You were doomed,

466 39 1
                                    

If you were a church,
 I'd get on my knees
Confess my love, 
I'd know where to be.

Há pessoas cujas meras gaze e existência exalam dominância; aquelas com postura intimidadora e sorriso felino.
Kim Taehyung é uma dessas pessoas.
— Bom dia, Dulce. — Ele deseja. A voz rouca e máscula acerta-me em cheio. Despreparada para lidar com sua presença, oscilo.
— Bom dia, Taehyung. — Devolvo, desacostumada a chamá-lo e ser chamada por nossos primeiros nomes.
É um nível completamente novo de intimidade. E eu não estou pronta. Essa nem é a questão, afinal. O ponto é: não acho que um dia estarei. Posso esbarrar com o Kim todos os dias, conversar com ele a cada hora, deixar com que nossos dedos se toquem enquanto trocamos documentos: tudo ainda será tão arrebatador como na primeira vez.
Estar preparada para Kim Taehyung não é algo possível. E mesmo que você se esforce e acredite estar, ele encontrará algum meio tão natural quanto uma respiração regulada para te derrubar.
Kim Taehyung é o meu labirinto. Estou presa em algum lugar entre seus olhos intrigantes e seus ombros largos; rodando pelos mesmos traços e sinais há meses. A pior parte é que não quero encontrar uma saída. Gosto da confusão que sua certeza traz.
— O Sr. Cho deixou o material que tinha comentado aqui? — Ele pergunta, apoiando-se na mesa onde estou acomodada.
Minhas púpilas captam cada um de seus detalhes inefáveis: desde o cabelo escuro perfeitamente alinhado à blusa social cujos últimos botões ele não se deu o trabalho de fechar. Então, abalada pela visão nociva a todos os campos de minhas integridade mental e física, preciso desviar o foco ocular para qualquer ponto aleatório na estrutura de madeira.
— Sim. A pesquisa não avançou muito nos últimos dias, mas ele disse estar ansioso para o seu regresso após o feriado. Aparentemente, teve algumas realizações e quer testar o andamento sob novas circunstâncias. — Faço um resumo de tudo o que me foi dito há algumas horas pelo nosso superior. Só após, percebo que deveria estar entregando os ditos resultados para Taehyung e apresso-me em fazê-lo.
— Certo. Eu vou ler os arquivos enquanto almoço. — Notifica, acompanhando-me com seu olhar conforme eu me levanto e apanho a pasta com os últimos dados de sua pesquisa. O objeto descansava numa das gavetas mais distantes, ao fundo do sala. E eu rezo para que Taehyung não note meu corpo trêmulo a cada movimento que faço.
— É realmente melhor que coma primeiro. Você não pode passar tantas horas em jejum para realizar seus estudos. Ambos podem ser afetados. — Ajeito os óculos com minha mão livre, apertando a pasta contra meu corpo com a outra enquanto refaço todo o caminho de volta à minha mesa.
Arrisco erguer o olhar para o moreno, que não parece ter tido sua atenção desviada de minha figura em momento algum. Meus joelhos falham entre um passo e outro. E antes que eu tente me convencer de que o Kim não notou, percebo o sorriso ladino em sua expressão, declarando que estou mais do que errada.
— Agradeço pela preocupação, mas estou bem. — Arqueia as sobrancelhas, tecendo algum adicional em sua fala — Me pergunto se você pode dizer o mesmo, no entanto. — Abaixa-se um pouco, de forma em que estejamos ainda mais próximos quando retorno ao meu leito, já esticando o material em sua direção.
— O que quer dizer? — Forço um riso que acaba soando claramente nervoso.
— Anda comendo bem? — Seu rosto é inclinado minimamente para o lado, analisando o meu com minúcia. — Seu corpo parece fraco ultimamente.
Ah, está. E como. Meu corpo está deplorável, ardendo e queimando quando estamos próximos; esfriando e implorando ao nos distanciarmos.
Eu estou mais do que fraca, estou doente. Em abstinência por uma droga que nunca sequer fiz uso: Kim Taehyung.
— Você está bem? — Reforça a preocupação ao notar minha ausência de respostas.
Suas orbes se tornam lascivas demais e eu sou obrigada a abaixar o rosto, fugindo delas. Descontente, ele se inclina ainda mais. Sua destra alcança meu queixo, levantando-o sem que uma força considerável seja necessária; não preciso de muito para seguir aos seus anseios.
— Kang Dulce — Ele sopra, estudando meu rosto com ainda mais afinco. — Você está bem? — Suas palavras e respiração quentes acertam-me com uma pressão que não sei como processar. Minha mão ainda está estendida e a pasta treme sem parar.
