Cap 16

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Depois de ter dito isso, não consigo mais encara-la. Ela pode interpretar essa frase de mil maneiras diferente, mas nunca vai saber o que de fato eu quis dizer. Um silencio constrangedor paira na mesa, quando Haymitch pigarreia e volta ao foco de nossa "reunião".

— Bom, então. Bom, bom, bom. Katniss, não há garantias de que haverá arcos e flechas na arena, mas durante sua sessão particular com os idealizadores, mostre a eles o que sabe fazer. Até lá, fique longe do arco. Você é boa em armadilhas?

— Conheço algumas básicas — murmura.

— Isso pode ser significante em termos de comida — diz Haymitch. — E Peeta, ela está certa, nunca subestime força na arena. Muito frequentemente, força física dá vantagem para um jogador. No Centro de Treinamento eles terão pesos, mas não revele quanto você consegue levantar na frente dos outros tributos. O plano é o mesmo para ambos. Vocês vão para o treinamento em grupo. Passem o dia tentando aprender algo que não saibam. Jogar uma lança. Girar um cetro. Aprender a dar um nó decente. Guardem o que sabem melhor até suas sessões particulares. Estamos entendidos?

Katniss e eu concordamos.

— Uma última coisa. Em público, quero vocês ao lado do outro o tempo todo — diz Haymitch.

Ambos começamos a nos opor, pois por mais que eu adoraria isso, não é justo forçar Katniss a fazer algo que ela não quer. Mas Haymitch bate sua mão na mesa.

— O tempo todo! Não está aberto à discussão! Vocês concordaram em fazer o que eu disser! Vocês ficarão juntos, parecerão amáveis um com o outro. Agora caiam fora. Encontrem Effie no elevador às dez para o treinamento.

Katniss levanta sem dizer uma palavra e sai para o corredor, indo na direção de seu quarto. Eu me levanto com o intuito de ir atrás dela e pedir desculpas, ou qualquer outra coisa, mas paro, quando escuto a porta de seu quarto bater com força. Sigo então em direção ao meu quarto, frustrado mais uma vez pelo rumo que nossa conversa tomou. Mas ao mesmo tempo, sinto uma espécie de contentamento, afinal, Katniss também sabe coisas a meu respeito. Os sacos de farinha, a luta. Será que ela também me observava esse tempo todo?

Já são quase dez horas, então eu escovo os dentes, e tento não pensar sobre a difícil tarefa que terei pela frente.  Encontro Effie agitada nos esperando, logo Katniss chega, entramos no elevador e descemos para o centro de treinamento.

O centro fica abaixo do térreo de nossa torre. Quando as portas se abrem, me deparo com uma espécie de ginásio, enorme, cheio de armas e outras coisas como cordas, uma mini floresta... Percebo que todos os tributos já estão lá, e mais uma vez somos o centro das atenções, pois todos se viraram para nos olhar.  Se já não bastasse nosso atraso, Katniss e eu somos os únicos com roupas iguais. Com certeza não geramos uma boa impressão sobre os tributos também. Alguém aparece e gruda em minhas costas um quadrado com o número 12. Fazem o mesmo com Katniss. Quando nos juntamos aos outros tributos, a treinadora começa a explicar o cronograma de treinamento. Especialistas de cada habilidade vão ficar em suas estações. Ficaremos livres para viajar de área para área conforme desejarmos, conforme as instruções de nossos mentores. Algumas das estações ensinam técnicas de sobrevivências, outras, técnicas de luta. Estamos proibidos de nos envolver em qualquer exercício de combate com outro tributo. Há assistentes por perto se quisermos praticar com um parceiro.

