[Eighty-eight]

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"Como é que estás?" Perguntou ele, avaliando-me de alto a baixo assim que entrei e não pude deixar de reparar na distância a que ele se obrigava a estar de mim.
"Depois deste dia, nem sei..." Respondi, afundando-me no sofá.
"A prova é complicada e se te faz sentir melhor, em 50 anos apenas quatro equipas é que conseguiram completa-la à primeira." Dito isto, ele sentou-se na outra ponta do sofá.
"Sinto que os desiludi, podia ter tido uma melhor prestação. Posso ter sido a diferença entre termos finalizado ou não."
"Malia, não te podes martirizar por algo de que não tens culpa. Como o próprio nome indica, esta foi uma prova de grupo, logo não existe culpa individual, mas sim coletiva, portanto se vocês realmente querem passar, aconselho-vos a trabalharem em conjunto."
"Tens razão... Estou tão nervosa para amanhã."
"Eu acredito em ti." Disse ele apenas e como já se era de esperar, um silêncio constrangedor instalou-se por cada canto daquela casa.
"Nunca pensei que cá voltasse..." Disse, sem antes pensar se o devia ter dito ou não.
"Hoje foi o primeiro dia que consegui aqui entrar, desde a última vez que cá estivemos..." A dor na sua voz era palpável e eu tive que me controlar, para não sair de onde estava e abraça-lo até que o seu cheiro me invadisse por completo.
"Irónico han? Ambos termos vindo até aqui pela primeira vez em tanto tempo." Ele soltou um riso abafado e no mesmo instante levantou-se.
"Já jantaste?" Perguntou ele, encaminhado-se para a cozinha.
"Não estou com muito apetite..."
"Não me obrigues a enfiar-te a comida por essa garganta abaixo. Tu bem sabes o quanto eu odeio quando deixas de comer!" Disse ele num tom quase demasiado agressivo, mas estranhamente senti-me bem e não pude evitar de sorrir quando me apercebi que ele ainda se continuava a preocupar com o meu bem-estar.
"Não me batas, calma." Ele sorriu e meteu algo a aquecer no micro-ondas.
Sentei-me na pequena mesa de mármore e o meu estômago roncou instantaneamente assim que ele posou o prato de macarrão à minha frente.
"E dizias tu que não estavas com fome." Disse ele revirando os olhos e sentando-se de frente para mim.
"Não estás mesmo a pensar ficar aí especado a olhar para mim enquanto como, certo?" Perguntei levando a primeira garfada à boca e gemendo baixinho em satisfação.
"Preciso de me certificar que vais comer tudo."
"Como se eu fosse uma criança."
"Estás lá perto..." Disse ele entre risos e tenho que admitir que tinha sentido falta daquele som melódico.
"És ridículo." Ele soltou outra gargalhada e levou a sua atenção de volta ao portátil e eu aproveitei a situação para o observar com mais atenção.
"Não gosto quando me ficam a olhar dessa forma." Disse ele sentido o meu olhar posto nele, sem sequer retirar os olhos do ecrã.
"Nem sequer estava a olhar para ti."
"Tal como não estavas à janela a olhar fixamente para mim?" Disse ele brincando comigo.
"Não deixes que te suba à cabeça." Disse terminando a minha refeição.
"Deixa a loiça." Atirou ele, assim que peguei na esponja.
"Como se fosses tu quem a vai lavar..." Ele por fim rendeu-se e posicionou-se ao meu lado com um pano na mão, para ir secando o que eu lavava.
"É assim que um futuro nosso se pareceria? Tu a lavares os pratos ao fim de um dia e eu limpar antes de irmos para a cama e retomar-mos a nossa rotina diária?" Perguntou ele, deixando escapar o que pareceu um pensamento, que possivelmente não era suposto ter saído cá para fora.
"Talvez se tivéssemos feito escolhas de vida diferentes, quem sabe..." Disse não deixando os meus olhos escaparem do prato que lavava, para não ter que olhar para a sua cara.
"Talvez... Mas a verdade é que eu poderia nunca te ter conhecido se não me encontrasse na posição em que estou."
"O quão mau seria isso?" Perguntei, fechando a torneira em seguida e encarando-o por fim.
Ele contorceu a cara como se quisesse dizer 'tu não estás a falar a sério', porém não abriu a boca.
"Está tarde, devia voltar. Obrigada pelo jantar." Foram as únicas palavras que consegui emitir depois de algum tempo em silêncio.
"Eu acompanho-te." Queria protestar contra aquilo, mas antes que pudesse dizer o que quer que fosse, ele cortou-me:
"Malia não tentes discutir. Está tarde e seria no mínimo estúpido se eu te deixasse andar pelo descampado, sob o risco de seres raptada ou sabe-se lá o quê."
"Pensei que toda esta propriedade fosse protegida." Disse abrindo a porta de casa.
"Já tivemos alguns intrusos..."
"Nunca pensaram redobrar a segurança?"
"Nenhuma equipa de seguranças era capaz de cobrir milhares de hectares." Disse ele, trancando a porta e andando ao meu lado.
"Sinceramente tinha esperanças que não fosses voltar mais..." Disse ele por fim.
"Até parece que não me conheces melhor que isso. O único motivo pelo qual tive que interromper foi por causa do Rowan."
"Mas imaginei que o teu pai te fosse impedir e honestamente não me importava."
"Vou tentar fingir que não me sinto ofendida por essa afirmação."
"Só me preocupo com a tua segurança."
"A minha segurança não vale mais que a de todos os outros recrutas!" Atirei com raiva a crescer no meu interior.
"Para mim vale, porra!" Disse ele quase num grito e eu tive que me forçar a parar e olhar para ele.
"Lamento informar, mas vais ter que aprender a lidar com o facto de que pertenço aqui e tal como qualquer outro, estou disposta a ir em qualquer tipo de missão."
"Como é que é suposto eu me concentrar se souber que estás num campo de batalha, com todo o tipo de perigo iminente ao teu redor?!"
"Talvez me devesses tirar da tua cabeça de uma vez por todas!" Gritei descontrolada.
"Falas como se isso fosse a coisa mais fácil deste mundo ou como se tu própria me tivesses esquecido!"
"Eu estou a seguir em frente e tu devias fazer o mesmo."
"É por isso que ficaste especada em frente à janela, à espera que eu notasse a tua presença? Malia, admite de uma vez por todas que me queres."
"Não tornes isto mais complicado daquilo que já é." Disse baixinho, virando-me e continuando o meu caminho.
Num movimento ágil, ele puxou-me pelo pulso para perto de si e eu fui levada a olhar para os seus olhos, que tinham escurecido subitamente.
"Diz-me que não pensas em mim..." Sussurrou ele atingindo-me com o seu hálito habitual a hortelã, com um travo a canela e eu suspirei.
"Jake..." Não conseguia sequer formular uma frase coerente, pois naquele momento tudo o que deseja era aqueles lábios contra os meus...

A Filha do PresidenteOnde as histórias ganham vida. Descobre agora