

Porém, novamente uma pergunta aparece na mente de Maddy: a que custo?

Ela não sabe, até hoje, qual foi o custo disso tudo para o irmão, alguém que se manteve firme como uma rocha que luta contra a mais forte das correntezas, não demonstrando que nada o incomodava, que tudo estava bem e que ele estava feliz, vivendo a vida universitária e jogando futebol. Entretanto, essa imagem se desintegrou para ela quando o viu parado no meio da sala de visitas, com medo estampado no rosto, com um choque que ela nunca tinha o visto sentir.

Ele sempre foi muito bom em esconder o que sente, desde dor a até os próprios sentimentos, mas ali, naquela sala, principalmente depois de tudo que escutou, não tinha como esconder, não com a sua vida praticamente se passando pela cabeça dele, desde o início, entrando em uma espécie de looping com as cenas de Jacob na vida dele.

Gritos, xingamentos, toques e agressões.

Tudo estava na cabeça de Kazutora como uma tempestade, um furacão de memórias e ele estava sozinho no meio disso tudo, sem força nenhuma para forçar que tudo aquilo parasse, que todos esses momentos pudessem voltar para dentro das muralhas, mas aí que está o problema.

Jacob tinha destruído muralhas com um conjunto de palavras.

Uma queimação subia pela garganta de Kazutora, uma queimação estranha e de uma sensação que ele não se permitia há anos, uma sensação que ele simplesmente negava e engolia para dentro de si.

Ele tentou respirar fundo, piscou os olhos com mais força e manteve o foco na estrada.

Não, ele não iria chorar.

Ele se recusava a chorar por causa do pai.

Maddy, por outro lado, deixou que as lágrimas silenciosas escorressem pelas bochechas, principalmente ao ver que já estavam chegando de novo em Los Angeles, daqui a pouco estariam em casa, daqui a pouco estariam seguros e de alguma forma tudo teria que se ajeitar.

A família dela merecia paz, mesmo que o destino não quisesse e isso a irritava profundamente.

O céu já estava escuro e as estrelas o pintavam quando ambos chegaram em casa e Maddy quase suspirou de alívio ao sentir o carro parando na entrada da garagem, Kazutora colocaria depois o carro pra dentro, ele não tinha cabeça para se importar com algo assim, ele não tinha cabeça para lidar com mais nada, mas, de novo, parecia que o destino não queria que ele tivesse paz.

Desde o momento em que acordou, Kazutora sabia que o universo estava o testando e quando ele te viu sentada nos degraus que levavam até a varanda da entrada da casa dele, algo gritou dentro de si e foi automático desviar o olhar, não aguentando te ver levantando, com a intenção de ir até ele.

O moreno simplesmente passou reto, começando a descer a rua sem dizer uma única palavra.

— Você realmente ainda vai querer falar com ele? — a voz de Maddy ecoou e você virou a cabeça na direção dela.

— Maddy, eu...

— Já sei que, na teoria, era pra você ter ido com a gente, o Kazutora me falou.

O tom de voz da adolescente denunciou como a visita tinha dado errado e você não seria cega ao ponto de não perceber os resquícios das lágrimas que marcavam o rosto dela.

— Olha, [Nome], eu estou cansada, de verdade — a morena voltou a falar, andando na sua direção — Já foi uma merda na visita com o meu pai sendo um desgraçado e sinceramente, o meu irmão não merece ouvir agora quaisquer que sejam as suas justificativas ou explicações, mesmo que eu já tenha alguma ideia do que tenha sido.

Algo que você sempre soube, desde quando era bem nova, é o fato de que Kazutora também é o mundo de Maddy, a família sempre foi e será tudo o que ela mais valoriza. Então, não se surpreendeu com o tom agressivo e muito menos a culparia por estar sendo "grossa", mas você não suportaria ela pensar que você não tinha ido por opção.

— Maddy, eu realmente queria vir, eu tinha me organizado, só que...

— O seu namorado precisava de você?

— O que?

— A sua camiseta diz tudo, [Nome].

Você conteve a vontade de suspirar, sabia que a mais nova pegaria somente a ponta do iceberg da confusão que tinha sido a sua tarde, mas o problema é que Maddy não queria ouvir ou entender, subindo os degraus que levavam até a varanda para poder entrar em casa.

