Endossimbiose | Versão Em Por...

By ElisMariangela

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Donecea Gaxy, uma iátrica determinada, se junta ao ardiloso e charmoso Arkadi Phaga para alcançar o núcleo da... More

Capítulo 2. História da Doença Atual
Capítulo 3. Parasitas
Capítulo 4. Emergência
Capítulo 5. Alta
Capítulo 6. Difusão
Capítulo 7. Proteassoma
Capítulo 8. Recaptação
Capítulo 9. Mitocôndria
Capítulo 10. Toxicologia
Capítulo 11. Anemia
Capítulo 12. Sepse
Capítulo 13. Hemorragia
Capítulo 14. Nó de Sutura
Capítulo 15. Instinto
Capítulo 16. Descamação
Capítulo 17. Hereditariedade
Capítulo 18. Convergência Evolutiva
Capítulo 19. Cicatrizes
Capítulo 20. Endorfina
Capítulo 21. Linfonodo Sentinela
Capítulo 22. Evolução
Capítulo 23. Cremação
Capítulo 24. Crisoterapia
Capítulo 25. Células
Capítulo 26. Comorbidade
Capítulo 27. Memórias
Capítulo 28. Dor
Capítulo 29. Luto
Capítulo 30. Subcutâneo
Capítulo 31. Olhos
Capítulo 32. Humanos
Capítulo 33. Mãos
Capítulo 34. Medo
Capítulo 35. Ansiedade
Capítulo 36. Pressentimento
Capítulo 37. Tremor
Capítulo 38. Inconsciência
Capítulo 39. Consciência
Capítulo 40. Necrose
Capítulo 41. Cicatrização
Capítulo 42. Sede
Capítulo 43. Ruminação
Capítulo 44. Solidão
Capítulo 45. Fúria
Capítulo 46. Digestão
Capítulo 47. Enterro
Capítulo 48. Fadiga
Capítulo 49. Coração
Capítulo 50. R.E.M.
Capítulo 51. Ouvidos
Capítulo 52. Cura
Capítulo 53. Latência
Capítulo 54. Febre
Capítulo 55. Necrotério
Capítulo 56. Apoptose
Capítulo 57. Metástase

Capítulo 1. Pacientes

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By ElisMariangela

Parte 1
Hospital

Sétimo círculo do Império
Oásis

Acordei com o som dos gritos do lado de fora.

Abri os olhos para as luzes sempre acesas, sentindo nas narinas um cheiro familiar que eu não sentia em um bom tempo... Um cheiro que me foi como gota de água na língua de um viajante sedento no deserto, depois de viver um número incontável de aventuras que terminaram mal. Inspirei bem fundo. Aquele era o aroma de mineral engolfo em carne, como o de lâminas mergulhadas em...

Sangue. E um que eu conhecia muito bem, de todas as vezes em que vales se abriram na palidez da minha própria pele...

Sangue humano.

Um humano que gritava tão alto que, mesmo se afastando no corredor, eu ainda conseguia ouvi-lo. Talvez ele também tivesse passado por uma jornada que teve um fim ruim... Pelo menos um que valesse o esforço daqueles gritos.

Eu já deveria estar acostumada com esse som, uma parte tão grande do meu trabalho, mas tolerá-los era uma arte difícil... Principalmente quando alguns se impregnavam em mim tão profundamente quanto cicatrizes; e davam à minha imaginação dores que eu esperava nunca sentir.

Todo e cada noxdiem eu acordava para acolher os infortunados - ou estúpidos - e poupá-los da dor que causava aqueles gritos. No fundo, eram todos só infortunados de estar aqui (alguns inclusive com o infortúnio de serem estúpidos), mas eu não conseguia fugir de me perguntar o que levava uma criatura a se colocar em um sofrimento como aquele... O que levava um ser a viver tanta dor que nada podia restar de si senão seus gritos, ecoando por corredores vazios e implorando por alguma espécie de anestesia para dores que estavam além do corpo?

