mas me obriga a enxergar tantos defeitos em mim.

Ele não me bate...

mas me chama de louca e histérica.

Ele não me bate...

mas me manipula.

Ele não me bate...

Minto... ele não me bate, pouco."

Como é fácil ser tola, ingênua e frouxa. Cair no conto do 'homem bom' não devia existir mais, mas sempre tem as que levam um tempo a mais para entender a situação a sua volta. Por que não vi desde o começo?

"Você é linda, pura e gentil", ele dizia.

"Você é a melhor coisa que conheci nessa cidade", ele dizia.

"Seu corpo é o meu paraíso e minha morte", ele dizia.

"Eu nunca vou deixar de amar e venerar você", ele dizia.

E eu, boba e iludida, acreditei em cada palavra, cada elogio, cada declaração velada de que eu era seu bem mais precioso, até que eu fui perdendo a prioridade, sendo jogada de um lugar para outro. Até que percebi que já era tarde demais para sair. Fugir me pareceu a melhor opção de todas, mas sempre tinha o medo. Medo de não conseguir e tudo ficar pior, tenho vergonha do que as pessoas vão pensar de mim se souberem de tudo.

A verdade é que tenho nojo de mim. Minha grande angústia é ninguém acreditar na minha verdade. Ao menos se eu tivesse percebido os sinais, eles sempre estiveram lá, porém eu me ceguei diante de tudo.

Não começou com um tapa, um murro ou algo semelhante, não, ele foi sútil.

Acho que eu devia ter dito 'não' quando ele me ele tentava me impedir de ir a qualquer lugar, dizendo que só necessitávamos um do outro. Eu devia ter dito 'não' quando ele questionou minhas roupas, as mesmas que antes ficavam maravilhosas em mim e que agora ele só sabe dizer que nada cobre suficientemente o excesso das minhas curvas, e assim, ganhei um novo guarda roupa contendo tudo que mais o agrada. Não vi porque não aceitar, ele estava sendo bom comigo, generoso, atencioso e cuidadoso.

Eu devia ter brigado, reclamado, ter feito qualquer coisa quando ele jogou todos meus batons, maquiagens e perfumes fora porque sempre dizia que eu era linda e não precisava de nenhum produto, que não era necessário me arrumar para ficar em casa, que minhas maquiagens manchavam suas roupas, e o meu sofá era melhor do que qualquer outro lugar. Aos olhos dele minha beleza era como a de um anjo, e eu não vi nada demais nisso, achei que era admiração, que era amor, olhos apaixonados. Quando me dei conta, eu já fazia parte da decoração da casa.

Pouco tempo depois ele afirmou que nosso relacionamento era o suficiente para tudo e que eu não precisava das antigas amizades, pois ele ia suprir tudo e qualquer coisa que eu necessitasse. Eu devia ter dito 'não', mas ele me pareceu tão companheiro, tão afetuoso, tão dedicado e minhas amigas com suas vidas tão ocupadas que eu não quis mais incomodá-las. Eu me abri com ele, contei meus medos e receios, sonhos e realizações, eu depositei nele tudo que podia e acreditei que havia encontrado meu porto-seguro. Comecei a acreditar nas explicações irracionais dele, apesar do meu coração e dos meus olhos. Deixei que ele definisse a minha realidade. Me isolei.

Quantas vezes sussurrei "Como vim parar aqui? Como virei essa mulher?" Quantas vezes disse para mim mesma "Levante, chame um táxi e vá embora"? Quantas vezes me levantei e não me reconheci no espelho? Quanto ódio eu senti pela mulher que me olhava de volta. Mas ele nunca me bateu, então eu relevei e desisti de partir.

Destinos CruzadosWhere stories live. Discover now