Droga, ele não pode só pegar a maldita pesquisa e ir embora?
Todavia, eu não quero que vá. Ele já esteve distante por toda uma semana. Malditos feriados nacionais e maldito garoto de outra cidade. Esta faculdade é meramente tolerável. Sem Kim Taehyung em seus corredores, ela se torna uma masmorra a qual eu me condenei voluntariamente.
Porque eu nunca soube o que estava fazendo ou o porquê de fazer. Nunca tive certeza do curso que escolhi — nem mesmo agora, a alguns semestres de seu fim. Desde que pisei aqui dentro, porém, não pestanejo a ouvir e seguir o homem de sobrenome Kim com a mais irracional das devoções, mas também a mais convicta.
— Estou bem. — Minto, a muito custo. E ele não precisa nem fingir que acreditou nas palavras proferidas pela minha voz falha e quase inaudível. Ninguém acreditaria. Muito menos Taehyung, o garoto prodígio.
O Kim fora iniciado cientificamente pelo corpo docente da universidade. Suas ideias só não eram tão magníficas quanto seu desempenho.
Uma daquelas pessoas que mudariam o mundo. E a maldita pessoa que havia se tornado o meu mundo.
Patético, Dulce.
— Está bem? — O deboche é nítido, praticamente palpável. E eu sou pura vergonha e nervosismo.
Ainda mais patético.
— Talvez você só precise se distrair um pouco, então — Estende seu riso malicioso em um semblante completamente feroz. Ele não está nem se esforçando, mas já me sinto como uma presa prestes a ser devorada. —. Eu soube que Jimin e os garotos vão dar uma festa no fim de semana. Por que não vai? — Seus dedos compridos acariciam a minha tez, esticando-se para tocar também em minhas bochechas. — Trabalhar e estudar sem parar é um dos caminhos mais rápidos para a exaustão. — Continua. E eu já não sei dizer qual ponto de meu rosto ele está mirando. Sei que ele nota quando arfo, entretanto.
— Eu não tenho muito tempo livre. Você sabe. — Replico. E ele assente porque sim, sabe. Enquanto Taehyung vive num laboratório para se manter na faculdade, eu mato minha agenda entre um escritório e outro. Pode-se dizer que nós, estudantes bolsistas e pseudo-estagiários, nos entendemos bem.
— Eu também não. Mas eu vou. — Seus olhos tornam a encontrar os meus. — E eu gostaria de te encontrar lá.
Pronto. É mais do que suficiente para me persuadir. Ele me quer lá. — Quando é? — Indago, deixando minha atenção cair para seus lábios no momento em que ele os umedece.
— Sábado. Começa às oito. — Declara.
É um péssimo dia. É um péssimo horário. — Eu preciso ir à igreja com minha mãe este sábado. — Murmuro, frustrada.
Subitamente, ele se afasta.
— Ah, por favor. Você realmente acredita nisso? — Devo transparecer completa confusão. Mas ele não tarda a explicar. — Você realmente acredita que precisa ir à igreja?  — Ou implica. Talvez esse seja um termo melhor para o seu ato.
De todo modo, entendo: estou falando sobre crenças com um ateu astrofísico. E eu poderia, muito bem, estar ofendida pelo tom usado. Porém eu concordo. Não porque desprezo as religiões ou a existência de um deus, e sim pois não acredito em nada disso.
E ele sabe que não.
— Tudo bem. — Cício. Simultaneamente, ele alcança a pasta que, em algum momento, eu abaixei. Então, afasta-se. E, droga, ele não pode só voltar aqui e cortar qualquer distância que nos separe? Para sempre? — Eu não preciso ir à igreja com minha mãe no sábado. Mas…
— Mas — Toma a voz, aparentando carregar a mais pura das satisfações. — Você precisa ir me encontrar às oito. Na fraternidade dos Ômega. — Postula. E eu concordo.
— Te vejo no sábado, então. — Confirmo nosso encontro iminente em um misto de alegria e inquietação.
Taehyung meneia a cabeça em um gesto de despedida. Seus lábios e olhos se juntam para formar uma expressão que não sou capaz de ler. Ao menos, reconheço o tom pesado em sua voz ao escutá-la novamente:
— Ótimo. Vou te esperar. — E sai. Deixando-me tonta, em necessidade de sua presença e toque.
Agarro-me à mesa, submetendo-me à própria fraqueza. Já que, de alguma forma, pareço ter acabado de marcar a data para minha execução. E mesmo que fosse o caso, não me importaria em tê-la pelas mãos de Kim Taehyung.
O que é outra besteira. Comparar tal evento com um fim drástico é a mais ridícula das tolices.
Este sábado é sobre começos.

Church {Taehyung}Onde histórias criam vida. Descubra agora