☠ XIX - Resolução ☠

Começar do início
                                    

— Um navio pirata, pronto para atacar — respondeu Nadine.

Henrique tirou uma mecha de cabelo molhada do rosto e apurou sua visão. Em algum ponto distante, um barco pesqueiro desafiava a tempestade que se formava. Mais à frente, um enorme cargueiro cruzava o horizonte. Não havia nenhum sinal de piratas.

— Não entendo porque não podemos voltar e tentar convencer Elisa a vir conosco.

— Porque seria uma tarefa inútil. Elisa tem um forte senso de responsabilidade com a mãe e o irmão, nada do que pudéssemos falar a convenceria a voltar para a ilha.

— Ainda assim, apenas deixá-la aqui não parece certo... — Henrique parou de falar por um momento, uma sombra de rancor passando por seu semblante. — Você acha que Rafael teve alguma influência sobre isso?

Nadine o olhou com simpatia.

— Tenho certeza que não. Elisa não seria tão superficial assim.

Henrique cerrou os punhos, sentindo um gosto amargo na boca.

— Mas se eles saíram juntos...

Ela tocou em seu braço delicadamente, fazendo-o encará-la, confuso. Henrique não sabia que a pirata-bruxa era capaz de gestos delicados.

— Fique calmo. Elisa não me contou nada sobre isso, mas tenho um palpite de que as coisas não saíram muito bem entre eles.

— Por que acha isso?

— Ora, Elisa estava sozinha no hospital quando o avô morreu. Não tenho experiência em encontros românticos, mas era de se esperar que ele a deixasse em casa depois disso. É muito estranho que ele a tenha deixado lá, sozinha. E depois, Elisa não tocou no nome dele uma única vez sequer, nem tentou avisá-lo do que aconteceu. É como se ela quisesse fingir que o encontro com Rafael nunca existiu.

As palavras de Nadine o tranquilizaram, mas qualquer resposta ficou perdida no ar. Oliver, que tinha se afastado para explorar o local, voltava correndo, de bochechas coradas.

— Ei, pessoal, vocês precisam ver isso!

Eles correram a tempo de ver um grande navio fincar suas tábuas nas areias molhadas da praia e dezenas de piratas muito bem armados começaram a descer, não se importando com a chuva que os encharcava. Tinham uma expressão faminta no rosto.

Àquela altura, a praia já estava quase que completamente vazia, mas uma família retardatária aproximou-se com curiosidade. Talvez pensassem que se tratava de algum tipo de atração turística. O pirata que parecia ser o líder deles deu um passo à frente, sacando sua pistola e atirando aos pés do pai para afastá-los. A mãe gritou em desespero, abraçando as crianças protetoramente.

— Cai fora! — demandou o pirata, encarando-os com selvageria.

A família apressou-se em sair dali aos tropeços, ainda muito assustados para registrar o que acabava de acontecer.

Henrique engoliu em seco, olhando com preocupação para as suas parcas armas.

— Eles são muitos. Nunca conseguiremos vencê-los com isso.


☠☠☠


O velório não durou muito. Como Elisa não tinha mais nenhuma família na cidade, poucas pessoas compareceram, a maioria conhecidos do seu avô e antigos colegas de trabalho. Estender demais seria apenas prolongar o sofrimento.

Um padre apareceu para rezar o terço e dizer as palavras finais para que a alma descansasse em paz, e logo após o corpo foi levado para o enterro. Elisa passou por tudo isso no piloto automático, como se tivesse tomado uma grande dose de anestesia. Sua mãe ainda parecia péssima, e até mesmo Beto estava pálido e abatido. Assim que chegaram ao cemitério e desceram do carro, o garoto cambaleou para frente, e Elisa teve que segurá-lo pelos ombros para que firmasse no chão.

Libertália: Raízes PiratasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora