I

55 5 1
                                    

    O ônibus se movia tão rápido que as árvores que ele olhava através dos vidros se transformavam num emaranhado de formas verdes e marrons, o movimento do ônibus era um pouco incomodante e fazia com que ele tivesse que se arrumar no banco de vez em quando, ele tentou olhar para o motorista do outro lado da grade protegida, mas não teve visão, sentia o chão do ônibus na vibração do movimento, o veículo estava muito rápido, pelo menos era o que parecia para ele, devia estar a uns 80km/h, o que era excessivo passando por um desfiladeiro como eles estavam. Ele olhou novamente pelas janelas vendo o clima com uma névoa úmida azulada um pouco distante caído por todo o desfiladeiro e o impedindo de ver seu fim, a descida era quase totalmente vertical com centenas se não milhares de árvores se equilibrando com as fortes raízes cravadas dentro da terra. Ele olhou um pouco para cima tentando ver o céu do início da tarde, mas a neblina não permitiu, vendo apenas o véu azulado que era a neblina.

    Ele ficou algum tempo olhando a paisagem tentando esquecer, mas o pensamento que eles estavam indo muito rápido não saia da sua cabeça, ele olhou em volta dentro do ônibus procurando outra expressão nos rostos que também demonstrasse preocupação como a dele. Contando com ele havia nove pessoas dentro do ônibus, o motorista a frente do ônibus dirigindo, dois guardas que estavam para o outro lado da proteção de ferro, e mais cinco pessoas como ele, presos, julgados e condenados a cadeia, usando roupas laranjas e sentados cada um em seu banco, dois presos dormiam encostados nos bancos, um desses roncava alto, outros dois estavam simplesmente olhando para fora vendo a paisagem, o último estava olhando para ele, um homem robusto e careca com uma notória tatuagem do lado do rosto sendo uma cruz de ponta cabeça com duas mãos a envolvendo, o homem tinha um olhar carrancudo e parecia estar querendo iniciar uma briga, mas não o fez, apenas deixou de olhar para ele se concentrando em outra coisa. Olhou para os guardas do outro lado da proteção, um deles dormia com o boné colocado sobre o rosto e com o cassetete sobre o peito, o outro se mantinha volte e meia olhando para fora e volte e meia olhando para os presidiários com um olhar frio de autoridade.

    O presidiário preocupado bufou e virou para olhar novamente para o lado de fora, no peito de sua roupa havia a sua identificação com número 217237 e nome ao lado Camdem P. Hollowey, fato que ele próprio nunca entendeu, afinal de contas se eles já tinham o número de identificação por que razão ter o nome do detendo também? Mas ele havia descoberto que na prisão que estava sendo encaminhado não haveria nome nas roupas, apenas o número de identificação, esse que seria mudado por outro e Camdem nunca mais seria o 217237. Enquanto olhava para fora o pensamento do ônibus estar indo muito rápido veio a ele novamente, pensou novamente se não estaria exagerando, se não estaria com algum trauma com acidentes que nunca antes havia se manifestado, afinal desde o evento que o levou a ser preso ele nunca mais andou em um veículo. Não, o ônibus estava sim muito rápido, e parecia que só ele notava isso, olhou para o desfiladeiro abaixo vendo toda a queda que teriam que enfrentar em caso de acidente, não suportando o seu instinto de que algo iria acontecer se a velocidade não fosse baixada Camdem se levantou.

– Pare ai mesmo detento – disse o guarda que estava acordado quando percebeu que Camdem andava pelo apertado corredor do ônibus em direção a eles – eu disse para parar – exclamou com certa fúria quando percebeu que o presidiário continuava indo em sua direção – pare ai mesmo – falou quase gritando batendo o cassetete na proteção acordando seu colega.

– O ônibus está muito rápido – disse Camdem ainda se movendo.

– Do que está falando, sente-se detento – mas o presidiário não parou.

– Sente-se logo desgraçado – exclamou o colega recém acordado com tom menos autoritário.

– Tem que falar para o mo...

    Mas antes de concluir sua frase Camdem sentiu um forte impacto jogar ele contra o lado esquerdo do ônibus, fazendo ele bater com toda força na janela que emitiu o som abafado de carne contra vidro, mal conseguiu ouvir outros sons de impacto e novamente sentiu a gravidade o jogar contra o outro lado do ônibus, grunhiu baixinho sentindo as costas doerem por completo com o novo impacto, novamente a gravidade parecia ter se modificado e ele voou para o outro lado do ônibus batendo nos bancos de ferro e estofado antes de encontrar o teto do ônibus contra seu peitoral, sons de metal sendo retorcidos foram ouvidos antes de novamente ser jogado para o outro lado, mas dessa vez sentiu apenas um leve choque em sua cabeça e viu o mundo ficar preto...

Pedras Não Temem a Noite (CANCELADA)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora