QUATRO

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Eu não me lembrava de ter colocado despertador na noite anterior, e quando o mesmo me acordou de um sono profundo estendi a mão para a mesinha, dando fim ao som irritativo. Minha intenção era a de voltar a dormir, mas eu perdera completamente o sono ao me lembrar do sonho que tivera na naquela noite. Virei-me lentamente na cama fitando o teto branco, tentando me lembrar daquela aventura estranha, me permitindo lembrar de cada detalhe.

Sonhara que era uma personagem vívida de um livro de fantasia — embora fosse eu mesma. Sonhei que assistia as apresentações de um círculo cuja havia um tigre, cuja também era um príncipe amaldiçoado. Foi um sonho estranho, mas tão real.

Com um bocejo olhei distraída para o tapete felpudo creme no chão e vi um pequeno bilhete em papel simples onde pude ler facilmente em negrito "Precisa-se de trabalhador temporário para apenas duas semanas". Interrompi o bocejo e me sentei rígida na cama ainda encarando o bilhete misterioso.

Com um guincho da cama pulei e caminhei excitada até o papel no chão. Quase torci o pé quando pisei em falso em um sapato que estava jogado ali.

Agora com o pequeno bilhete nas mãos eu li com muita clareza:


PRECISA-SE DE

TRABALHADOR TEMPORÁRIO PARA APENAS DUAS SEMANAS.

ATRIBUIÇÕES: VENDA DE INGRESSOS,

ALIMENTAÇÃO DOS ANIMAIS E LIMPEZA DEPOIS DAS APRESENTAÇÕES.

Observação: Como o tigre e os cães precisam

de cuidados 24 horas por dia, fornecemos alojamento e refeições.


— O que está acontecendo? — perguntei me virando para a cama. Eu sonhei ou ainda estou sonhando?

Corri para o celular e eram 04h46 da matina. Ainda de pijama caminhei discretamente pelo corredor dos quartos até o pé da escada. Ainda estava muito cedo e sabia que provavelmente meus tios estariam dormindo, porém eu tinha um palpite. E escondida na beirada da sacada eu tinha uma boa visão da sala de estar e da entrada da cozinha que estavam com as luzes acesas.

Eu esperava por isso, mas ao mesmo tempo não. Lá, sentados no sofá se preparando para sair estavam meus tios. Pelas roupas esportivas, diria que estavam prestes a sair para correr. Claro, não era nada demais eles estarem acordados àquela hora e quererem sair. A vida era deles afinal. Mas meus tios nunca foram nada esportivos e algo me dizia que aquela cena estava ligada com o livro, o sonho pois assim como os meus tios, os tutores de Kelsey também acordavam super cedo para correrem.

Voltei para o quarto encabulada, me sentia um peixe fora d'água. Aquilo estava mesmo acontecendo? Sem saber o que de fato fazer, ir ou não trabalhar, resolvi tomar um banho para relaxar. Um bom banho seria aceitável para o dia longo e assustador que eu teria pela frente. Afinal, eu tinha um emprego, não tinha?

Sinceramente, não fazia ideia do que estava acontecendo. Até ontem minha vida era absolutamente normal, mas por algum motivo o jogo mudara de uma forma misteriosamente estranha e excitante. Pensei na história de A maldição do tigre enquanto ensaboava o cabelo com meu shampoo favorito de menta e fiquei determinada a seguir o rumo desta história que de alguma maneira estava entrelaçada com a minha realidade — eu seguiria as riscas.

Após sair do demorado banho, vesti jeans e uma camisa de mangas curtas. E me sentindo feito uma idiota e lunática, peguei minha mochila de escola no armário e enfiei dentro três pares de roupas, alguns produtos de higiene e roupas íntimas. Pensei em levar um livro me lembrando de como Kelsey lia histórias para Ren, fazendo-o companhia. Ele adorava ouvi-las. Bufei. Isso é loucura!

Mesmo assim vasculhei entre os livros a procura do título ao qual eu estava presa, mas não encontrei nenhum dos livros da saga. Claro, eu não iria ler a própria história de Ren para ele, apenas o levaria como um guia. Era muito estranho os livros terem simplesmente sumido, eu os deixava bem expostos na prateleira.

Agora, de frente ao espelho, eu escovava os cabelos enquanto questionava a garota ruiva refletida nele à procura de respostas.

— Se eu estou fazendo o papel de Kelsey, onde ela está? Terei mesmo que quebrar uma maldição de verdade? — A garota ruiva parecia assustada e perdida. Tentei sorrir para ela na tentativa de mostrar que estava tudo bem e que teria uma solução para tudo aquilo; que era possível dela ainda estar apenas sonhando, mas não funcionou.

Eu estava completamente perdida e sozinha.

Senti um arrepio na espinha me lembrando dos problemas e perigos que Kelsey e Ren enfrentavam no decorrer da história. No entanto eu precisava ser otimista: eu daria conta do recado. Eu podia me sentir como se fosse capaz de quebrar mil maldições, afinal eu sabia o que me aguardava e poderia moldar a história da maneira que quisesse sem perder sua essência. Eu sabia o enredo todo. Agiria de forma inteligente e não cometeria os mesmos erros que os personagens principais da história, como não pedir ajuda a Fanindra nos momentos mais precisos, não ficar sozinha na floresta em Kishkindha pois provavelmente um Kappa sugaria meu sangue até a morte e... não ser tão rude com Ren. Ele era um bom homem e queria apenas a companhia de alguém depois de séculos sem contato humano.

Eu não pensava em me aproximar de Ren ou Kishan com segundas intenções, eu não era Kelsey. Eles não eram reais. Nada daquilo era real. E me apaixonar e namorar Príncipes Encantados estava longe dos meus planos. Eu era Scarlet, uma garota totalmente diferente de Kelsey e obviamente os príncipes não teriam interesse em mim já que não sou destinada a nenhum deles — eu não pertencia àquele mundo. Eu estava apenas presa em um livro fictício.

A maldição do tigre - FANFICWhere stories live. Discover now