Para Descobrir o Amor, por @LygiaCSantiago

172 18 4
                                    

O apartamento tinha ares de sujeira e desordem, mesmo quando James Camden se empenhava em limpá-lo e colocar todas as posses em seus respectivos lugares. Devia ser culpa do papel de parede descascado e manchado de fuligem, ou do piso de aspecto envelhecido e dos cantos mal iluminados.

Se os planos de James se dessem como ele queria, dentro de um ano — ou um pouco mais — ele compraria o próprio jornal. Não um noticiário de pouca credibilidade, mas um que já tivesse algum nome no mercado. Em pouco tempo, ganharia mais dinheiro do que poderia contar. Para o seu futuro via a si mesmo como um senhor de suíças brancas, com uma grande barriga que o antecedesse, em uma casa maior e mais limpa, uma boa xícara de café com conhaque ao seu lado e um charuto malcheiroso entre os dedos. A casa maior serviria de conforto para alguma amante que ele tivesse, já que não tinha o casamento como plano. James também não tinha especial apreço ao excesso de peso no próprio corpo e poderia dizer que odiava charutos, mas a imagem de um jornalista de sucesso estava muito gravada em sua mente para que pensasse em si de modo distinto.

Na falta do jornal, do casarão e do charuto, era o único responsável por si. Não fazia questão de criados ou de cozinheira. Dormindo naquela espelunca, seria difícil encontrar espaço para outra pessoa que não ele.
Pelo menos era o que pensava até encontrar Kathy. Katherine era um nome muito grande para uma criatura tão miúda. Ela concordava com isso, já que jamais se apresentava com toda sua alcunha. Era Farley para os desconhecidos, os íntimos a chamavam de Kathy. James se julgava íntimo, já que ela estava deitada de bruços na sua cama, inteiramente nua, deixando que ele depositasse beijos suaves por toda a extensão da coluna dela, a coisa mais limpa dentre aquelas paredes.

— Por que você não fica só essa noite?

— Você sabe o porquê.

Ela se virou, fazendo-o encarar aqueles olhos azuis e a boca miúda que ele não conseguiu deixar de beijar. Beijou também a ponta do nariz pequeno e arrebitado, antes de pousar os lábios na testa dela.

Não entendia como aquela beldade não fora descoberta por nenhum dos homens da redação antes — não que tivesse certeza quanto a isso. Se ela era virgem quando o conheceu, James não sabia. O que sabia é que os dois trocavam olhares longos entre as mesas de trabalho, pelo menos quando ela não o repreendia por um período mal escrito ou um erro ortográfico tolo.

No dia em que ele se oferecera para acompanhá-la até sua casa, sob o argumento de que uma senhorita não deveria andar sozinha pela rua depois de trabalhar até tão tarde, ela o fez rir com a resposta de que maior perigo ela enfrentava se estivesse ao lado dele. Ele estava há apenas um mês no jornal, enquanto ela parecia estar ali desde sempre. As semanas se foram passando entre as repreensões dela quanto a sua escrita, além de sutis sugestões de matérias que, vez por outra, eram por ele acatadas.

Depois de seis meses, fora a vez de ela o pedir para acompanhá-lo. Foi apenas um passo para que os dois chegassem à cama. James fora cuidadoso na primeira vez dos dois juntos, por mais que ela tivesse praticamente se jogado em seu pescoço quando as portas daquele apartamento mequetrefe se fecharam com os dois lá dentro. Tirá-la do seu feio vestido havia sido como descobrir o mais caro dos presentes embrulhado em um saco de batatas.
Se dependesse de Kathy, ela ficaria embrenhada nos lençóis, que cheiravam a limpo, e no corpo de James pelo resto da noite. Teria que ir para a própria casa, ajudar a irmã a cuidar das crianças e prestar atenção para que a mãe tivesse se alimentado bem antes de ir para a cama e finalmente dormir — o que estava prestes a fazer sob os beijos dele, se não fosse sua voz a chama-la de volta.

Não se incomodava com o aspecto malcuidado do apartamento, apesar de não fazer muito sentido que um homem como ele morasse em um lugar tão pouco apresentável. Não que James fosse rico, mas teria condições de manter uma boa casa com, no mínimo, um criado e uma cozinheira. Entendia que ele quisesse economizar para, um dia, comprar o próprio jornal. Talvez ela própria pagasse por uma cozinheira ou outra criada se tivesse dinheiro para tal, mas este não era o caso.

Os Quatro AmoresOnde as histórias ganham vida. Descobre agora