Feliz encontro

5 1 0
                                    

Os imensos pinheiros estavam cobertos de neve e suas poucas folhas deixavam um frescor no ar. O vento fraco parecia piedoso ao deixar as folhas em seus galhos. O dia era claro, quase ofuscante, embora o sol não estivesse visível. Uma vegetação rasteira se alastrava pelo vale, salpicando a neve aqui e ali. Amontoados de neves, folhas e galhos estavam por toda parte. Invérnia era um lugar calmo e praticamente inabitado. Um sonho para qualquer caçador.

A elfa noturna aguardava atrás da árvore, imóvel como se fosse um galho da mesma, o manto amarronzado contra o frondoso tronco que descascava. Os olhos brilhavam serenamente, emoldurados por um rosto lilás encapuzado. Encarava atentamente um pequeno arbusto a poucos metros de onde estava. A respiração era quase inexistente, tamanha a concentração. Um movimento sacudiu o arbusto. Uma vez. Duas vezes. A caçadora se permitiu um leve sorriso quando viu uma pequena raposa branca correr para fora da vegetação. Era um filhote de raposa de Invérnia. Essa, especificamente era a mais esplêndida que já vira, pois possuía as ponta das paras negras. Seria aquela mesma. Ninde iria domá-la.

A caçadora hesitou por alguns momentos. Um leve estremecimento percorreu seu corpo. Estava nervosa. Era a primeira vez que domaria um animal sozinha. Havia domado animais antes, mas na presença e com certo auxílio de seu mestre caçador. Desta vez pesquisara com cuidado e domaria um animal para estabelecer verdadeiramente o vínculo espiritual. Parte de sua vida se integraria ao animal e também parte da essência da fera comporia a sua própria. Era um passo avançado e decisivo na vida de um caçador. Aquela raposa branca seria a fera que acompanharia Ninde por toda a vida. Mas ela estava pronta. Respirou fundo e olhou mais uma vez para a pequena raposa.

Um zumbido agudo irrompeu o ar inesperadamente. A pequena raposa correu de volta ao arbusto, sob o olhar sobressaltado da jovem caçadora. Ninde espiou cuidadosamente ao redor, se concentrando ainda mais em sua respiração e camuflagem. Um baque surdo entre ela e o arbusto onde se escondia a pequena raposa deixou um corpo estendido em meio à neve. A caçadora olhou com incredulidade. Era um elfo noturno, ao que parecia.

A caçadora alcançou a aljava em suas costas com a mão direita, retirou uma flecha e encaixou-a no arco. O manto de tom amarronzado envolvia todo o seu corpo e um capuz protegia o rosto. Lentamente deixou a segurança dos pinheiros e caminhou para a clareira, em direção ao corpo. O manto farfalhava atrás de si e assumia tons mais claros conforme ela caminhava pela neve. Apontava a flecha em direção ao corpo do elfo.

Parecia ter caído de algum lugar. Ninde olhou ao redor e então para o alto. Um portal arcano oscilava em um brilho lilás vários metros acima. Uma queda e tanto. A caçadora relaxou a postura, agachando-se cautelosamente ao lado do elfo. Jogou o capuz para trás, liberando os cabelos azuis ao distante sol de Invérnia. Pousando o arco e a flecha ao lado, tentou mover o corpo, pois caíra com o rosto na neve. Não parecia estar gravemente ferido.

Era jovem. O rosto sereno era de um azul pálido e acinzentado. Uma barba rala cobria parte dele e era branca como seus cabelos. Vestia um robe branco com detalhes em púrpura. A roupa, o portal arcano e um cajado simples de freixo caído ao seu lado indicavam que se tratava de um mago. Um aprendiz talvez. Isso explicaria o portal metros acima do chão. Ninde não pôde deixar de sorrir.

A caçadora se inclinou para verificar se havia algum ferimento na cabeça do mago. Sem perceber, seu cabelo roçou suavemente o rosto do mago desmaiado, fazendo com que movimentasse o nariz e a boca devido ao leve incômodo. O elfo noturno lentamente abriu os olhos em um suave jorro de brilho claro, característico da raça.

A primeira expressão a tomar o rosto do elfo foi de estupefação. Encarou a caçadora como se fosse de outro mundo e ela então se deu conta de que ele estava desperto. Um pequeno desconforto a abateu e ela recuou rapidamente. Pensou no quanto havia sido imprudente e desejou estar com seu arco na mão, mas hesitou em pegá-lo.

Pedra da AlmaWhere stories live. Discover now