Capítulo 03

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Três anos há atrás...


HEITOR


— Heitor, preciso que você vá buscar uma garota pra mim. — Fabriccio me ordena.

— Desculpa chefe, mas esse tipo de trabalho é pra soldados. Com tanta puta disponível por aqui tu quer que eu saia a procura de mulher?

Há dias estamos em um marasmo total. Os Federais estão fechando muito o cerco sobre nossas rotinas, e por mais que mudássemos nossas rotas éramos constantemente emboscados. Diante disto, Nicolau decidiu zerarmos nossas colheitas e entregas restando a todos aproveitarmos dessas férias forçadas entre um casino e outro de Las Vegas. A cidade do pecado nos permite ter muitas regalias materiais e um policiamento menos brando facilitando pequenas necessidades.

— Não questione minha ordem, apenas abaixe a cabeça e encontre o que eu quero. No dia que você for o chefe aí sim pode dar ou não sua opinião. — ele esbraveja em minha direção, e a julgar pelo seu olhar assassino eu realmente deveria ter ficado calado — Pegue essa foto e fareje pela periferia da cidade, com certeza ela estará se vendendo por drogas.

Ele me entrega uma foto bastante desbotada, evidenciando o quanto deve ter a manuseado incessantemente.

— Condições?

— Viva. Não necessariamente inteira, mas respirando e raciocinando ainda.

— O senhor que manda. Vou usar dois ou três soldados, caso seja necessário mais força bruta.

Saio do quarto onde ele está hospedado rapidamente, quando ouço a voz de Fabriccio ecoar pelo corredor do hotel.

— Não leve o Pablo. Apenas você e Luís Gustavo.

Apenas aceno positivamente e adentro o elevador.

Estranho ele separar nosso trio, normalmente desde que conquistamos nosso patamar acima dos soldados sempre trabalhamos juntos lado a lado em qualquer missão.

Corto esse pensamento desnecessário e mando uma mensagem para o celular de Guto, para que ele me encontre longe de todos.

Minutos depois, vejo o Maverick dele virar a rua e parar na esquina.

— Fala irmão. Por que o segredo?

— Precisamos encontrar essa mulher, — mostro a foto a ele — Fabriccio quer ela viva, e incumbiu essa missão apenas a nós dois.

— Não gosto de fofoca, mas se o Pablo não pode vir, é segredo de família.

— Seja o que for, não é da nossa conta. — o corto.

— Ok, então. Por onde começamos?

— Pela periferia da cidade, ela deve estar se prostituindo por drogas.

— E como você sabe disso? Irmão, sabemos que tu é feio e estranho, mas não precisa se rebaixar dessa forma. — ele gargalha como se houvesse descoberto algum vacilo meu.

— Não seu babaca, essa dica veio junto com a foto.

— Faz sentido então, eu nunca vi nenhum dos chefes com alguma mulher, deve ser assim que eles aliviam a tensão. Se é que você me entende?!

— Guto, coloca a merda dessa sua banheira em movimento e vamos acabar logo com isso. — ordeno perdendo o pouco de paciência, que eu não tenho, é claro.

Três horas depois e já percorremos todos os becos e ruas possíveis da periferia e nada da mulher aparecer.

— Ela deve estar naqueles dias e tirou uma folga da prostituição. — Guto caçoa.

— Às vezes me pergunto por que somos amigos.

— Vamos concordar de que além de não havia muitas opções na época, também é um prazer andar com uma cara tão bonitão quanto eu...

Meu amigo continua divagando sobre suas qualidades quando eu reparo em uma pequena briga no final da rua a qual estamos. Minha intuição fala mais alto e eu não perco tempo ao descer do carro e correr em direção a confusão. Cinco homens espancando covardemente alguém.

Amo uma briga, sou magneticamente atraído para qualquer uma que esteja acontecendo próximo a mim. Não que eu seja alguma espécie de herói, mas cinco contra um de forma alguma me parece uma luta justa. A menos que o um em questão seja eu contra todos.

Tão animado quanto eu, Guto já chega no modo metralhadora de porrada. Costumamos bater primeiro e perguntar depois, essa ordem sempre funcionou muito bem.

Minutos depois e todos os grandalhões estavam nocauteados no chão quando enfim reparo na vítima. Para minha surpresa, é exatamente quem eu estava procurando.

— Isso que eu chamo de coincidência, salvar exatamente quem procurávamos. — meu amigo verbalizar meus pensamentos.

