Desabrochar, por @AnaBeatrizMineu

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Capítulo Um: Ervas Daninhas


4° Motivo da Rosa - Cecília Meireles

"Não te aflijas com a pétala que voa:

também é ser, deixar de ser assim.

Rosas verá, só de cinzas franzida,

mortas, intactas pelo teu jardim.

Eu deixo aroma até nos meus espinhos

ao longe, o vento vai falando de mim.

E por perder-me é que vão me lembrando,

por desfolhar-me é que não tenho fim."


Eu não tenho ideia de como foi que o caos que é a minha vida se materializou no meu jardim, mas basta espiar entre as frestas das cortinas para receber este amigável lembrete.

Eu estaria mentindo se dissesse que tentei, depois que ele partiu, levando minha menina, cuidar das orquídeas ou das bromélias... O fato é que eu mal levantava sequer para me alimentar.

Isso só durou alguns meses, juro. Infelizmente, quando me dei conta de que havia um mundo além das minhas pequenas janelas e pesadas cortinas, os galhos e o mato já haviam me rodeado a tal ponto que eu não fazia ideia de como me livrar deles.

Basicamente, eu vivo cercada pela minha própria incompetência. Deixei que as ervas daninhas crescessem dentro e fora de mim, amargurada porque perdera o homem e a família que amava.

Não deveria ser uma grande surpresa para mim, quando arrisquei uma olhadela pela janela hoje cedo e vi o locador, seu Biné, salteando por entre os galhos retorcidos em direção à porta, com uma maleta a tiracolo, dessas que os homens sérios carregam para cima e para baixo.

Seu olhar traduzia más notícias; para mim, é claro.

Vi seu Biné tocar a campainha e tirar do bolso um lencinho, que apertou sobre a testa enquanto torcia os lábios para o labirinto que acabara de atravessar.

- Bom dia, seu Biné! - Eu abri a porta oferecendo meu melhor sorriso.

Ele respondeu com um sorriso também, sentou no sofá e aceitou de bom grado o suco de laranja que levei.

- A casa está em um estado mais que razoável, - disse ele, saboreando os biscoitinhos de acompanhamento. - Dá até para dizer que está melhor que quando seu Marcos e a menina moravam aqui; mas o jardim...

Eu dei um sorriso culpado e encolhi os ombros.

Nunca liguei muito para o jardim, era o Marcos quem gostava de regar, podar e conversar com as plantas. Sempre achei a maior besteira, mas admirava isso nele. Sentia saudade disso; de como ele costumava cuidar do meu jardim por mim.

Seu Biné pôs o copo sobre a mesa, ignorando o porta-copos à direita dele. Tive que conter o impulso de colocá-lo eu mesma e segurei meu próprio punho sobre as pernas enquanto observei-o abrir a pasta sobre o colo e retirar alguns papéis de lá.

- Sabe, não me alegra nem um pouco ter que dizer isto, dona Helô...

Ótimo. Não basta o tom de "você está ferrada" desta conversa, eu ainda tenho que ouvir tamanho velho me chamando de "dona"!

Os Quatro AmoresDove le storie prendono vita. Scoprilo ora