Paris, Belíssima.

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Capítulo I
Paris, belíssima!

As belas paisagens do outono em Praga sempre me vêm à mente enquanto estou na frente do computador, lendo e-mails, buscando informação, tentando esquecer aqueles momentos únicos.
Foi durante aquela época que vivi um romance louco, curto, mas eterno em meus pensamentos e em meu coração. Nada avassalador como em Hollywood, nem mesmo algo fantástico como os clássicos de Hemingway. Simplesmente surgiu...do nada. Tornou-se algo forte aos poucos. Fez-me perceber e amar as coisas que, para muitos, passam despercebidas.
Tudo começou em 2000, no fim do escaldante verão parisiense. É isso mesmo! Paris!... Estava passando uma temporada maravilhosa com minha irmã na Cidade Luz. Ela, que há muito tempo contemplava uma belíssima visão da Torre Eiffel, percebeu meu estado letárgico em Brasília, onde eu trabalhava como um tímido professor de inglês. Prontamente me ligou numa sexta-feira, para me fazer o convite fatal...
- Nossa... Que voz péssima, Yuri... - respondeu ela logo após ouvir o "Alô" monótono de alguém que acabara de ser despertado à força.
- Como você é inconveniente, hein irmãzinha?... Sabe que horas são?
- São dez da manhã, está fazendo um sol belíssimo e eu quero você aqui ainda esse mês para curtir o verão europeu. Vamos, acorde de uma vez!!! - insistiu ela na tentativa de me animar às cinco da manhã. É óbvio que não surtiu tanto efeito, mas aquele convite veio a calhar.
- Como assim, "ainda esse mês"?... Eu trabalho, sabia? Não sou princesa como você, que é sustentada por um pobre marido podre de rico, cheia de "au pairs" para cuidar de seus trigêmeos... (Aqueles pestes!) - pensei, sem me expressar em voz alta.
- É claro e evidente que você vai sair desse mísero cargo e vir para cá. E outra, as passagens já estão compradas. Não quero perdê-las de jeito nenhum!
Fiquei refletindo sobre aquelas palavras, enquanto Ingrid ia tagarelando mais e mais coisas sem que eu desse muita importância. Parecia que ela havia alcançado seu intento, pois confesso que fiquei tentado a realmente ir tirar férias na Europa, algo nunca pensado antes. Acabei aceitando... Por um lado, pela insistência e por outro, pela tentação. Agora teria de cumprir com o combinado... e foi o que fiz.
Duas semanas depois estava eu em Paris, andando de metrô, abismado com a veracidade de tudo o que haviam me dito sobre aquele local fantástico. Ingrid me serviu de guia, mas eu queria mesmo era explorar o local sozinho, sem muita influência. Fiquei encantado em ver que ela ainda permanecia belíssima. Aliás, Ingrid sempre foi muito bonita. Uma irmã adotiva pela qual tenho muito respeito e admiração, apesar de achá-la tão louca quanto eu. Os dez anos na França fizeram-na mais jovial, elegante e requintada. Sua altura (1,80) atraía olhares desejosos e seus ruivos cachos ofuscavam a vista daquelas pálidas e sem graça francesinhas minúsculas. Acho que foi assim que ela conseguiu se casar com um homem rico, educado e simpático.
Meus sobrinhos, os "trigêmeos", estavam mais fofinhos do que nunca. E eram constantemente paparicados pela tropa de babás que viviam pelo belo apartamento na Champes Elisèes, quase de frente para o Arco do Triunfo e para a bela torre símbolo da cidade. O pai ficava todo o tempo em seu escritório cuidando das agências de turismo espalhadas por toda a Paris, além de ter franquias em Lyon e Marseille.
Certa manhã Henri me convidou para visitar a principal agência em Chenevrire sur Marne, centro da cidade velha. O lugar era um estoteante prédio de dois andares, com uma fachada deslumbrantemente barroca. Ele me mostrou todas as salas possíveis e impossíveis, falando como se futuramente eu fosse ser um de seus mais renomados funcionários. Claro que isso já era plano de minha "adorável" irmã. O que ela mais queria era me ver longe do Brasil. Tentou trazer meus pais uma vez, mas os dois só passaram quinze dias com ela e voltaram rapidamente para os trópicos, mais precisamente ao Rio de Janeiro, onde vivem até hoje. Meus dois irmãos mais velhos seguiram carreira militar assim como papai e nem pensam em deixá-la. Querem se aposentar na carreira. Meus outros irmãos ainda são mais novos que eu e nem tão cedo vão sair debaixo das asinhas da mamãe. Apenas Ingrid e eu preferimos encarar a vida de outra forma, desbravando o mundo em nossa volta. Deixando tais lembranças de lado... Amei ter conhecido a agência e percebi que logo iria ser convidado a lá trabalhar. Meu cunhado me deixara bem à vontade para explorar o prédio. Entrei na sala de reserva de passagens e comecei a conversar com uma das funcionárias, uma simpática judia vinda de Milão que apresentava um francês mesclado com o forte sotaque do norte da Itália. Ela me mostrou alguns folders ilustrando fotos belas de capitais da Europa oriental. Não demorou muito para que eu percebesse a encantadora cidade de Praga, na ex-Tchecoslováquia (atual República Tcheca). Que gravuras lindas! Um dos enunciados dizia ser tal cidade a mais romântica e deslumbrante do Leste europeu. Me encantei de cara!
