seis

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Estar frente a frente com um homem desses é como enfrentar a morte. Cada pigmento em sua pele me parece mostrar o qual forte ele é, talvez imune a dor. Sua postura rígida não passa nenhuma segurança para seus inimigos.

Ele retira os olhos do celular — que sua enorme mão segura — e desvia-os para nós. Percebo que o corpo de Renan também estará rígido. Medo ou coragem? Eu não sei. Alê, solta seu aparelho em cima da mesa e abre um sorriso. O dente incisivo lateral era feito de ouro. Confesso que nunca vi este homem tão de perto.

— Chora não, branquela. Te fiz um favor.

Ele diz, me seguro para não chorar.

— Alê, tem como adiantar? Ela ainda tem que dá a notícia para a mãe. — Renan pede.

— Não será preciso.

Ele se levanta e caminha, ficando a poucos passos de distância.

— Eu vou ajudar ela a retirar

— Você gosta de ajudar ela, né? Tá comendo pelo menos? Porque pelos favores que tu faz. — ele ri. — e tu? Não fala nada?

Olho para Renan e depois para o chão. Minhas mãos tremem.

— Não sei o que dizer. — Sussurro.

— Não ouvi, piranha. Fala direito — Ordena — deixa eu te ajudar.

Ele se põe de frente para mim, me assustando. Meu coração parece querer sair pela boca. Sua mão aperta minhas bochechas com força, eu aperto os olhos pela dor.

— Renan — sussurro com medo.

— Tá machucando ela, Alê. — Renan alerta — a mina só quer fazer o que tu mandou.

Os olhos daquele monstro estavam ficados aos meus. Ele parecia ler minha alma. Não suportando a dor que meus dentes causam rasgando minhas bochechas, eu dou socos em seu braço. Ele ri.

— Desgraçada do caralho. — Ele me empurra para trás. Eu caio ao chão. — bora, vou junto.

Renan me ajuda a levantar e retira a mochila de minhas costas. Levo minhas mãos a bochecha, massageando o local. Era possível sentir o gosto metálico do sangue.

Infeliz

Desgraçado

Miserável

Quando saímos do local, ele não estava lá. Sem se despedir subimos na moto e partimos. O local onde o corpo está, não é longe, pelo contrário. Eu o conhecia, qualquer morador conhece. É uma encosta enorme, lugar onde os traficantes matavam e jogavam os corpos encosta a baixo.

Obviamente não era possível subir de moto ou qualquer outro meio de transporte. Assim que desço da moto, vejo outra parada. Era a dele, com certeza. Renan segura em minha mão e caminha comigo, subimos uma pequena ladeira e ao fim vemos Alê parado, fumando o que parecia ser um cigarro. Ele olha para trás e solta a fumaça. Quando o mesmo caminha para o lado, eu vejo o corpo de meu pai, jogado ao chão

Não resisto e choro novamente. Desta vez eu caio de joelhos sobre o barro. Meu corpo inteiro estará trêmulo demais.

— Calma amor — Renan sussurra. — Vem, vamos acabar com isso logo.

Ele me levanta pelo braço e caminha comigo até o corpo. O sol o aquecia, deixando o cheiro de sangue ainda mais forte. Eu vomito.

— Fresca do caralho — Alê comenta — vambora, eu não tenho o dia inteiro.

— Eu não consigo — sussurro.

— É o que? — Ele pergunta ignorante.

— EU NÃO CONSIGO, PORRA! — Grito completamente fora de mim.

— Mas vai conseguir, sua vadia.

Ele joga o cigarro no chão e vem em minha direção pisando firme, mas Renan se põe em minha frente.

— Ela vai fazer, Alê. Dou minha palavra — Renan diz.

Alê é mais alto e forte que Renan. Em seus vinte anos de vida, Renan é completamente magro. Provavelmente esse mostro deverá ter uns vinte e cinco anos, ou mais.

Tomo coragem e me aproximo do corpo. Renan pega seu celular e parece mandar mensagem para alguém, provavelmente para o seu amigo com o carro. Eu teria que carregar o corpo até a entrada. Quando meu amigo se aproxima para me ajudar, Ale o impede

— Ela vai fazer isso sozinha. — O mostro diz. Me surpreendendo.

— Qual foi, Ale. Ela não vai aguentar.

— Bora, branquela. Começa.

Havia tantos buracos de tiro no cadáver. O rosto completamente inchado.

Seguro no braço de meu pai e puxo, ele sai apenas alguns centímetros do lugar. Meus olhos ficam embaraçados pelas lágrimas, eu limpo meu rosto, provavelmente estará sujo de sangue, assim como meu uniforme. Após inúmeras tentativas, o corpo estará quase ao mesmo lugar.

Não que eu seja completamente fraca, mas meu pai era enorme. Tento novamente, desta vez puxando por sua camiseta, a mesma se rasga e caio de bunda no chão. O monstro ri, como se ferrar o psicológico das pessoas fosse super normal.

— Eu desisto. — Alerto — não vou conseguir.

— Vem, levanta — Renan diz me ajudando.

— A chance eu dei. Agora já era. — Alê atormenta.

Disto isto ele segura pelos pés do cadáver e o arrasta até o precipício — assim o via — então empurra o corpo que cai.

Sinto vontade de ir até o mesmo e socar seu rosto. Joga-lo aqui de cima, isso sim seria um favor para o mundo. Tudo o que faço é esconder meu rosto no pescoço de Renan, que nesta altura do campeonato não de importa com a opinião de seu chefe, apenas me abraça.

— Posso liberar ela? — indaga Renan.

— Vocês são tudo um bando de merda. Olha pra mim — ele ordena, eu nego — ele não vai te proteger de mim, sua puta. Isso é só o começo do seu inferno.

Continuo sem fitar seu rosto. Minhas lágrimas molham o pescoço de Renan, que me aperta tentando passar segurança.

— Ele já foi. — Alerta ele.

— Por que ele me odeia, Renan? O que eu fiz?

Me afasto e fito seus olhos.

— Cara, ele é doente. Sei lá, vai ver sua mãe ou teu pai devem ter feito algo. — ele bufa — preciso avisar ao parceiro que não vamos precisar do carro. Bora, vou te levar para casa.

Eu assinto limpando meu rosto. Ele segura em minha mão e me puxa, com a outra ele pega seu celular. Antes de sair, eu dou uma última olhada para o local.

Entre Rosas -(DEGUSTAÇÃO) حيث تعيش القصص. اكتشف الآن