Não importava quantos anos eu estivesse trabalhando ali. Eu continuava querendo me manter longe daqueles gritos.

Mas, dessa vez, me senti compelida a segui-los.

Não porque a dor estava sendo sentida, mas por quem estava: um tipo raro de viajante infortunado naquela porção do Império Interestelar.

E um que eu estava esperando por muito, muito tempo.

• • • ֍ • • •

Clover já estava atrasada e sua carona ainda tinha decidido demorar. O pé batia no chão furiosamente, os olhos voavam pela rua caótica e nenhum sinal do carro que esperava. Ela estava começando a sentir a cabeça esquentar... Mas então o veículo surgiu na esquina. A moça entrou no carro, batendo à porta com mais força do que o normal. O motorista fingiu não perceber. Ele voltou para o fluxo frenético da rua e então, alguns metros depois, o Artefato despencou dos céus e esmagou o carro da frente, salvando a vida de Clover por 2 minutos de atraso.

Ela deu 5 estrelas.

Eu não sei, na verdade, se foi exatamente assim que aconteceu, mas essa é a forma como os filmes contaram essa história. Talvez nunca nem tenha existido uma Clover, - quando existiu um humano tão sortudo? - mas muitas pessoas, com vários outros nomes, presenciaram a chegada do Artefato na Terra.

• • • ֍ • • •

Me levantei do chão entre os produtos de limpeza e bati a cabeça em uma das prateleiras e o barulho que fiz só não foi maior do que os gritos do lado de fora. Droga. Eu tinha me escondido na sala do zelador para tirar uma soneca em segredo, afinal; e a última coisa que um segredo precisava era ser descoberto. Nem todos no Oásis tinham de ter tantas horas de sono quanto os humanos, então não entendiam o quão improdutivos nós éramos se não gastássemos algumas horas sendo improdutivos; e eu precisava me esconder se quisesse um sono que fosse metade decente. Eu ainda não o tinha dessa vez, mas saí para o corredor e segui os ecos distantes dos gritos até a porta branca de um quarto.

Entrei e me estiquei nas pontas dos pés para tentar ver a confusão além da equipe iátrica frenética, mas não consegui encontrar o rosto do paciente. Ele gritava a todos pulmões, tão selvagem e animalesco que, por um instante duvidei que realmente fosse humano. Seu corpo se debatia em uma confusão de braços e pernas, arranhando e chutando tudo que entrava no caminho... Ele não estava apenas com dor. Estava tentando fugir. Será que não entendia que queríamos ajudá-lo? Ou será que não queria nossa ajuda?

Os iátricos corriam de um lado para o outro, preparando o quarto, controlando o humano e tentando tirar sua dor. Um deles enrolou tentáculos ao redor dos membros do desconhecido e o prendeu à maca com correntes, enquanto outro cravou em sua nuca um enorme ferrão, injetando-o com sedativo. Lentamente os gritos do desconhecido se transformaram em sussurros incoerentes, sua agitação enfraqueceu e, em um piscar de olhos, ele tinha mergulhado no escuro.

- A perna dele está ferida. - Me informou o supervisor da equipe iátrica. Ele não pronunciava palavras como eu, já que seu corpo gelatinoso não tinha consistência para sustentar cordas vocais, mas emitia uma vibração específica que o tradutor implantado no meu cérebro interpretava como linguagem, algo fundamental para um profissional de um hospital interestelar. - Suture-o. Pelo menos isso esses seus dedos são capazes de fazer. - Seu corpo estremeceu ao falar de dedos.. Aparentemente tremulons tinham nojo deles. No início eu me perguntava como ele podia ser nosso supervisor... Ele não tinha membros, então não podia fazer nada; ele era arrogante, então não agradava a ninguém; e ele não era uma das espécies mais inteligentes da galáxia, então cometia erros. Mas, com o tempo, eu percebi que não era uma questão de merecimento. Ele era o supervisor porque sua espécie era uma das mais antigas no Império... Então ele era respeitado. - E use uma das piores linhas. - O tremulon se voltou para mim como se tivesse se esquecido do detalhe mais importante. - Não desperdice uma das boas nele.