— É mais complicado do que você imagina.

— Mais complicado? — ela perguntou, te olhando por cima do ombro e enquanto destrancava a porta — Mais complicado do que o que aconteceu com o meu irmão? Mais complicado do que o apoio que ele precisou e ainda precisa de você?

Essas são perguntas que você não tinha a resposta e isso foi a gota d'água para a mais nova, que encarou o seu silêncio como um ultimato e entrou em casa, batendo a porta com certa força.

Você respirou fundo, apoiando as mãos na cintura enquanto tentava assimilar tudo o que tinha acontecido, desde o fiasco do primeiro jogo da temporada de Blake até o momento atual, em que sentia que tinha fodido com tudo e mais um pouco. Porém, não deixaria que tudo fosse em vão, ainda tentaria pelo menos ajeitar alguma coisa, tinha que tentar.

Pegou a sua bolsa, que estava em um dos degraus da varanda e a arrumou no ombro, com certo desconforto, e praticamente começou a correr na direção do final da rua, onde a figura de Kazutora logo apareceu no seu campo de visão. Diminuiu o ritmo aos poucos, iniciando uma caminhada quase silenciosa quando pisou dentro do terreno do parquinho, o local no qual muitas das melhores memórias da sua infância foram feitas.

Ele tinha mudado ao longos dos anos, com reformas e algumas trocas nos brinquedos, mas a essência sempre continuou a mesma, os balanços, os escorregas e as gangorras, espalhados em uma área arborizada e com alguns bancos de madeira, que ficavam perto das calçadas que circundam o local. Uma brisa fresca causava um farfalhar nas folhas, que preenchia o ambiente, que estava praticamente vazio.

Você se aproximou do seu melhor amigo aos poucos, já que ele estava de costas, com o olhar focado no par de balanços que ficava bem no centro do parquinho, o brinquedo favorito de vocês dois.

— Kazutora — o chamou, mas o moreno não se virou ou se mexeu.

Algo apertou no seu coração, porque sabia que ele te escutou.

— Kazutora, eu sinto muito. Por favor, me...

— Não — a voz dele ecoou tão grave que te arrepiou — Não ouse fazer isso comigo de novo.

O "de novo" foi algo que você não conseguiu engolir e as suas pernas se moveram, terminando a distância que ainda tinha entre vocês. Ergueu uma das mãos, na intenção de tocar no braço de Kazutora, mas ele desviou do seu toque.

— Kazutora, por favor...

— O que você quer?

— Eu só quero conversar.

— Mas eu não.

— Kazu...

— Você veio conversar para se desculpar, não é? — o tom de voz ácido estava ali, o indício de como ele estava testando, mais uma vez, os próprios limites — Você fez isso, não precisa fazer de novo.

Ele indicou o celular com um gesto e a realização de que ele tinha lido as suas mensagens enquanto ia quase que desesperada para casa dele bateu no fundo do seu peito e você nunca se arrependeu tanto de algo na vida.

O arrependimento bateu ainda mais quando ele se virou na sua direção e você viu como os olhos dele estavam marejados, cheios de lágrimas que ele se recusava a libertar.

— Eu só quero me explicar — a sua voz saiu baixa e por alguma razão isso soou engraçado para Kazutora, que riu sarcástico, enquanto te encarava nos olhos.

E aqueles olhos não eram os do seu melhor amigo.

— E isso vai fazer a porra de alguma diferença, [Nome]?

A forma como o seu nome saiu da boca dele doeu mais do que qualquer coisa, parecia o mais puro veneno.

— Vai, você sabe que vai.

— Sei? Eu tenho cara de que sei alguma coisa?

— Kazutora, por favor...

— Não, chega disso, [Nome].

— Eu só quero me explicar, menos de cinco minutos e pronto, eu vou embora.

— Você realmente acha que a porra de uma questão de tempo?

Algo dentro de Kazutora ainda tentava se segurar, se manter firme no meio do furacão que girava e ganhava força a cada segundo, destruindo e acabando com tudo que via pela frente, acabando com os últimos cincos anos como se fosse um passe de mágica, um simples estalar de dedos, ou até mesmo poucas palavras.

— É claro que eu não acho que é uma questão de tempo, Kazutora!

— Então é uma questão de que, [Nome]?!

— Você realmente acha que eu queria não ter ido com você?! Realmente acha que eu faria isso com você?!