— Sorte a nossa. Só espero que a sorte dela permaneça, afinal, ser procurada pelo Fabriccio nunca é uma boa coisa.

— Verdade. Jogamos ela no porta — malas ou no banco de trás?

Olho para a pequena garota desacordada no chão. Ela não deve ter mais do que um metro e cinquenta, e pesar mais que quarenta e cinco quilos.

— Pra mim, é inofensiva. Banco de trás.

A pego em meus braços e sondo que realmente não deve pesar mais do que um saco de areia. Se ela é uma usuária de drogas como meu chefe sugeriu, talvez ela tenha acabado de sair de uma clínica de reabilitação, me parece bastante saudável por baixo dos hematomas que acabou de adquirir. A coloco delicadamente no banco do carro. Por algum motivo me sinto hipnotizado pela delicadeza e fragilidade que ela transparece mesmo inconsciente.

Guto arranca com o carro e eu não consigo nem ao menos sair do banco de trás, algo nela despertou um senso de proteção em mim e espero que essa loucura passe assim que eu a entregar a Fabriccio.


XXXXX

— Já pode largar a moça Heitor, agora ela é problema do chefe. Estamos no quarto de um dos nossos chefes e parece que o tempo simplesmente correu. Quase não acredito no que estou fazendo neste momento. Parado, completamente estático ainda com a desconhecida em meus braços, como se algo estivesse prendendo-a em mim.— Vou colocar ela na cama então.— No chão Heitor, — Fabriccio ordena em seu tom frio de sempre — essa vagabunda não merece nada mais confortável que isso. Mesmo em recusa por dentro o obedeço imediatamente.— O que vai fazer com ela chefe?— Matar, é claro, depois que ela me contar algumas coisas. Já podem ir, eu assumo daqui.— Então eu fico, caso o senhor precise de ajuda pra limpar tudo depois. — argumento enquanto mantenho a encarada que Fabriccio lança em minha direção.— Parça, tá na nossa hora. Vamos. — Guto tenta me puxar pelo braço, porém, eu não me movo. Não arredo o pé do lugar e quando o clima começa a passar de constrangedor para muito estranho, Fabriccio dispensa o Guto com um aceno de cabeça. Antes que uma pequena discussão se inicie entre nós dois a desconhecida acorda.— Bem vinda Suellen, pronta pra uma temporada comigo? — ele a questiona e a pobre moça demonstra estar horrorizada olhando de mim para ele incessantemente — O que foi? Alguém comeu sua língua? Ela permanece calada, zombando de nossa paciência.— Fala porra! Hoje não tô pra brincadeira Suellen.— Moço... — merda! Além de linda, ainda é dona de uma voz suave como a porra de um anjo — o senhor está me confundindo com minha irmã...— Pra cima de mim não caralho. — Fabriccio se exalta — Vá jogar essa balela pra cima dos traficantes que te bancam, pode desencarnar a moça boa comigo.— Não estou mentindo, eu juro. Era exatamente isso que eu estava falando aos homens que me arrastaram do meu trabalho e do nada começaram a me bater. Eu não sou a Suellen, me chamo Selena e não faço ideia de onde está minha irmã gêmea.— Prove. — me antecipo e mesmo não devendo, interrompo a conversa deles.— Não posso. — ela lamenta tristemente — Minha bolsa com meus documentos ficaram no bar onde eu trabalho.— Documentos não provam muito, podem ser falsos. — meu chefe pondera e eu concordo com ele. Nós, mais do que qualquer outra pessoa, conhecemos a facilidade em obter documentos falsos.— Então é minha palavra que resta. — diz pensativa — Com certeza um dos dois foram pra cama com minha irmã, mas se chamar um médico posso provar que sou virgem ainda, bem diferente dela. Meu chefe a observa por alguns instantes e o conhecendo tão bem sei que já está ponderando que a moça possa estar falando a verdade, caso contrário, já teria metido uma bala no meio da testa dela. Porém, antes de sua sentença final nossos telefones tocam simultaneamente, indicando que temos alguma emergência para solucionar.— Leve-a daqui Heitor. Mantenha alimentada e bem presa, eu resolvo seja lá o que estiver acontecendo. Meu instinto de proteção fala mais forte do que minha razão, então imediatamente eu a retiro do quarto do meu chefe e a levo em meus braços até o meu. No fundo, sinto que estou me metendo em alguma furada, mas não consigo parar.

*****

Atualizado em...

27/02/19.


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