Champagne Bubbles

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 Em silêncio, assisto enquanto o fim de tarde se instala do outro lado das vidraças. O céu acinzentado de Londres possui pequenos feixes alaranjados, que iludem os turistas ao lhe dar a falsa impressão de um possível espetáculo por trás das nuvens tempestuosas.

 Infelizmente, para alguém que nasceu e cresceu na cidade, meus olhos são bem treinados para saber que isso não passa de uma bela fantasia. Logo após essa encenação de luzes fracas, o tempo fechará mais uma vez e derrubará o dilúvio sobre a cabeça dos desavisados, que provavelmente encherão as ruas enquanto correm de um lado a outro, se perguntando como que a paisagem tão bonita de repente havia se transformado naquilo.

 Minha atenção se desvia quando o Sr. Spencer se levanta de sua mesa rotineira, logo após ter finalizado o último pedaço do bagel que pede desde que comecei a trabalhar no Funky Eden, há quase um ano. Ele caminha em direção ao balcão, o corpo pendendo levemente para o lado, consequência de um acidente numa construção civil em que trabalhou há mais de trinta anos. Ele sempre teve um ar de superioridade ao dizer que havia sido a serviço da Coroa, mas nunca deu mais nenhum detalhe sórdido.

 Uma pena, pois curiosidade é meu nome do meio e isso fez com que eu perdesse uma semana de sono imaginando do que se tratava.

 — Não vou mais te segurar por hoje, Dev. — ele diz, sorrindo enquanto estende uma nota sobre o balcão. Não preciso olhar para saber que vale o dobro do total de seu pedido, mas o Sr. Spencer sempre gostou de dar gorjetas generosas. — Você deveria ir antes que a chuva caia.

 — Nenhum londrino que se preze tem medo da chuva, Sr. Spencer. — retribuo o gesto, vendo-o negar com a cabeça grisalha antes de pegar seu guarda chuva, próximo a saída. — Boa noite.

 Ele acena antes de sair, acionando o sino sobre a porta, mesmo que ninguém mais entre. Assisto-o sumir através da vidraça, se misturando entre os outros cidadãos.

 Quando meu chefe, Deacon, finalmente retorna dos fundos, optamos por encerrar o dia. Ele fecha as portas e limpa os utensílios e o balcão, ao passo que eu dou uma geral nas mesas e me despeço perto das 18h, vendo-o virar a placa de "aberto" para "fechado" assim que cruzo as portas de vidro. Coloco os fones nos ouvidos e o capuz sobre a cabeça, caminhando devagar rumo ao apartamento há duas quadras dali.

 O cheiro do perfume de Pola empesteia a casa assim que cruzo as portas, me fazendo franzir o nariz. Não que seu perfume frutado de mais de duzentas libras seja ruim, mas a nuvem que ela forma ao seu redor para garantir que todos possam compartilhar de seu cheiro geralmente ataca minha alergia, então coloco a mão na frente do rosto.

 — Pola Hudson! — grito, tentando me sobressair a música alta que se arrasta para fora de seu quarto.

 Ela não responde, e sua cantoria desafinada acompanhando as cantoras coreanas me faz revirar os olhos e seguir até lá, vendo minha melhor amiga mexendo seus quadris avantajados à frente do espelho. Vejo o delineador deslizar ao redor de seus olhos verdes, formando uma camada grossa que os deixam ainda mais misteriosos. Quando os mesmos repousam sobre mim através do reflexo, Pola abre um enorme sorriso.

 — Bem a tempo! — ela diz, abanando as mãos na minha direção. — Vá se arrumar que ainda dá tempo de ir comigo!

 — Pola, eu definitivamente não quero ir a uma festa de executivos. — Faço uma careta e me apoio no batente, observando enquanto ela finaliza a maquiagem.

 O vestido verde musgo que Pola usa marca perfeitamente todas as curvas de seu corpo voluptuoso, e os cachos amendoados caindo ao redor de sua pele escura lhe dão um ar perfeito de mulher de negócios. Parece muito diferente da minha amiga que anda por aí de camiseta de universidade e calcinha, cantando pop coreano enquanto dá um tapa.

Three Pieces | Tom Holland & Jake GyllenhaalWhere stories live. Discover now