Casamentos, aniversários e funerais

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AVISO: ESSE CAPÍTULO PODE CONTER CONTEÚDO SENSÍVEL.

Alhena acordou às duas da manhã daquele domingo, dispensando qualquer criado ou ser vivo que resolvesse ajudá-la a se arrumar para o casamento.

É claro, houve uma grande comoção em volta dessa decisão. Era um dia importante e ela precisava estar completamente impecável, pois todo um futuro político e teoricamente pacífico dependia de que esse casamento fosse perfeito. Mesmo assim, ela conseguiu o direito de se arrumar sozinha, depois de muita briga e ameaças de faca.

Ela tomou um banho demorado, penteou os cabelos curtos e castanhos, e se encarou no espelho não tão chique quanto os do palácio de seu noivo, mas chique o suficiente. Fez uma maquiagem qualquer, mas bonita o bastante para não acharem que havia feito de qualquer jeito por não estar nenhum pouco empolgada com o evento. Ela estava empolgada? Não, mas não precisavam saber disso.

Depois, vestiu o bendito do vestido comprido e cor de creme, com todos os babados, renda e detalhinhos minuciosos que não seriam vistos por quase ninguém, mas mesmo assim eram importantes, por algum motivo que Alhena não sabia bem. Ao menos estava bonita, ou algo perto disso. Colocou a tiara coberta por florezinhas da mesma cor de sua roupa, que era acompanhada de um véu nem comprido nem longo demais, e pensou que talvez, talvez ela pudesse parecer um pouco com uma futura rainha.

Depois de terminar de se arrumar, pegou suas duas adagas preferidas e as prendeu rente às coxas, debaixo da anágua do vestido extremamente elaborado. Ela estava indo para o território dos Diberkati, e apesar de toda a farsa de amigos da vizinhança a qual o rei precedente havia se esforçado para pintar, ela não era louca ou inocente o suficiente para ir até lá sem ao menos uma lâmina. Aquela cerimônia era como um contrato de paz, mas todo o reino dos Merah sabia que paz para os de sangue azul era o mesmo que uma lenda contada para crianças dormirem tranquilas e terem esperança na vida.

E Alhena não dormia tranquila desde que foi prometida à casamento com o futuro rei vizinho.

Ela tinha seus motivos, além da paranoia insistente de que iriam cortar seu pescoço antes de seus primeiros dois meses de estadia no palácio dos Diberkati, já que era exatamente isso que haviam feito durante os últimos milênios com todo o seu povo. O sangue dela era vermelho, o que, segundo a galera do reino em que ela passaria a morar de hoje em diante, fazia dela uma ladra mercenária de poderes. O seu noivo e todo o povo dele tinham o sangue de cor azulada, e poderes elementais, os quais ela não tinha, mas podia ter; Caso um dia ela matasse um de sangue azul, conseguiria usufruir de seus poderes por algumas horas.

Isso explicava bem o motivo para os reinos se manterem separados e o porquê esse casamento ser uma péssima ideia, mesmo que que no papel significasse o fim das guerras, chacinas e invasões de território.

Alhena suspirou, e logo saiu de seu quarto. Desceu a longa escadaria de mármore, fazendo questão de arranhar o piso e bater nos degraus com seus saltos baixos e cor bege. Era o último dia dela ali, e mesmo que fosse de madrugada, a mulher fazia questão de que marcasse sua presença ao menos uma última vez no lugar onde viveu pelos seus últimos vinte e três anos.

Alguns empregados a encaravam, e finalmente abriram o portão da frente para ela. Lá já tinha uma carruagem lhe esperando, sendo levada por quatro cavalos escuros como a noite dos cascos até às cristas. Andrômeda, irmã mais nova de Alhena, já estava sentada na carruagem; usava seu vestido amarelo e florido, uma meia calça escura e sapatilhas também amarelas, com seu cabelo castanho comprido trançado de forma esquisita. Os pais delas já haviam ido para o local da cerimônia antes das duas da manhã, para manter as aparências e ter certeza de que aquilo era seguro, e não um golpe de estado, portanto agora estavam indo sozinhas.

Demônios, maldições, e todas essas coisas que jovens gostam.Onde as histórias ganham vida. Descobre agora