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O bolero, até então mais agitado, ficou mais lento e a gente se aproximou com um toque leve da mão nas minhas costas. Ele era menor que eu, mas eu me sentia acolhido nos braços dele, protegido, e até fechei os olhos pra dançar. Hobi realmente era ótimo dançarino e sem que eu percebesse já estávamos com nosso peitos unidos e os rostos lado a lado. Ele me conduzia de forma tão leve que eu mal sentia os comandos. Ele seguia o ritmo e me surpreendia enquanto a música de Luís Miguel, uma velha conhecida minha, ressoava pelo ar. Eu já havia tocado aquela mesma música milhares de vezes no saxofone, mas nunca tinha me sentido tão bem ao ouvi-la quanto ali, enquanto eu dançava com ele. Talvez fosse o modo como Hobi me fazia me mover, que me conduzia a outro lugar. De repente eu não me lembrava de Jimin, mesmo que tivesse dançado com ele tantas vezes. Eu também não pensava em minha vida. Eu só estava ali com ele, me movendo junto ao corpo dele, deixando que ele me fizesse me sentir bem ao girar, me afastar, me aproximar. Parecia que nada mais importava. Como na letra da música, não existia mais o passado, era como se eu tivesse renascido ali ao dançar com ele.

Quando as últimas notas soaram, Hobi me segurou firme nos braços dele e compartilhamos um sorriso quando houve silêncio. Eu estava olhando nos olhos dele e sorrindo e senti que o resto do mundo havia desaparecido. Me assustei quando percebi que estava sentindo aquilo e quis fugir do olhar dele que parecia ver toda a minha alma. Pra não olhar nos olhos, eu o abracei, deixando o queixo sobre o ombro dele, com a desculpa de que estava agradecendo pelo momento. Ele me agradeceu também e apertou mais forte o peito contra o meu, foi aí que senti sua respiração acelerada, sua pulsação e fechei os olhos, me entregando ao abraço, porque no abraço não estaria preso em seu olhar. Era mais fácil me desvencilhar dos braços que daquele olhar sorridente. No entanto, não seria fácil me desvencilhar do que vi, porque então, vi meu próprio rosto.

Eu não podia acreditar e o empurrei o mais suave que pude diante daquele choque. Fiz com que se afastasse, mesmo que ele tentasse me segurar pelo braço. Bati acidentalmente em Yoongi, quase o derrubando. Tudo que consegui dizer foi que não estava bem e ele parecia ter entendido que era a bebida que havia me feito mal porque fez um gesto indicando que eu devia beber água.

Eu realmente passei mal. Corri para o quarto e vomitei tudo que havia no meu estômago. Foi quase tão ruim quanto naquela festa em Busan onde o Jimin me apresentou aos amigos. Depois eu tomei banho, escovei os dentes, me deitei na cama mas não conseguia dormir. Tudo girava e eu nem podia culpar a bebida, já que eu tinha colocado tudo de químico que me embriagava para fora. Fui até a varanda fumar o cigarro que eu ainda guardava na minha carteira, mesmo depois que o Jimin me ajudou a parar. O efeito da nicotina nos meus pulmões, depois de tanto tempo, parecia diferente: eu me senti ainda mais ansioso depois daquele cigarro e quis fumar mais um ou um maço inteiro, quem sabe? Então desci até a loja de conveniência no saguão do resort. Embora o salão onde a festa que fomos estivesse mais vazio, como dava pra ver pela vidraça, ainda havia muita gente ao redor, barulho, estímulos e eu só queria ficar sozinho para fumar mais até que a fumaça apagasse aqueles pensamentos inquietantes que estavam na minha cabeça desde que eu havia visto meu próprio rosto nas batidas de coração do Hobi.

Só que quando eu estava no corredor do meu quarto, lá estava ele. Hobi estava com os primeiros botões da camisa abertos e passava os dedos pelos próprios cabelos suados, deixando sua frustração mais bonita ao despentear os fios castanhos. Eu parei ao perceber que ele batia exatamente na minha porta e planejava dar meia volta e fugir despercebido, mas ele notou meu movimento, se virou pra mim e chamou meu nome. Quando ele se virou eu me surpreendi. Como é que alguém pode ser ainda mais bonito em desalinho?

Eu suspirei em desistência da fuga. Eu teria que encarar aquele homem no meu caminho. O que é que ele estava fazendo ali?

O coração sabe o que quer - VHOPEWhere stories live. Discover now