- Gostou, Yuri? - perguntou a moça, assustando-me até.
-Sofia, essa cidade é linda! Fiquei louco para conhecê-la. Como é que eu faço?... -sussurrei.
Henri entrou na sala com Ingrid e a funcionária foi logo falando que eu queria ir para Praga. Eu fiquei murcho de vergonha. Que garota mais metida! Ingrid praticamente obrigou o marido a me colocar no grupo que sairia em três dias para Viena e depois para Praga. Relutei em aceitar para fazer média, mas adorei pela primeira vez as loucuras de minha irmã. Henri me acalmou dizendo que minha entrada no grupo de turistas não iria afetar em nada o pacote.
- Ela é louca! Você sabe... - disse ele em meu ouvido enquanto Ingrid tomava água. -... É por isso que eu sou louco por ela. - finalizou.
Os três dias que antecederam a viagem foram angustiantes, pois estava louco para chegar logo a Praga. Os trigêmeos me irritavam com aqueles choros e aquele bando de babás inúteis só pioravam a situação. Por incrível que pareça comecei a brincar com eles, acalmando-os. As "au pairs" ficaram mortas ao verem que eu sozinho pude dar conta de três meninos manhosos e irritantes. Temendo por seus empregos, me imploraram para que eu fosse descansar um pouco pois a situação já estava "controlada" segundo as mesmas afirmaram. Mas não queria descansar. Fiquei obcecado pela idéia de conhecer aquela cidade outrora tão desconhecida para mim. Olhei algumas fotos de quando minha irmã estava lá durante sua viagem de lua-de-mel. "Estranho", pensei, "ela nunca havia me falado de Praga antes..." Mesmo assim devorei o álbum enquanto as crianças quase adormeciam junto a mim, exaustas de tanto pular e brincar. As babás ainda estáticas e com medo de que eu contasse a Ingrid que foram incapazes de controlá-las.
Finalmente, na noite anterior à viagem, Henri trouxe as passagens. Ele e minha irmã encontraram-me dormindo, rodeado pelos três "mosqueteiros" nos almofadões da sala de estar.
- Yuri!... Chegaram as passagens "cherri". - disse Ingrid toda alegre, acordando-me com o alarde, é claro. Os meninos continuaram imóveis. Henri fez um "psiu" tentando acalmar os ânimos da esposa, para que não acordasse os garotos, mas nem adiantou. Ela me sacudiu carinhosamente, para não dizer o contrário, mostrando-me os bilhetes. Meus olhos brilharam... Henri foi logo dizendo:
- Ela tentou me convencer de que seria uma ótima idéia nós o acompanharmos durante a viagem... - eu estremeci na hora enquanto ele falava, mas graças ao Pai a tensão se tornou alívio quando ele continuou:
- Mas é claro que será muito melhor que você vá sozinho, não é, Ingrid?...- Henri mirou bem nos olhos da esposa.
- É, né?! ... - respondeu ela, sem graça.
- Afinal de contas você precisa sair por aí, conhecer outros locais, fazer novos amigos. O grupo de turistas em que te coloquei é composto basicamente de pessoas da sua idade...-Ingrid interrompeu de repente.
- Só tem velho, Yuri... Um horror!!!
Eu sorri, sem ter muito o que dizer, apenas ouvindo a bobagem dos dois. Não importava para mim se o grupo fosse de velhos ou não. Eu precisava ficar sozinho um pouco. Pensar se ficaria de vez na Europa, cedendo aos caprichos de minha irmã, ou se voltava ao meu adorável país continuando minha vida pacata de sempre. Afinal de contas eu também tinha amigos lá e meu correio eletrônico estava repleto de e-mails deles, principalmente da Kassandra, minha melhor amiga no Brasil. Adoraria que ela estivesse aqui... Mas, tudo bem. Eu poderia passar sem ela por um tempo.
Preparei tudo para viajar no dia seguinte, sentindo que aquela seria uma viagem diferente. Algo estranhíssimo me fazia sentir atraído por aquela "Pérola do Leste", chamada Praga. Fiquei a noite inteira praticamente sem dormir, sentado à varanda, observando carros que iam e vinham pela bela avenida. A Torre estava linda! Imponente e brilhante, assim como tudo ao seu redor. Senti uma pontinha de saudades dos meus pais, dos meus alunos no Brasil, dos amigos, enfim da vida que havia deixado para trás de forma tão precoce... Tudo estava pronto, mas faltava alguma coisa. Não sentia claramente o que era, porque era desconhecido para mim. O que importava agora era aproveitar essa viagem.


Amor em PragaWhere stories live. Discover now