7. Você Tem Razão

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Óbvio que Peter sempre soubera daquilo que escorria da boca de Wade.
Vários garotos falaram que aquele era um péssimo cliente pra começar, mas Peter além de não ter muita opção, achou que quanto pior fosse, menos surpresas desagradáveis ele teria das próximas vezes. Mas então ele foi lá, e tinha sido incrível.
E depois ele sentiu o inferno, de outros que o tocavam sem a mesma atenção, apertando o roxo sobre o roxo.
Por mais que ele afastasse esse pensamento constantemente, ele sabia que Wade tinha sido aquele tipo de cara. Mas, não mais.
Wade nunca mais ligou e pediu ninguém, Wade demonstrou verdadeira preocupação com o estado Peter, cuidou dele e lhe deu carinho quando ninguém mais tinha dado.

Ninguém era perfeito, e as pessoas podiam mudar, e Wade tinha mudado, e Peter nunca imaginou que ele não tivesse percebido isso. Isso o fazia se sentir culpado, culpado por sempre aparecer com problemas, e nunca estar lá para Wade, como Wade sempre estava pra ele.

Então ele se virou e encarou os olhos azuis, e marejados eles pareciam uma piscina límpida, ele queria mergulhar, e nunca mais sair dali.

- Eu sei amor.

Essa era a primeira vez que Peter o chamava de algo além de Wade, e isso era importante, importante pra confusão total que ele sentia quanto aos seus sentimentos, e "amor" parecia a palavra que representasse exatamente a junção de todos eles.

Wade se desmanchou quando ouviu aquela palavra, se deixando finalmente cair de joelhos no chão, colocando o rosto entre as mãos chorando em desespero

- Por favor, não me chama assim! Eu não mereço.

Peter se aproximou lentamente, sentando de pernas cruzadas na frente dele. Ainda sem toca-lo, ele não queria assusta-lo.

- Escuta o que eu tenho pra dizer, eu sei que você fazia isso, mas precisa encontrar um jeito de se perdoar, todo mundo comete erros, e você hoje entende que isso é errado e nunca mais repetiu, eu imagino que deve ser difícil assimilar tudo isso, mas eu não quero que se sinta assim.

- Peter, eu sei que você quer me ajudar, mas não tem como eu me sentir de outra forma, eu não consigo olhar pra você. Eu me sinto sujo.

Peter esfregou os próprios braços tentando se aquecer, as palavras de Wade contribuíam para o frio que ele sentia.

- Quando você se fala assim, parece que sente nojo de mim.

Wade levantou os olhos.

- Não Peter, não pensa isso, eu não sou nem digno de você.

Peter ficou impaciente com aquela conversa, todo mundo fazia o que Wade fazia, e Peter não queria que essas pessoas morressem sofrendo, ele só queria que elas entendessem o quanto contribuíam para a continuidade daquela porcaria toda, e parassem de compactuar contratando garotos e garotas. Simples assim. Sem compradores, sem vendedores, sem pessoas tratadas como mercadoria.

- Wade para com essa besteira de ser indigno, ou de ser como meu padrasto, você não sabe uma grama sobre isso. Você é é... FOI um grão de areia, o meu padrasto é um caminhão cheio. Eu não quero ser hipócrita e te contar mentiras de contos de fada. Mas olha pra mim, você não acha que eu seria capaz de perceber se você ainda fosse um babaca, sério Wade, eu tenho alarme pra babacas, porque convivo com um monte deles. Eu saberia. Por favor, vamos trabalhar nisso juntos, a gente vai superar.

Wade estava esgotado, da quantidade de coisas que sentia naquele momento, estava esgotado e sufocado por culpa.

- Não existe nos, quando daqui poucas horas você parte e me deixa jogado aqui no chão frio dessa casa.

O celular de Peter tocou e ele tirou do bolso para desligá-lo, mas então, viu o número que chamava e achou ser prudente atender, ele olhou Wade com olhar de culpa, e Wade assentiu, e ele levantou e atendeu.

Peter atendeu de costas baixinho mas Wade ainda era capaz de ouvi-lo.

