8- Mia

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Corpos em lixeiras não era tão incomum, na verdade, era a primeira ideia de se desfazer de um corpo para um assassino. Na minha curta carreira como investigadora forense, já me deparei com casos mais complicados. Uma vez, em especial, um assassino atirou um casal de modelos nus do quinquagésimo andar de um prédio na Magnificent Mile, — o coração de Chicago, onde o turismo e o comércio era pulsante. A ideia da obra dele era pintar seus modelos não apenas nus, mas também mortos. Quero dizer, pode ser mais doentio que isso?

—Olha o passarinho! — exclamou o John.

John Taylor era o fotógrafo forense, ele mirava as lentes da sua câmera com a precisão de um cirurgião, escolhendo os ângulos certos para que mais tarde pudesse ajudar na reconstituição do crime. O perito chefe, sr. Smith, estava colhendo evidências e conversando com os investigadores criminais. Eu fazia um exame perinecroscópico, ou seja, analisando externamente o cadáver e o que estava ao seu redor. Vasculhei os bolsos da vítima, a fim de descobrir se estava com os documentos, mas a ausência deles não era uma surpresa também. Outra característica famosa dos assassinos, era o fato de dificultar o trabalho da perícia no reconhecimento da vítima. Isso garantia que tivessem tempo para limpar o local do crime, ou até mesmo fugir da cidade, alguns se ocupavam em buscar um álibi. Outra vez, era um padrão, algo tão corriqueiro que não nos surpreendiam mais.

— Homem branco, por volta dos 40 anos, estatura mediana... — descrevi a aparência física da vítima e o estado que estava, enquanto sr. Smith tomava notas.

O fato do corpo não estar no local do crime dificultava o trabalho, pois qualquer evidência estava comprometida. Tínhamos que ser mais do que minuciosos na hora de analisar o contexto completo.

No laboratório saberíamos aproximadamente o horário da morte, como morreu, quem era — através do reconhecimento das digitais, ou do DNA —, começaríamos a interrogar os suspeitos com a ajuda dos investigadores criminais, e buscar o local do crime, ou a cena do assassinato.

Lauren e Montevista chegaram para retirar o corpo. Continuamos no local, varrendo minuciosamente qualquer coisa que pudesse nos auxiliar para desvendar aquele caso. Os policiais colheram o depoimento de possíveis testemunhas, e isso era apenas uma parte do trabalho. Coletei fios de cabelos — que não necessariamente me seriam úteis —, fibras de, provavelmente, algodão, que seria de alguma peça de roupa, e por último algumas lascas que pareciam de madeira, que poderia ajudar a localizar a arma do crime. Enfim, na perícia tudo se resumia em talvez, que com muito trabalho, perfeccionista de dezenas de funcionários competentes, poderíamos solucionar mais um homicídio.

Fechei minha maleta de utilidades e esperei até que Alec Smith, nosso chefe, nos liberasse para irmos para o laboratório. John era um bobão, sempre fazendo piadas de tudo. Às vezes podia soar de mau gosto, mas eu sabia que ele não fazia por mal. Era tão espontâneo quanto eu, mas acho que no caso dele alguns parafusos faltavam em sua noção de vez em quando.

Fomos todos no mesmo carro. Smith conduzia e John estava no banco do passageiro, eu no banco de trás. Eles falavam de algum assunto aleatório, sobre tempo ou futebol e eu estava mais concentrada em mexer no meu celular e responder as dúzias de mensagens que Matthew me mandava.

Em outra época, eu estaria inclinada no meio, entre os dois bancos, tentando assiduamente participar da conversa. Tinha que concordar com Matthew, aquela Amélia era impertinente. Em minha defesa, eu me sentia totalmente à deriva aqui, tentando criar um círculo de amigos, ou qualquer coisa que me deixasse menos solitária. E esse sentimento de estar num barquinho sozinha no meio do oceano me assustava tanto, que eu não tinha qualquer grama de amor próprio. Sempre achando que era necessário alguém me amar para minha vida valer a pena.

PulsarWhere stories live. Discover now