Capítulo 10

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Todo o ar foi sugado de meus pulmões, e a única coisa que me fazia acreditar que eu ainda respirava, era o cheiro forte de brasas e cinzas. Pois tudo poderia ser um sonho, ou uma alucinação — mas não era —, realmente a sala estava tomada por chamas que não queimavam nada, apenas protegiam o rei.

Kian portava o dom do fogo. Kian tinha magia em suas veias. Kian controlava as chamas. Kian mentiu para mim.

O fogo foi diminuindo aos poucos, deixando o salão quase escuro — as chamas das velas não o iluminavam como as de Kian. Não havia percebido que eu me encontrava sentada no chão, que com o susto eu cai e não tive forças para levantar-me. O pânico já estava me dominando.

Quando Kian recolheu as chamas, a sala estava completamente igual, nenhum móvel queimado ou parede chamuscada, apenas um cheiro forte de cinzas. O jovem rei estava de pé à minha frente, intacto, sem nenhum ferimento. Seu poder destruiu minha flecha de gelo com maestria e precisão, entretanto não queimou nada no salão.

— Atali — a voz de Kian não passou de um sussurro.

Ele caminhou em minha direção se abaixando à minha frente, o rei ergueu a mão em minha direção, isso me fez recuar — praticamente rastejar no chão para me manter longe de seu alcance.

— Não toque em mim — minha voz falhou.

— Atali — ele suplicou. — Não...

— Você mentiu para mim — sussurrei. — Você tem poderes.

— Eu não menti. Vocês não perguntaram — ele deu de ombros despreocupado.

Não consegui pensar em uma resposta. Em menos de segundos meu mundo se desfez, não conseguia encontrar sentido em nada.

— Meu pai está morto — disse para mim mesma. Para me convencer.

— Eu sinto muito — Kian baixou o olhar.

— Não sente — as lágrimas voltarem.

— Eu sinto. E não me importo se não acredita em mim — Kian se pôs de pé. — Nós encontramos seu pai às margens do rio Altais, não menti nessa parte — ele me encarou sério. — Nossos curandeiros fizeram de tudo para tentar salva-lo... Três dias — ele suspirou —, por três dias ele lutou pela vida... A única coisa que ele conseguiu dizer foi que Melina estava reunindo os Pylares dos deuses, que eu deveria ir até você — ele passou as mãos pelo seu cabelo.

— Por favor — minha voz saiu embargada. — Não minta mais.

Eu não iria suportar mais mentiras. Sentia como se estivesse morta, um vazio tão grande que nada poderia preenche-lo.

— Por que eu mentiria agora? — ele se irritou.

— Porque você está mentindo desde que nos conhecemos — vociferei.

Era humilhante estar no chão enquanto ele me olhava de cima. Reuni toda a dignidade que me restou, e me pus de pé.

— Você acabou de tentar me matar, e eu estou lhe dizendo que seu pai disse que Melina está atrás dos Pylares, que... — ele parou de falar enquanto me olhava desconfiado. — Você não está surpresa... Você já sabia — Kian me olhou incrédulo. — Quando ia me contar?

— Quando você começasse a parar de  mentir para mim — o encarei.

— Eu não estou mentindo agora — sua voz estava alterada. — Então me diga, como descobriu?

Pensei em não responder, contudo, não havia razões para continuar com esses jogos. Essa era a hora da verdade. E por mais que eu estivesse abalada, no fundo eu sabia que não teria o que eu queria no fim dessa viagem. No entanto, era como se eu houvesse perdido meu pai duas vezes.

Laços de Gelo e Sangue Where stories live. Discover now