— Eu não sei, [Nome]! Porra, eu não sei de nada!

Vocês não perceberam que já gritavam um com o outro, com as vozes se elevando a cada segundo, junto com a tensão, que, agora, parecia agarrar cada centímetro da pele, colocando em prova tudo o que estava ali, tudo que vocês são. E doeu, doeu muito, ter um "eu não sei" como resposta.

Kazutora sentia como se algo o rachasse, que um vácuo o sugava de dentro pra fora, e que não tinha nada o segurando, nem você mais o segurava e isso foi o estopim para tudo, para tudo o que ele sente fosse exposto, que os quase vinte e três anos de vida fossem colocadas à mostra.

— Você me disse que estaria do meu lado em tudo! Você me prometeu que estaria do meu lado em todos os momentos da minha vida! Porra, você prometeu pra mim!

— E eu sei disso, Kazutora! Eu sei! Por isso que eu sinto muito, por isso que eu quero me explicar e até me desculpar!

— Mas não faz diferença, [Nome]! Não faz a mínima diferença e você sabe por que?! Por que eu quero saber onde você estava quando o meu pai simplesmente jogou na porra da minha cara que ele já batia na minha mãe antes mesmo de eu nascer?! Onde você estava quando ele me falou que eu sou igual ele?! Onde você estava quando eu não consegui responder?! Aliás, você sabe por que eu não respondi?! Porque eu sei que ele não estava mentindo! Porque eu acredito em cada mínima palavra que sai da boca dele desde que eu me entendo por gente!

Algo quebrou em você ao ver Kazutora gritando de tal maneira, com a expressão de mais puro ressentimento e as lágrimas escorrendo pelas bochechas dele.

Algo quebrou em você ao escutar cada uma das palavras que saiu da boca dele e saber que você não estava com ele quando as ouviu.

Algo quebrou em você quando percebeu que todas aquelas lágrimas são todas as que ele engoliu durante anos, por mais de uma década.

Algo quebrou em você quando ele tentou reprimir um soluço, mordendo o lábio inferior com uma força que por pouco não sangrou.

Porém, uma das piores partes de tudo isso, o que fez a primeira lágrima cair pela sua bochecha foi quando você deu um passo na direção de Kazutora, mas ele recuou dois, balançando a cabeça em negação e com os olhos brilhando, mas não daquele brilho característico, o brilho que te prendia por horas a fio, mas o brilho de tristeza e raiva, o brilho do turbilhão de lágrimas.

— Eu nunca cobrei nada de ninguém. Nunca me senti no direito de fazer algo do tipo, mas eu estive com você em todos os seus piores momentos, sem exceção. Eu estive lá por você e não me arrependo disso, mas o que machuca mais nessa merda toda é você ter dito que iria, ter prometido que iria, não aparecer e ainda achar que pode me pedir "desculpas" por isso.

Ele não gritava mais com você, falava com uma voz trêmula, uma que você nunca mais esqueceria.

— Você bem sabe como é a única que não pode nem pensar na possibilidade de pedir "desculpas" pra mim em relação a qualquer coisa. Ou realmente não tem noção do tanto que você significa pra mim?

Kazutora tinha na ponta da língua uma frase que ele gostaria de falar para você há muito tempo, se brincar, a única coisa sobre ele que você não sabe.

"Realmente não sabe que eu amo você?"

Mas essa frase foi arrancada e sugada pelo furacão que continuava crescendo dentro dele, que continuava sugando e acabando com todos os limites, a mente dele se auto destruindo aos poucos.

O choro deixava tudo pior, um peso no peito que parecia que iria o afundar no chão, e uma sensação que algo o sufocava aos poucos, como se ele fosse se afogar nas próprias lágrimas.

— E é por significar tanto, que não faz a mínima diferença você se explicar, [Nome].

Você sabe que já passou por muita coisa na vida, o vício do seu pai, a sua mãe literalmente sumindo da sua vida, uma auto-cobrança absurda quando se trata dos próprios estudos e uma necessidade de ter tudo quase que programado e ao seu alcance.

Mas nada disso tinha te preparado para observar Kazutora passar por você e se afastar.

Nada tinha te preparado para ouvir o "não" que receberia quando ameaçou o seguir.