Minha atenção voa em direção a Katniss que parece assustada, depois olho tributo por tributo, um a um. Os tributos masculinos dos distritos 1 e 2, os carreiristas, que desde pequenos começam a ser treinados, e se voluntariam para a colheita, me metem medo, particularmente. O tributo do 11 também, pois ele parece ser extremamente forte. Tirando esses, quase todos parecem ser bem mais novos, e eu fico pensando se alguém teria mesmo coragem de matar essas pobres crianças assustadas. Eu mesmo respondo a minha pergunta, pois sei que a resposta é sim. Dentre as garotas, Katniss tem alguma vantagem, pois ela certamente está entre as mais fortes aparentemente. A comida da floresta deve ter os seus benefícios.

Quando a treinadora termina as instruções, os tributos começam a se dispersar, e eu percebo que os tributos carreiristas, nos olham com ar de desdém, como se nós fossemos a caça e eles os predadores. Mas nossa situação é realmente essa. Eles se dirigem as armas mais perigosas, algumas que eu nunca tinha visto e as manuseiam com facilidade. Cutuco o braço de Katniss, que também está olhando para eles. Ela se sobressalta ao meu toque, provavelmente esquecendo que eu ainda estava ao seu lado, conforme as instruções de Haymitch.

— Onde gostaria de começar?  - pergunto.

Ela olha ao redor, desde os carreiristas se exibindo, até os que provavelmente estão pegando numa faca pela primeira vez.

— Suponho que devamos dar alguns nós — ela diz.

— Está certíssima — concordo.

A estação de nós está vazia, e o professor fica bem feliz em ter alunos. Katniss, mostra que tem uma boa noção sobre armadilhas, mas o professor nos ensina uma que ela ainda não domina, e ficamos ali pelo menos uma hora até ambos termos aprendido corretamente.

Sugiro então ir até a estação de camuflagem, que está vazia. É hora de mostrar que eu sei fazer pelo menos alguma coisa, mesmo que seja inútil em um jogo de vida ou morte. Começo a fazer uma combinação de lama, argila, suco de amora, vou passando em meu braço, e teço um belo disfarce de folhas. O treinador fica bem empolgado com meu trabalho.

— Eu faço os bolos — admito para Katniss.

— Os bolos? — ela pergunta, distraída. — Que bolos?

— Em casa. Os de pasta americana, para a padaria — digo.

Ela olha mais atentamente para o disfarce em meu braço, e fica pensativa.

— É adorável. Se ao menos você pudesse cobrir alguém de açúcar cristalizado até a morte — ela solta num tom um tanto irritado.

Sou pego de surpresa, afinal o que eu fiz agora para ela me tratar assim?

— Não seja tão superior. Nunca se pode supor o que você encontrará na arena. Digamos que é realmente um bolo gigante... — começo, ofendido, mesmo sabendo que o que ela disse é verdade.

— Digamos que vamos para o próximo assunto — ela me interrompe impassível.

Os três dias seguintes, se resumiram a Katniss andando ao meu lado sem dizer uma palavra, sem me olhar, sem parecer notar que eu estava ali o tempo todo. Mas nesses dias, aprendemos algumas coisas bem valiosas também, como acender fogueiras, atirar facas, e até montar abrigos. Katniss se sobressaiu nos testes de plantas comestíveis. Dádivas de conhecer a floresta, acredito. E eu, para minha surpresa, me sai bem, na medida do possível, em combate corpo-a-corpo. Porém guardamos nossas melhores habilidades para as apresentações individuais. Katniss sabe usar muito bem um arco e flecha, mas levantamento de peso pode mesmo ser considerado uma habilidade?

Eu me pego pensando mais uma vez, que eu serei tão inútil para Katniss, quanto a garotinha do 11.

Depois de ver todos os tributos em ação, o peso de finalmente entender que só a minha extrema vontade de salvar Katniss, não vai salvá-la, cai sobre mim. Preciso de um plano. Preciso de uma saída. Essa constatação me deixa em estado de total desespero. E nada do que eu faça, vai ser capaz de tirar da minha mente o peso de saber que Katniss pode morrer por minha incapacidade de poder ajuda-la.


Jogos Vorazes - Peeta MellarkOnde as histórias ganham vida. Descobre agora