E os humanos eram uma das mais recentes.

O tremulon saiu com a equipe e eu fui deixada sozinha com o humano inconsciente. Seu sangue pulava à frente aos olhos das profundidades do seu corpo como a nascente de um rio, pintando a maca com caos. Se eu não fizesse nada, ele seria drenado até a morte. Pelo visto os outros iátricos tinham se preocupado mais em deixá-lo preso do que vivo.

Enluvei minhas mãos e peguei a mais nova, tecnológica e eficiente das linhas de sutura. Ele tinha sorte de que os outros seres não achavam um humano digno de ser tratado por algo além de outro humano; e tinha sorte de que nossa espécie tinha se sustentado por milênios sobre pilares de empatia, compaixão e... Egoísmo. Eu ia remendá-lo como um boneco que uma criança era incapaz de descartar, e então eu ia receber algo em troca. Não era assim que eu costumava tratar os meus pacientes, mas, tanto para meus olhos quanto para os do hospital, antes de paciente, ele era humano.

Tudo que eu precisava era de um gole de humanidade.

E eu estava com sede há muito tempo.

Me aproximei devagar de seu rosto adormecido... Pacífico, agora que não sentia dor; tranquilo, agora que não sentia medo; sereno, agora que não tinha que se perguntar o que aconteceria a cada instante de sua vida. Ele parecia ter a minha idade, jovem demais, ao ponto de se achar mais esperto do que realmente era; e velho demais, ao ponto de não poder mais perdoar algumas de suas escolhas. Mas talvez ele ainda as perdoasse... E por isso estava ali. No mesmo lugar em que eu sofria pelas minhas.

Emoldurada por ondas de cabelos escuros e por uma mandíbula quadrada como as bordas de uma tela, sua face repousava entre o familiar e o desconhecido. Eu nunca o tinha visto, mas existia algo familiar nele... Algo que espelhava o que havia em mim. Entre tantas criaturas em que eu nem sabia onde ficava a cabeça, acabei aprendendo a apreciar a beleza naquilo que eu conhecia. E não era difícil de encontrá-la nele.

Eu não o teria visto com tanta curiosidade se estivesse em um hospital na Terra, onde ele não seria novidade, mas só mais uma causalidade. Aqui, porém, ele era a chave para os meus cadeados. Me indaguei para a fachada inerte de sua face viajante o que o tinha trazido tão longe de casa...

E como eu tinha me deixado parar tão longe também?

Quando ele abriu os olhos, a linha de sutura já estava no meio do caminho do corte. Ele piscou, processando o universo como se o visse pela primeira vez, e então se debateu contra as algemas, porque a primeira coisa que passou por sua mente foi fugir. Somos previsíveis, nós humanos... E eu senti falta disso. Encarei por um instante aqueles olhos tão verdes quanto frustrados que me encaravam e rapidamente voltei a atenção para o meu trabalho.

- Como está se sentindo? - Perguntei casualmente, conversando com seu corte. Ele abriu um sorriso cansado e, com a voz rouca de alguém que não falava por uma eternidade, sussurrou:

- Como alguém que deveria estar morto...

- Pelo visto o universo tem outros planos para você... - E provavelmente não era um muito bom, já que os iátricos fizeram questão de algemá-lo até os dedos. - Qual é o seu nome?

- Achei que iátricos já devessem saber.

Encarei seu rosto, onde uma sobrancelha levantada me desafiava. E então ele apontou com os olhos para o prontuário na mesa ao lado, o rosto tomado por um sorrisinho que me deu vontade de cravar a agulha de sutura na sua perna. Chequei as horas no cartão de identificação em bracelete no meu braço e voltei o foco para o corte, entrando e saindo das bordas da pele com o fio em uma costura contínua.

- E quando, gritando pelos corredores, você teria informado seu nome para o prontuário?

- Se soltar minhas algemas eu anoto todos os dados para você.

