Capítulo 6

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Katrina estava deitada no sofá com um olho semiaberto e outro fechado. Esforçava-se por manter-se acordada. Tomás estava brincando no chão, ao seu lado. Uma piscada e parecia que o mundo do sono e sonhos a sugava com toda a sua força para dentro dele. Alguns segundos depois, ou minutos, Katrina não tinha a certeza, ela forçava-se a abrir pelo menos um dos olhos e ver se Tomás estava bem.

Um cansaço tomava conta de todo o seu ser. Um cansaço profundo. Não tinha energia para nada. Sentia como uma fadiga na alma. E não adiantava o quanto ela dormisse, o cansaço não passava. Tinha vontade de dormir para o resto da vida.

– Mãe... - falou manhosamente Tomás. – Não quero mais brincar sozinho... brinca comigo...

Katrina remexeu-se no sofá e disse pausadamente.

– Amor, a mamãe está tão cansada... Não consigo agora... Pode ser mais tarde?

– Ah, mãe, você está sempre cansada...

– Eu sei, meu anjo, mas é que eu tenho trabalhado muito. Mas prometo que vou melhorar. Deixa só eu descansar mais um pouquinho, por favor.

– Quero ver televisão, então...

– Tudo bem... liga a tv então e daqui a pouco a gente faz algo juntos, está bem...?

Assim que ele começou a ver um desenho qualquer na televisão, Katrina permitiu-se mergulhar num profundo sono sem sonhos.

Os dias ultimamente passavam-se assim. Katrina sentia uma enorme letargia em todo o seu ser. Mexia-se apenas por questões de sobrevivência. Quando precisava alimentar o Tomás ou realizar alguma obrigação da casa ou do trabalho. Deixava tudo para o último minuto e estava sempre atrasada, na correria e "sem tempo" para nada. E o pior de tudo. Sentia-se extremamente culpada. Sentia-se a pior mãe do mundo.

À noite, quando finalmente ia se deitar para dormir o sono que a acompanhara durante todo o dia, simplesmente desaparecia. Ficava com a mente desperta, com o cérebro com mil pensamentos por minuto. Para anestesiar-se ficava olhando as redes sociais ou assistindo um filme na Netflix, dois ou três... ou maratonando alguma série besta. Quando se dava conta, eram altas horas na madrugada e nada de dormir. E, no dia seguinte, acordava ainda mais cansada.

Katrina sempre tivera momentos depressivos em períodos distintos da vida, mas sempre conseguia encontrar algo que a fizesse sair desse estado de autopiedade ou vitimismo. Ou as amigas a chamavam para sair, ou planejava uma viagem, ou arrumava um novo trabalho. Qualquer coisa. Mas agora, cuidando inteiramente sozinha do Tomás, não sobrava grana para pagar uma babá para sair muitas vezes, quem dirá uma viagem... Sentia-se afundando cada vez mais. Numa tristeza, que não era bem tristeza. Era como se a vida tivesse perdido o brilho. Como se nada fizesse sentido. E como se ela não tivesse energia nem vontade de viver.

Certo dia, em uma de suas tentativas frustradas de sair do estado letárgico que se encontrava, combinou de ir no parquinho com Tomás para que ele andasse de bicicleta. Ao colocar a bike no bagageiro do carro, a sua coluna travou. Foi uma dor fulminante que a deixou sem ar. Katrina deu um grito e ficou abaixada, tentando respirar. Tomás tomou um susto e ficou olhando para ela, sem saber bem o que fazer. Katrina respirava devagar. Ou tentava respirar.

– Filho, pega a minha bolsa aqui no chão, por favor. – pediu.

– O que você tem mãe? – perguntou baixinho.

– As minhas costas travaram. Está doendo muito. Vou ligar para a sua avó vir me ajudar. Acho que vamos deixar o passeio para outro dia, está bem?

Tomás assentiu com a cabeça. Via-se no seu olhar que estava preocupado. Ela sorriu, agradecida. Tinha um filho maravilhoso. Esperto, carinhoso. Ele estava passando por processos emocionais fortes, sem dúvida, principalmente com a dor do abandono do pai. Mas era um menino sagaz e muito parceiro.

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