Bônus - Selena

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 "Você precisa seguir os passos de sua mãe e irmã Selena, ser boa e altruísta não te levará a algum lugar. Mamãe vai te ensinar pela última vez a arte de nossa família. Seduzir, roubar ou chantagear."

Com esse preceito eu cresci. Subjugada e incentivada a ser algo que nunca enxerguei com bons olhos, todo aquele universo me enojava na maior parte do tempo. Desde muito nova vi minha mãe trocar de homens como alguém troca de blusa para ir a um passeio de verão, vi também Suellen acompanhar estes mesmos passos com maestria, enquanto eu apenas me concentrava para não me perder no compasso.

As palavras eram sempre as mesmas, "mais maquiagem", "não esqueça da voz melosa", "balance mais esses quadris", "mais charme criança". Uma tortura tão agonizante que não pensei ao menos duas vezes antes de fugir com apenas uma mochila nas costas e o gosto da liberdade na alma.

— Ficar no mundo da lua não vai lavar as louças Selena. — o novo encarregado da limpeza chama minha atenção, e com razão, pois outra vez meu pegou viajando em meu passado.

— Desculpe seu Alexandre, eu termino isso em menos de dois minutos. Prometo.

Com a cara fechada ele se afasta, mesmo sabendo que irá chamar minha atenção novamente. Eu sou mesmo uma tola, qualquer mosca tira minha concentração e eu me jogo no mundo da imaginação. Esta sempre foi minha tática para camuflar minha tristeza todas as vezes que minha mãe me batia quando eu não permitia os avanços de seus amigos contra mim, sempre preferi apanhar do que me render fácil, bem diferente de Suellen. Lembro-me com riqueza de detalhes quando Sônia leiloou a virgindade dela, e por algum motivo escuso para mim, Suellen se sentiu feliz como se estivesse indo para uma premiação do Oscar. Enquanto eu fiquei presa em meu quarto e chorei até pegar no sono, pois não demoraria para que eu fosse a próxima visto que antes dos dezoito anos qualquer virgindade é mais cara.

— Amiga, pára de se distrair, assim você não irá durar muito por aqui. — Júlia me repreende.

— Mas eu não me distrai, continuo lavando os pratos.

— Só se for onde você estava viajando na sua imaginação, porque por aqui tem mais de quinze minutos que você nem mexe as mãos.

— Nossa, eu nem percebi, estava pensando na minha família.

— Acha que elas podem estar atrás de você depois de tanto tempo? — minha amiga questiona tão preocupada quanto eu.

— Não sei, já tem mais de seis meses que nem ao menos me ligam. Ou morreram, ou ainda estão envolvidas enganando algum velho desavisado.

— Sempre foi assim?

— Sim. Meio que é a profissão da família. As regalias que elas gostam custa caro, e talvez hoje em dia os mais jovens e bonitos não se iludem com apenas corpos bonitos, já os mais velhos não, estes se deixam seduzir com poucos olhares, caem na teia delas com uma facilidade incrível. Os casados são os que abrem a carteira mais rápido quando descobrem a verdade, quanto mais ricos mais têm medo de escândalos. Já os idosos gostam da atenção exclusiva. Elas enxergam o sexo como um meio de dinheiro mais rápido, com pouco esforço. Não posso mentir e dizer que no fundo não sou como elas, já fui longe demais em nome de ser aceita dentro da família, amada por minha matriarca, mas sempre era pouco na visão de dona Sônia. Quando tinha dezesseis anos eu fugi de casa assim que ela decretou o fim da minha castidade, e isso pra mim foi a gota d'água, já tinha roubado diversas vezes, ficado nua ao lado de homens bêbados para que minha mãe tivesse provas contra eles, estourado cartões de crédito enquanto Suellen distraia a vítima da vez, eu sei copiar a assinatura de qualquer pessoa olhando a original apenas uma vez. — desabafo com muito pesar, não só na voz, mas também na alma — Acho que já tenho pecados demais por essa vida, e mesmo assim não consigo me afastar completamente delas, mesmo que cinco anos tenham se passados desde que fugi, eu ainda as socorro quando me pressionam.

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