Vida longa ao rei

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Cinco minutos é muito pouco tempo para se ter uma epifania em relação à vida, a morte e tudo mais.

Também é muito pouco tempo para entender seu propósito como ser vivo ou qualquer uma dessas coisas que as pessoas buscam durante toda a vida para que possam morrer em paz e sem arrependimentos. Na verdade, uma vida toda já é muito pouco tempo para uma coisa dessas, imagine cinco minutos.

Em teoria, um miojo fica pronto em três. Mesmo assim, é necessário colocar o miojo no prato. Colocar o tempero. Misturar a droga do tempero feito de sal puro e rezar para que aquilo não te mate intoxicado. Quando se termina todo esse ritual, já se passou mais de cinco minutos, e ainda por cima existe o alto risco de arrependimento por ter colocado o maldito do tempero, já que ele é muito ruim, mas mesmo assim você sempre acaba colocando. 

E apesar de todas essas provas irrefutáveis de que cinco minutos não é tempo suficiente para nada, esse era exatamente o prazo que Ulukie tinha para ficar bem consigo mesmo antes de morrer.

Ao menos, ele estava em um lugar daora para morrer, não era? Frank havia o pegado no colo e entrado no primeiro lugar vazio que tinha encontrado, já que Ulukie estava passando mal o suficiente para se ter certeza de que morrer agonizando com uma plateia de mais de mil pessoas era algo muito provável de se acontecer, e não era como se nenhum dos dois quisesse algo assim. Agora, estavam sentados no chão de um banheiro público surpreendentemente limpo, Frank em um estado de desespero silencioso bastante compreensível e Ulukie pálido como um papel, sentindo uma dor terrível no peito e vomitando sangue ocasionalmente. Ambos calados. 

- Tinha esse cara, né - Ulukie começou, depois de alguns segundos de silêncio desconfortável, olhando para o pinguim muito feio que tinha ganhado do estagiário. Olhar a feiura do boneco estava lhe acalmando um pouco, e era uma boa alternativa para se evitar olhar nos olhos de Frank. - Antes de tu entrar no departamento e tal. O nome dele era Juno e ele meio que via o futuro de uma forma esquisita lá. Aí, uma vez, ele disse que quando se tratava de mim, parecia que tipo, tinha duas linhas do tempo, pois ao que parece alguém estava tentando mudar o curso das coisas de um jeito onipotente e bizarro. Na hora eu não liguei muito né? Eu era criança e criança não entende porra de nada. Aí - Deu uma pausa, tossindo um pouco e estremecendo. Gesticulava com as mãos de forma que o fazia parecer meio doido, e talvez realmente estivesse ficando, já que quase conseguia ouvir o barulho do cronômetro contando os segundos, mesmo que tal barulho não existisse. Se obrigou a voltar a falar. - Aí eu meio que deixei isso de lado. E agora, eu pensei nisso de novo, e comecei a achar que talvez essa pessoa seja o narrador do demônio lá. Talvez eu esteja no meio dessa merda de formas mais complexas do que eu pensei que eu estaria, Frank, e talvez esse filho da puta esteja mexendo com o pesadelo que é a minha vida de formas mais complexas do que eu pensei que ele mexeria. Talvez eu não fosse morrer na linha do tempo original, mas ele precisou mudar esse fato para colaborar com algum subplot ridículo que vá fazer ele livrar a própria pele de ser pego. Talvez um meteoro caia na minha cabeça agora e eu nem morra por conta dessa maldição de bosta, e o filho da puta vai tá lá, no vácuo da existência ou seja lá como se chama o lugar onde entidades onipresentes ficam, rindo para um caralho da minha falta de sorte e da minha desgraça, já que tudo vai ser uma piada pra ele.

Frank o olhou. Ele puxou Ulukie pro colo e o abraçou por trás, apertando forte e colocando o queixo em seu ombro. O que ele podia fazer ou dizer em relação a uma coisa daquelas? Que iria ficar tudo bem? As coisas nunca ficam bem por tempo o suficiente. O que se faz quando se sabe que as pessoas vão morrer e que tem alguém por trás de tudo lhes fazendo de marionete mas que não impede que coisas como essas aconteçam? Se existe realmente um ser superior com poder para mudar o curso das coisas, porque diabos o curso das coisas tem que ser tão sofrido?

Demônios, maldições, e todas essas coisas que jovens gostam.Where stories live. Discover now