Nada te preparou para isso, porque você nunca pensou que isso fosse acontecer.

Porque Kazutora sempre foi uma certeza tão grande na sua vida que nada te preparou para a possibilidade de um dia brigarem e você ter que observar, sem poder fazer nada, a criação de uma rachadura na parceria que criaram ao longo de quase vinte anos.

Nada do que você passou doeu tanto.

Nada.

Nem as brigas com o seu pai ou as com a sua mãe.

E muito menos as com Blake, como a que você tinha tido na parte da tarde, uma parte pequena na sua mente te lembrou do fato de que teria um leve roxo nas suas costas no dia seguinte, por causa da força que o seu namorado tinha aplicado na hora de te colocar contra a parede, enquanto gritavam um com o outro na parte de trás de um dos ginásio da universidade.

Você gostaria de que Kazutora tivesse continuado gritando com você, tivesse te jogado contra a parede e praticamente descarregasse todos os problemas da vida dele sobre você, porque de alguma maneira, você tinha se habituado a isso, até mesmo estava começando a achar normal, afinal, esse ciclo tinha virado a sua rotina.

Porém, Kazutora não foi, não é e nunca vai ser alguém assim.

E naqueles instantes, quando o viu se afastar, com a voz trêmula dele ainda preenchendo os seus ouvidos, você desejou ainda mais que ele tivesse continuado gritando, porque você sabe que nunca superaria isso.

Nunca superaria o fato de que não estava com o seu melhor amigo quando ele mais precisou de você.

Nunca superaria o fato de que foi a pessoa que o fez desistir de se segurar.

Nunca superaria o fato de ser a pessoa capaz de acabar com o autocontrole dele e o fazer chorar.






Oi de novo...

Vou até fugir com medo de vocês me baterem depois desse cap KKKKKKK

Brincadeiras a parte, gostaria de falar um pouco mais sobre o que eu quis trazer no capítulo de hoje!

Antes de qualquer coisa, gostaria de evidenciar o fato de que não foi mostrado o que aconteceu com a [Nome] na parte da tarde, expus somente uma parte agora no final, mas posso garantir para vocês que não foi um dia difícil só para o Kazu

Se você me acompanha no Instagram, deve saber que eu já comentei que a partir de agora é só "ladeira abaixo" na fic e isso é uma completa verdade. A questão estão no fato de que os personagens, de uma forma geral, são pessoas que guardam os seus problemas, tentando lidar com eles sozinhos, e isso é algo ruim, porque ninguém é de ferro e muito menos consegue aguentar tudo sozinho o tempo todo, de forma que as consequências disso vão chegar em algum momento

As do Mikey chegaram quando ele tinha 18 e começou a se tornar um viciado, as da Senju foram no último ano de ensino médio quando ela quase se tornou anoréxica, as do Kazu foram no capítulo de hoje e as da [Nome] ainda vão chegar, não vou me estender muito no tópico se não vira spoiler. Mas o ponto que eu quero trazer aqui é que tudo que está "por debaixo" deles está sendo colocado na superfície e eu quero mostrar tudo para vocês!

Acho que está bem claro como todos os personagens daqui de Watch You Burn são complexos e eu não consigo simplesmente não abordar as problemáticas de cada um! Sei que muitos podem até estar achando que está "demorando" para os personagens ficarem juntos, mas quero trazer um contexto para vocês:

– Estamos, literalmente, na metade da fic;

– Na linha temporal da história, se passou exatamente um mês e uma semana!

Essa história tem muitos detalhes e eu sou apaixonada por cada um deles, tendo como exemplo o fato de que o ponto de vista da [Nome] sobre tudo que aconteceu no capítulo de hoje ainda vai ser mostrado, mais especificamente no cap 21, que inclusive já está em produção! (torçam para eu conseguir postar na próxima semana pelo amor KKKKKK, a vida tá corrida demais gente, sério)

Mas enfim, esse é o "recado" que eu queria dar e por favor, me contem o que estão achando da história! Até agora, qual foi a sua cena favorita? E a que você menos gostou? Quero MUITO saber!!

Bem, mesmo com a situação catastrófica que aconteceu, espero que tenham gostado do capítulo! Não se esqueçam de votar (essa estrelinha é MUITO importante) de comentar (AMO receber o feedback de vocês)!

Até a próxima! ♥︎

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