Capítulo 2: E lá estava eu.

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Noite 1

Uma contagem regressiva se iniciou na tela. Dez, nove, oito... Eu já estava na borda do assento antes mesmo de ver o número cinco.

Três, dois, um.

Tudo voltou ao negro. A sala permaneceu escura por um tempo. Uma fungada do rapaz de regata conseguiu estragar o silêncio proposital do vídeo que perpetuava no clima. De repente então, como se viesse de enormes caixas de som invisíveis, uma voz se manifestou.

-Tecnologia. Muitas vezes considerada uma forma de substituir o trabalho humano. Mas qual é nosso verdadeiro trabalho então, se não expandir nossa humanidade? –Na tela então, um olho humano se abre e começa a nos observar. –Não estamos sobrepondo a nada, apenas reproduzindo o que há de melhor em nós mesmos.

Logo, a tela começara a apresentar sequências de imagens do cotidiano, vídeos confortáveis e um pouco poéticos sobe a vida humana. Entre eles alguns sorrisos, esportes, torcidas, brigas, instrumentos, abraços, beijos...

-Nossa tarefa é mostrar o quão belos e incríveis nós conseguimos ser, tudo isso através de nossos atos. Se fomos criados por algum deus, é por que ele quis que conseguíssemos fazer o que ele faz. Se fomos gerados pelo cosmos, é por que devemos reclamar o direito de estender o infinito com nossas próprias mãos, mostrando nosso papel como co-criadores do universo.

Após aquelas palavras e diversos vídeos dinâmicos mostrando a presença humana na terra, no mar, no céu e até o espaço, todo vídeo retrocede repetindo todas as imagens de trás para frente até o olho que volta a nos observar...

-Se somos humanos, devemos estender a nós mesmos.

O olho volta a se fechar e estamos novamente no silêncio, até que uma bater de palmas salta do meio de nós. Outra vez o grandalhão interrompendo um silêncio planejado; porém a menina dos olhos grandes se junta ao movimento do rapaz, logo a outra sentada ao meu lado, depois de terminar a anotação que fazia com tanta pressa rapidamente começou a bater palmas junto com os outros dois. Não demorou até que aquilo se estendesse pelo resto dos integrantes, inclusive a mim.

Naquele momento, pelo menos, havia alguma razão para quebrar o silêncio.

A tela voltou a se acender e pudemos contemplar a figura de duas pessoas envoltas com seus jalecos, sentados de maneira formal em meio a um laboratório movimentado. Logo reconheci o casal; certamente aqueles eram os...

-Olá participantes, somos Aiko e Iori Kagami. Somos os responsáveis pelo Projeto Branca de Neve. Estamos extremamente felizes por podermos finalmente realizar esse evento que entrará para a história da Inteligência Artificial. –Começou a falar Aiko, a mulher japonesa, quase fazendo-me pular de meu lugar ao finalmente saber que tudo se tratará de IA. Por mais óbvio que fosse, ainda era animador poder ouvir isso da própria boca dos desenvolvedores, calando de uma vez minhas especulações ansiosas.

-Queremos aqui provar ao mundo que a Inteligência Artificial não é apenas uma ferramenta usada para substituirmos atividades e trabalhos das pessoas. O que fazemos aqui é o avanço na história da tecnologia ao mostrar que conseguimos criar uma complexidade capaz de conviver conosco, digna de participar da vida humana. –Esse agora era o homem falando, Iori Kagami, fazendo minha imaginação borbulhar ao fantasiar sobre um mundo onde a Inteligência Artificial convive ativamente na vida humana, como se fosse um de nós.

-Afinal, só poderemos saber que nos conhecemos quando pudermos criar algo como nós mesmos.

Aquelas ultimas palavras foram seguidas de um leve sorriso do casal, que nos deixou gradativamente enquanto a tela se apagava até voltar ao preto. Ficamos novamente no silêncio, presos com nossos próprios pensamentos. Aquilo me atingiu desprevenido, sem saber como interpretar o que se passava em minha cabeça naquele momento. Só sabia que não havia confusão de ideias ou uma conclusão clara do que eu poderia tirar daquele vídeo, apenas um silêncio desabitado repousava sobre minha mente...

Projeto Branca de NeveWhere stories live. Discover now