Nós não estávamos prontas para ter uma criança em casa, não estávamos prontas emocionalmente para ser o suporte emocional para alguém que necessitava 100% daquilo. Travor não nos pertencia, assim como não pertencíamos a ele. Sabia que aquela havia sido a primeira discussão de algumas que teríamos, mas aquilo era inevitável.

- Camila. - a chamo delicadamente, beijando sua testa - Babe... - balanço seu corpo e deixo um outro beijo, dessa vez em sua bochecha - Camz...

- Eu já vou... - resmunga e eu esboço um pequeno sorriso.

- Estou fazendo nosso café da manhã, tome um banho e depois venha nos acompanhar... - abre os olhos e pisca algumas vezes, tentando se orientar do lugar em que estava - Travor foi usar o banheiro e logo estará de volta.

- Tudo bem. - dou um passo para trás e vejo Camila se sentar melhor na poltrona e então massagear o pescoço antes de levantar coçando seus olhos - Eu vou usar o banheiro e já volto.

Comecei a preparar o café da manhã e enquanto esperava as torradas ficarem prontas, comecei a fazer o café, parando por alguns instantes para admirar a linda vista do lado de fora. O dia estava lindo demais, perfeito para aproveitar a praia ou simplesmente ficar a beira de piscina, a verdade era: seria um ótimo dia para juntar o pessoal e ir para o casarão.

Travor apareceu e eu prontamente voltei a focar toda a minha atenção naquilo que eu preparava. O garoto sentou no mesmo lugar que havia sentado na noite anterior, podia notar que Travor conseguia parecer ainda mais tenso, como se eu pudesse lhe expulsar a qualquer momento.

- Dormiu bem? - questiono em um fio de voz.

- Seu sofá é mais confortável do que um pedaço de papelão. - fala debochado, me viro e suspiro - Você é sempre tensa assim?

- O quê?

- Você tem uma veia saltando na sua testa e parece que você vai gritar a qualquer momento. - coça a cabeça - Eu não vou roubar nada ou surtar a qualquer momento.

- Não disse ou achei em momento algum que você faria isso. - arqueio as sobrancelhas, tensa com o rumo da conversa.

- Então o que é? - questiona mais uma vez e eu o encaro, sem saber exatamente o que lhe dizer - Não vou ficar aqui para sempre, se essa é a sua preocupação.

Fico em silêncio, me sentindo constrangida por ser pega no pulo ao pensar exatamente aquilo dele.

Eu não conseguia imaginar ser o apoio emocional de alguém com tantos traumas quanto ele poderia ter. Não conseguia me imaginar sendo mãe de alguém que já sabia exatamente o que sentia, tinha um ótimo vocabulário e sabia muito bem andar de um lado para o outro. Soava assustador essa ideia.

- Por mais que a comida seja boa, eu não quero ficar por aqui por mais tempo.

- Se tem tanta pressa de sair daqui, presumo que já saiba para onde vai depois daqui. - coloco o prato com o café da manhã na frente dele - Para onde vai depois daqui?

- Isso não lhe interessa. - seu olhar demonstrava o quão frustrado ele parecia.

- Me interessa quando estou responsável por sua custódia.

- Pela minha custódia? - questiona debochado - Você não é nada minha. Nada.

E mais uma vez ele me deixava completamente sem palavras.

Trocamos um olhar intenso por longos minutos, sem dizer uma única palavra. Cogito todas as leis que estava quebrando naquele momento por ter uma criança em minha casa sem avisar o serviço social e a polícia. Me lembro de quantas leis aquele guarda desgraçado havia quebrado na noite passada, maltratando Travor daquele jeito. Me lembro das palavras de Camila.

Karma - Segunda TemporadaOnde histórias criam vida. Descubra agora