1 || Christmas time

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Saio da escola com Mathew e vou com ele no autocarro. Hoje foi o último dia de aulas do 1º Período e eu mal posso esperar por chegar a casa e descansar. Não sou muito de sair de casa, a não ser para ir a casa de Mathew ou Mia, os meus poucos amigos e que são praticamente meus vizinhos ou para ir à pequena escola de música.

Mathew e eu abandonamos o autocarro e ele vem comigo até casa, seguindo caminho para a sua, logo de seguida.

Já em casa, digo olá à minha mãe, como leite com cereais e subo para o meu quarto, que é no último andar, por isso é o mais pequeno com o teto em triângulo e uma claraboia.

Adoro o meu quarto. Posso dizer que é a minha divisão preferida. A minha cama é espaçosa e está encostada à parede, o armário é simples e todo branco, assim como a mesinha de cabeceira, a minha secretária e a minha cómoda cheia de fotos minhas com a  minha família e amigos. Tapetes brancos com retoques cinzentos e candeeiros brancos, também com uns retoques cinzentos. Paredes pintadas de branco com quadros pintados pelo meu padrinho. Ele tem muito jeito e adora o que faz. Ao lado do meu pequeno e velho sofá cinzento, está uma prateleira enorme cheia de livros velhos já usados que vieram dos meus avós maternos. A melhor recordação que tenho deles. Tenho mesmo muitas saudades deles. Já li mais de metade e quero lê-los todos.

Ao fundo do armário, numa caixa de madeira grande que fecho com um aloquete estão todos os meus diários, as minhas poupanças e a maldita lâmina, que, infelizmente, uso com alguma frequência. Não sou daquelas que chora na escola, com as crises da adolescência, mas tal como toda a gente, tenho os meus problemas e, como sou fraca, esta é a única maneira que tenho de me acalmar. A Mia é a única que sabe disto e no que dependesse de mim, ela não sabia de nada, mas há coisas que simplesmente não se conseguem esconder dos melhores amigos. Ela é muito compreensiva comigo e é das melhores pessoas que conheço, não sei o que seria de mim sem ela. Ela está sempre lá quando preciso, mas a verdade é que ela me critica bastante por me auto-mutilar, mas eu não consigo, simplesmente é mais forte do que eu. Eu tenho tantas saudades dos meus avós, tantas. Aquele maldito acidente tirou-lhes a vida e nem me deixou despedir deles direito. Ficou tanta coisa por dizer, principalmente um obrigado do tamanho do mundo por tudo o que fizeram por mim. Eles eram como um pilar para mim. Eram o meu equilíbrio, o meu porto seguro para tudo. Estiveram sempre lá para me ouvir, para eu desabafar por causa das falsidades, exclusões e gozos a que sempre fui sujeita na escola. As raparigas e os rapazes sempre me excluiram e sempre me olharam de maneira diferente, só por causa da minha aparência física. Mas eu, mesmo assim, sempre sorroi para toda a ente e mostro que não me afeta. Isto custa tanto, mas tanto. Sentires-te mal contigo própria e com toda a gente, sentires-te magoada, angustiada, frustrada, mas mostrares sempre que és a pessoa mais feliz à face da Terra. Sem eles, é vazio e só vazio. Foi desde esse dia que isto dos cortes começou. Eu já não suportava sentir-me um lixo e não tê-los vivos ao meu lado. Os meus melhores amigos estão sempre lá para mim e eu sei que posso contar com eles, mas eu não gosto de os preocupar com os meus problemas e tenho medo que eles pensem que eu sou alguma pobre coitada que não tem onde cair morta. Depois dos meus avós falecerem, prefiro guardar as minhas angústias para mim e isso está a matar-me aos poucos. Não há um dia em que eu acorede e não queira dar-me um tiro a mim própria por o ter feito. Não há um dia em que eu me olhe ao espelho e me sinta completamente frustrada, angustiada, em que eu não me sinta um nada. Mia está sempre a dizer que depois de tudo o que passei e passo, era melhor ter um psicólogo. Ela diz que me iria ajudar. Sinceramente, estar frente a frente a um estranho a responder a perguntas sobre a minha desinteressante e miserável vida não me parece que vá ajudar. DE TODO!

Não posso mentir, tenho uma certa inveja dela. Posso até ser egoísta por isso mas, caramba, ela tem tudo o que eu sempre desejei na vida! Ela é segura de si própria e tem uma relação familiar harmoniosa e saudável, ao contrário de mim, que tenho os meus pais separados e mudo de casa de 15 em 15 dias. Ela é linda, com aqueles cabelos longos, castanhos e encaracolados, com aquela pele morena e com aquele sorriso e aqueles grandes olhos, rodeados por umas pestanas compridas, que encantam qualquer pessoa. E eu? Eu tenho um cabelo castanho liso, uns olhos desinteressantes, uma pele mais branca que a neve e sardas. Sou demasiado. Os meus pés são enormes e as minhas mãos são horríveis. A minha avó dizia que eu tinha corpo de modelo, por ser alta e super magra. De facto, isso é verdade, mas de que me serve um corpo de modelo com esta cara? Ela tem uma paixão enorme pela dança contemporânea e consegue realizar o seu sonho, andar numa academia de dança. Eu tenho uma paixão enorme pelo violino, mas infelizmente não consigo entrar na academia, devido à situação económica dos meus pais, por isso é que eu ando no liceu com o Mathew. Este é o meu último ano. Depois, sinceramente, não sei o que fazer da minha vida. Mathew é o único de nós os três que quer mesmo aquilo. Sonha em ser médico e salvar vidas. Nota-se nos seus olhos que é o que ele mais quer. Os meus pais deixaram-me frequentar aulas de violino quando era mais nova mas eu nunca tive um e, então, sempre que quero tocar, tenho de pedir à velha professora da pequena escola de música onde andei. É uma hora a pé, mas é um sacrifício que vale a pena. Talvez, passe lá na segunda. Eu não sou daquelas pessoas experientes nesta arte, por isso é que quero muito entrar numa academia, mas é impossível, quando não se tem posses monetárias. Ainda por cima, com a separação dos meus pais, a coisa piora completamente. Por fim, o Mathew, a minha paixão secreta, está completamente apaixonado pela Mia, mas ela ainda está a tentar descobrir o que sente e, talvez não queira estragar a relação deles. Eu amo-o desde o primeiro dia em que o vi, há 14 anos atrás, no jardim de infância. Sei que é demasiado cedo para se começar a gostar de alguém, mas até agora, foi a única pessoa por quem eu me apaixonei, mas ninguém sabe. Consegui manter este segredo durante tantos anos, não sei como, mas consegui. Quando estou com ele, sinto-me outra. É como se me esquecesse de toda a minha existência. é como se a minha vida fosse ele. Mas, quando estou com ele e com a Mia, tudo muda. Eles nasceram para ficar juntos. Não sei porquê que ainda não o fizeram. E eu sou uma idiota por ainda ter esta horrível ponta de esperança de um dia ele vir a olhar para mim com outros olhos e sinta mais do que uma forte amizade por mim. 

Sweet Escape || Dylan O'BrienOpowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz