O enviado

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Ao fim da tarde Alicia estava preocupada, e viu a enfermeira sentada na poltrona lendo a bíblia.

- Desculpe, mas você é evangélica?

- Não sou evangélica. Por quê? – indagou calmamente a mulher tirando os olhos das páginas da velha bíblia em seu colo.

- Bem, pensei que... não ligue para mim, desculpe... – murmurou Alicia sem jeito.

- Sou católica e leio a bíblia todos os santos dias. Você deve estar acostumada a pensar assim já que muitos católicos não têm costume de ler a escrituras sagradas ou de levar a bíblia para a missa não é?

            Alicia balançou a cabeça em confirmação.

- Você é católica, Alicia? – perguntou a enfermeira.

- Bem... eu vou de vez em quando, se quer saber. Mas não ligo muito para esse papo de religião.

- Você precisa se aprumar e encontrar um caminho que a leve para a paz celestial, minha jovem. Todos precisam de Deus, e sem ele estamos perdidos.

            Alicia sentiu um arrepio pelo corpo todo e lembrou-se do pesadelo na noite passada.

- Você acredita no... no diabo?

- Se eu não acreditasse estaria negando a Deus e a sua Palavra.

- Então você acredita?

- Mas claro! Ele foi um anjo de Deus e quis ser maior que seu Criador, por isso foi lançado para fora do seu santuário.

- Ele... quero dizer, pode nos causar mal? – indagou ela numa voz de pavor.

A enfermeira fechou a bíblia e chegou mais perto da garota.

- Qual é o problema, menina? Sei que está preocupada, conte.

Alicia sentiu novamente calafrios e tinha impressão que teria novos pesadelos reais naquela noite.

 - Eu não sei o que acontece... mas sinto que estou sendo perseguida... – ela dizia olhando bem nos olhos da velha enfermeira. - ...perseguida por algo que não deveriam existir mais. Você me entende?

            A enfermeira olhou para a janela e sentiu um ar pesado se manifestando no ambiente e fechou os olhos.

- O que você tem senhora Lídia? – Alicia sentira que a mulher estava reagindo estranha, mas logo ela abriu os olhos e sorriu.

- Hoje se não se importa vou dormir aqui em seu quarto está bem para você?

- Sim. – respondeu a garota para ela sem hesitar.

Alicia tomou banho e jantou. Tomou seus remédios e logo caiu no sono. A princípio dormiu em paz e a enfermeira trouxe o colchão da sua cama para o quarto de Alicia e ficou sentada na poltrona lendo a bíblia até os pais da garota irem dormir. Era meia noite quando a enfermeira sentiu um frio percorrer o quarto e ela olhou para a janela fechada. Não era um frio comum, e o cheiro de podridão abaixou do teto envolvendo todo o quarto.

            A enfermeira abriu a gaveta do criado mudo ao lado e tirou um terço e enrolou entorna da mão e beijou três vezes a cruz em miniatura.

- Pai celestial... dá me a graça e a sabedoria para honrar seu nome e libertar essa alma das garras do mal em nome de seu filho amado Jesus Cristo... – disse ela de olhos fechados, permanecendo em comunhão. Escutou uma risada grossa e sabia que não pertencia a da jovem Alicia. Ela abriu os olhos sem medo do que estava para presenciar, e viu a gargalhada saindo da boca de Alicia, porem tinha certeza que Alicia não estava ciente do que estava acontecendo em seu corpo.

            A coisa usou da boca de Alicia para falar.

- Está perdendo seu tempo, irmã. Essa vadia é nossa.

A enfermeira levantou e foi ficar ao lado de Alicia tomada por um espírito.

- Quem é você? E o que quer com essa jovem?

Somente a boca se mexia, mas os olhos estavam fechados como se uma parte de Alicia estivesse de fato dormindo.

- Meu nome é menos importante daquele que me enviou, irmã.

- O que quer com essa menina?

- Ela é daquele que me enviou.

- Quem é ele?

- É mais do que eu.

A enfermeira pegou a sua bíblia e abriu e começou a ler uma passagem em São Lucas, capítulo 4. Leu sobre a tentação de Jesus e acabando, perguntou para quem falava na boca de Alicia.

            - Por acaso o nome daquele que te enviou foi citado nessa passagem bíblica?

- Se eu responder estarei respondendo a sua pergunta, irmã.

- Então está a serviço do diabo?

- Todos estamos a serviço, irmã. – respondia educadamente.

- E qual é o propósito disso?

- É assunto pessoal, não tenho permissão de falar.

- Pode pedir para seu chefe vir falar comigo?

A boca de Alicia se fechou e abriu depois.

- Ele não quer falar com você.

- Porque não quer? Ele tem medo de mim ou daquele que me enviou aqui nessa casa?

- Quem te enviou? – perguntou o possuidor.

- Deus.

- Temos medo de Deus, não de você.

- Então vou esclarecer a minha pergunta. Em nome do senhor Jesus Cristo, diga o que essa jovem fez para serem perseguida por vocês anjos caídos e pelo diabo?

- Ela não fez nada, irmã, nada. Mas o seu... – então o quarto voltou a ser como era antes, o frio foi embora e o fedor desapareceu. Alicia estava dormindo e se mexeu um pouco na cama, mas não acordou. A enfermeira então deixou seu terço próximo a sua cabeça e apagou a luz. Deitou no colchão e dormiu.

Alicia acordou com a claridade do sol da deliciosa manhã. A enfermeira já tinha se levantada e estava preparando os remédios para ela tomar. A mãe de Alicia foi até o quarto da filha e desejou um bom dia.

- Dormiu bem, filha?

- Dormi, sim, mãe. – respondeu ela.

- O que é isso? – apontou a sua mãe para o terço repousado em seu peito.

- Não sei. Mas é um rosário, não é? – e Alicia pegou. – Deve ter sido a enfermeira. Ela é uma católica e tanto!

- Que bom! – e sua mãe saiu, e desceu para a cozinha e encontrou a velha enfermeira. A senhora Lídia lhe sorriu e lhe deu bom dia. – Muito bom dia, senhora Lídia. Você colocou aquele rosário ao lado de Alicia?

- Sim senhora, fui eu mesma. Achei que ia protegê-la dos pesadelos.

- Alicia teve uma noite boa pelo que vejo. – concordou a senhora Rosana.

A enfermeira apenas forçou um sorriso e a deixou na cozinha, levando os remédios de Alicia.

O Inferno de AliciaUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum