Capítulo 4

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Passo o dia desviando de Caleb e Christine, evitando ficar em seu caminho. Passeio distraidamente pelos jardins e exploro a casa, e quando o cansaço bate, pouco depois do almoço, me recolho. O tamanho da casa me oprime, como se o excesso de espaço me fizesse mal, e estar no quarto desata um nó no meu peito. Sinto-me mais segura dentro de um espaço confinado.

Acabo dormindo antes mesmo de anoitecer, e é então que os sonhos vêm.

É vívido, e borrado ao mesmo tempo. Estou em uma cela, um espaço de no máximo dois metros quadrados, mas não é isso que me assusta. O pânico vem quando ouço passos e sei que estão vindo por mim. Meus dedos se prendem às barras da cela, e chuto quando braços vem me buscar. Puxam-me pelas pernas, atam-me a uma maca. Me debato enquanto luzes vem e vão, mas não há nada a ser feito.

As imagens são inconstantes, como flashes. Agulhas, muitas agulhas, e máscaras. Médicos e enfermeiras, as identidades ocultas por trás de máscaras brancas e toucas e jalecos. Um nome, apenas um nome.

— Fique calma, Mayumi. Não se exalte. Você sabe o que acontece se você se exaltar. — diz um dos médicos, um par de olhos azuis flutuantes sobre mim.

Fique calma, Mayumi.

— Acorde! Ei, ei, você está sonhando! Acorde! — diz uma voz distante, perdida em meio às imagens. Agulhas, máscaras, dor. Luzes, barras, braços, pernas, chutes. Proteja-se.

Fique calma, Mayumi. Não se exalte.

— Acorda! Não é real, é só um sonho!

Mayumi.

Sinto dor, e grito.

Abro os olhos, e o branco se tingiu de negro.

***

Meu grito corta o ar, a garganta e o medo. Demoro um instante até entender onde estou, e por que a escuridão parece tão errada, tão anti-natural. Ela não vem da noite, como eu esperava. Não há cores, não há formas, mesmo na falta de luz.

Não. Essa escuridão vem de mim.

Ela é palpável, como uma nuvem negra que preenche o quarto. Sei que ela vem de mim porque, quando me movo, ela se move junto, deixando um rastro por onde passo. Não sei como fiz isso. Não me lembro de poder fazer isso.

— Onde você está? — ouço a voz de Caleb, mas não o vejo. Mas tão logo o procuro, a escuridão se abre, formando um caminho que vai dele até mim. Ele parece aliviado ao me ver e acende inutilmente uma lanterna no celular.

— Oi. — ele diz, com um sorriso — Fica calma, ok? Deve ser só um blecaute.

Ele não parece nem um pouco certo disso, mas não tem nenhuma explicação melhor. Não sei se a que eu tenho para dar é a melhor das opções. Nem eu tenho certeza do que está acontecendo.

Olho para as minhas próprias mãos, trêmulas. Meu coração bate descompassado. Não se exalte, dizia o médico do sonho — sonho não. Lembrança. Se me acalmar, talvez a escuridão desapareça.

Mas como eu me acalmo?

— Ei, ei, está tudo bem! — ele se aproxima, colocando as mãos nos meus ombros — É só um blecaute. A luz vai voltar.

De alguma forma, sentir suas mãos me deixa simultaneamente mais nervosa e mais calma. Não consigo decidir qual dos sentimentos me domina mais. Respiro fundo, lágrimas se acumulando nos cantos dos olhos.

— Olha pra mim. — Caleb diz, as mãos apertando meus ombros de leve — Respira. Você está segura. Não tem nada aqui pra te machucar, ouviu?

Estou segura. Repito isso para mim mesma como um mantra. Estou segura, estou segura.

Fecho os olhos e respiro devagar. Estou segura.

Fique calma, Mayumi.

Inspiro, expiro.

Abro os olhos.

A escuridão se foi.

Vacilo, e Caleb me segura. Ele me põe sentada na cama, e percebo que também analisa os arredores, a maneira como o escuro de agora é tão diferente do escuro de instantes atrás. Há luz entrando pela janela, formas cercando o quarto. Há vida.

— Mayumi. — eu murmuro, então, e vejo-o franzir a testa levemente — Meu nome é Mayumi.

No EscuroUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum