Capítulo 14

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*** ATENÇÃO *** GATILHO *** Contém conteúdo forte  ***

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(continuação do capítulo 13)


Liguei para Raquel.

– Pensei no que você disse. Eu quero escolher sim. Não posso ter um filho agora...

– Você tem certeza?

– Tenho.

– Ok. O remédio custa mil reais. Consegue arrumar esse dinheiro em quanto tempo?

Engoli em seco. Não tinha ideia que era tão caro.

– Vou precisar de alguns dias.

– Certo, só não deixa passar tempo demais senão fica perigoso para você, viu! Você está de quantas semanas?

– Oito, eu acho.

– Bom, eu tenho uma prima que mora em Portugal que fez com esse mesmo tempo de gestação.  Lá, o aborto ou interrupção voluntária da gravidez (IVG), como eles chamam, é legalizado e realizado com apoio médico até a décima semana de gestação. Mas não demora para decidir. Vou te passar o contato da moça que vende os remédios. Se precisar que eu esteja contigo, é só me falar, tá?

– Tá bom. Obrigada, Raquel.

Desliguei o telefone. Meu coração estava leve. A peso da decisão parecia que tinha aliviado a minha angústia de uma forma meio estranha. Estava estranhamente feliz. 

Pensei rapidamente como poderia arrumar o dinheiro. A primeira pessoa que veio na minha cabeça foi Maria. Mas ela não poderia jamais saber para quê eu estava precisando. Precisava de uma mentira.

Em dois dias, após muitas pesquisas na internet, conversar com Raquel e com a Maria, eu estava finalmente com o dinheiro na mão e com a decisão tomada.

Marquei com a moça dos remédios no posto de gasolina na saída da cidade. Estacionei o carro e esperei. Estava ansiosa. Receosa. Nunca tinha feito nada ilegal.

Nisso, uma mulher de aparência um tanto quanto estranha parou do lado da janela do meu carro, com um meio sorriso na boca.

– Boa noite. – disse ela.

– Boa noite – respondi meio secamente, esperando que ela entendesse que eu não estava a fim de papo.

– Sou eu – ela disse, piscando o olho. – Dos remédios.

– Ah... – suspirei aliviada. – Mas a foto do whats... não tem nada a ver...

– A foto é da minha mulher. – dizendo isso ela tira do bolso uma cartela de remédios cortada. Eu pedi 8. Ela queria que eu tomasse 12. A prima da Raquel, que mora em Portugal, usou 4. Mas lá, o aborto até as 10 semanas é um procedimento médico legalizado. Brasil hipócrita.

Peguei a cartela de remédios com as mãos trémulas.

– É quente? Tem certeza? – perguntei, como se adiantasse alguma coisa. – Sabe, mil reais é muita grana, tem que dar certo. Por favor.

– Claro que sim, não se preocupe.

Acenei com a cabeça e entreguei o dinheiro.

Fragmentos de VidaWhere stories live. Discover now