- Como se eles fossem deixar um humano fazer isso... Além do mais, estou ocupada demais te costurando para me preocupar com isso agora.

- Então meu nome não deve ser tão importante assim... - Ele concluiu, como se eu e meu trabalho fossemos tão impessoais quanto um bandeide. - Mas eu me pergunto... Por que "costurar" minha perna é tão mais importante se eu nem posso usá-la? - Ele apontou com os olhos para as algemas ao redor dos tornozelos.

Tinha um charme na sua expectativa de que eu iria perceber a contradição e deixá-lo ir. Mas, mesmo se eu confiasse nele, aquelas correntes não se abririam antes que eu tivesse o que queria.

- Está com pressa de ir a algum lugar?

Ele abriu um sorriso lento e os olhos vagaram por todo o quarto até pousar em mim novamente, na realização de que não havia como fugir senão por de mim. Sua voz derreteu para fora dos lábios em uma ameaça magnética:

- Eles me prenderam por que eu fiz algo... - Seus olhos me perfuraram, escondendo seus motivos. - E eu quero voltar ao que fui interrompido...

Fiquei sem voz por um instante, intrigada com o perigo em seu olhar e indignada com o fato de que ele era incapaz de responder a uma pergunta sequer. Ainda assim, mergulhei no seu jogo e me inclinei para a frente com um sorriso às bordas do penhasco do seu leito, sentindo a adrenalina fluir por meu corpo de uma forma que eu não sentia há muito tempo.

- Você fez algo muito errado, não fez?

A navalha de seu lábio rasgou um sorriso lascivo no rosto.

- Para algo ser um "erro" tem que depender de um ponto de vista. - Ele ronronou. - E, do meu, o erro foi ser capturado.

- E o que você fez para chegar a isso?

Ele abriu a boca, me tentando com a verdade e deixando minha imaginação explorar tudo que ele poderia ter feito para acabar ali, aprisionado como uma fera faminta... Como se eu devesse temê-lo... Mas, aos seus olhos, eu ainda não merecia respostas.

- Eu poderia partir o seu pescoço tão fácil quanto fiz com aquelas criaturas... - Ele sibilou, invadindo minha pele com calafrios. Eu deveria recuar, fugir, mas tudo que fiz foi me inclinar ainda mais para a frente, mal me equilibrando sobre o penhasco.

- Eu duvido da sua capacidade de fazer isso com essas algemas...

- Pode duvidar da minha... - Ele ronronou. - Mas não duvide da dele.

Me inclinei para trás.

- Dele?

- O parasita...

O que?!

Minhas mãos soltaram a agulha como se estivessem em chamas. Os parasitas interestelares eram os piores... Os que tomavam seu controle mais rápido; os que mais sugavam suas forças; e definitivamente os que eram mais difíceis de se livrar. Será que as luvas tinham sido grossas o suficiente?! Será que eu já estava contaminada?! Malditos iátricos que não me davam uma migalha de informação! A humana que se virasse!

- Os guardas me disseram que eu fiz umas coisas que... Não deveria... - Ele murmurou. - E eu ouvi histórias de parasitas que fazem as pessoas agirem assim.

E, fácil assim, meu medo evaporou. Revirei os olhos.

- Não acho que sua incapacidade de tomar responsabilidade pelos próprios atos seja o suficiente para um diagnóstico.

- Mas, supondo que os crimes de que estão me acusando sejam realmente culpa do parasita... Então eu estaria livre?

Meneei com a cabeça.

- Possivelmente.

- Então do que você precisa para me diagnosticar? - Um sorriso cheio de expectativas coroou sua feição, estimulado pelo desafio de me convencer e me falando mais de si do que seu nome jamais teria dito.

- Para começar: de uma história completa de como você pode ter se contaminado. - Minhas mãos nos quadris não o intimidaram.

Ele pigarreou de forma teatral - ou talvez existissem parasitas na sua garganta - e abriu a boca de um jeito determinado que me deu vontade de ouvir:

- Tudo começou pela manhã...

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