- Oi querido, o que foi? ... Claro, eu irei em algumas horas, e levo pra você... boa noite!

Ele se virou para Wade.

- Por favor, entenda que eu ainda não posso sair disso, mas a gente pode continuar conversando, eu posso vir aqui às vezes e podemos conversar, eu sei que você se preocupa, mas olha pra mim, eu quase não tenho mais machucados, as coisas estão indo bem, se eu seguir as regras vai ficar tudo bem.

- Como pode fazer isso Peter? você vem e vai quando quer, diz que tá sempre tudo bem, mesmo com a quantidade maldita de merda que estamos envolvidos. Você não pode só empurrar essa porcaria pra de baixo do tapete e ponto final. Não pode Peter.

Peter esticou o braço pegando a mão de Wade, brincando com ela até entrelaçar os dedos.

- Porque esse é o melhor jeito, o que não tem remédio, remediado está. Não adianta ficarmos nos remoendo por coisas das quais nada podemos fazer Wade, temos que seguir em frente.

Wade balançou a cabeça em negativa.

- Sempre tem algo que podemos fazer, e isso não é só sobre você, eu tenho investigado o lugar que você fica.

Peter sentiu um frio na espinha e soltou a mão de Wade, mas não conseguiu interrompe-lo as palavras ficavam presa na sua garganta.

- Garotos e garotas morrem toda a semana, porque eles queriam sair disso, você veio até aqui, e tirou a venda dos meus olhos, e me mostrou o custo da minha ignorância, não pode me dizer pra esquecer tudo isso, e fingir que tá tudo bem. Eu precisa fazer alguma coisa, por mim, por você e por todos aqueles garotos.

Peter levantou num pulo, assustado, andando de um lado pro outro na sala enorme, procurando palavras pra expressar o problema daquilo.

- Wade, isso é muito perigoso, você entende que pode morrer?

Wade sorriu, levantando e sentando no sofá confortável, encarando Peter com uma assertividade no que falava que assustou o garoto.

- Eu nunca me senti vivo, desde que toda essa merda aconteceu com o meu corpo, eu sempre me senti menos que uma pessoa. Menos humano, Sempre tive pena de mim mesmo, atrás de uma máscara de alguém ruim. Eu passei anos sem grandes interações sociais, eu nunca me permiti me apaixonar ou ter grandes amigos, me disseram que eu não era uma pessoa, e então eu agi como se não fosse uma. Por anos e anos e anos.
E então numa noite despretensiosa de solidão eu conheci você, e em tão pouco tempo, você me obrigou a sair da minha zona de conforto, eu sai na rua, falei com pessoas que nunca conheci, compactuei silenciosamente com um médico, recebi um elogio de uma recepcionista, e eu vivi o céu e o inferno com você. Eu to cagando com o que vai acontecer comigo, eu só quero dar a você a mesma oportunidade que você me deu. Quero que você aprenda a não empurrar a merda pra debaixo do tapete, se convencendo que tá tudo bem, que pode viver limitado, quando você merece muito mais. Eu não vou fechar os olhos pra isso Peter, custe a merda que custar.

Peter, parecia desesperado, a ponto de se ajoelhar implorando para que Wade não fizesse isso. Mas então ele continuou andando de um lado para o outro inquieto. Ele tinha se apegado a uma imagem de Wade como Salvador, e ali estava ela se tornando plena realidade. Peter tinha muita coisa pra perder, e também tinha medo, muito medo do que poderia acontecer, mas ele vivia constantemente assustado, e essa sensação não era novidade, ele também queria o mesmo que Wade, mas nunca se sentiu forte o suficiente pra isso, mas agora eles estavam lá. E ele poderia ser um informante lá de dentro, o cara era padrasto dele, não havia qualquer pessoa na terra mais apta a colocar seus podres na mesa do que ele. Ia ser duro, difícil, e com certeza arriscado, mas Wade tinha razão, era hora de levantar o tapete e limpar a bagunça.

- Você tem razão, e eu vou te ajudar.

Quando Faltam as PalavrasWhere stories live. Discover now