CAPÍTULO 8-RODRIGO

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Nestor conduziu Armando pela escadaria que levava ao segundo andar. Bateu na porta e obteve permissão para entrar.

Armando estava ansioso para conhecer o dono daquela voz, que era do homem que o entrevistara naquela madrugada no prostíbulo do Gordo.

Para o enfermeiro, não pareciam ter se passado apenas horas e sim dias entre aquele episódio no prostíbulo com o quarto cliente e o momento atual naquela casa ricamente decorada.

Armando entrou e logo depois ouviu Nestor sair e fechar a porta.

Viu o homem, o tal senhor Rodrigo, sentado logo a sua frente: moreno claro, uma barba bem feita, cabelos castanhos escuros espessos e sedosos, muito sério e de olhar autoritário.

"Lindo! Pra este eu dava sem cobrar um centavo! Espero que o meu cliente tenha puxado a aparência do irmão", pensou esperançoso.

O som do relógio o assustou dando as onze badaladas noturnas.

Depois de se sobressaltar, Armando começou a rir, sem se conter.

_O que está rindo?_perguntou o homem ainda sério.

Armando voltou a observá-lo, mais atentamente: ombros largos, rosto másculo, nariz e boca bem feitos. O enfermeiro tinha que admitir que ele era muito bonito e charmoso. Parecia ser uns cinco anos mais velho do que o enfermeiro.

_E por que não estaria rindo? Fale a verdade: isso tudo foi montado pra me impressionar, acertei?

O homem não disse nada, apenas continuou a observá-lo.

_Esta casa do século passado, estes quartos enormes, todos estas obras de arte...

Armando circulou pelo ambiente lentamente.

_Vi que estamos numa colina e tem aquela floresta atrás da casa. Que lugar é este, afinal? Talvez tenha dado ordens para que o médico que me examinou me drogasse a fim de que eu não visse pra onde estava vindo, acertei de novo? E agora, este relógio assombrando os cômodos da casa retumbando...o que tem ali naquele armário? Uma múmia?_apontou para um armário enorme e que parecia impossível de ser removido de tão pesado._Só pode ser alguma piada comigo. E o meu quarto? Meu apartamento inteiro caberia com folga ali dentro.

_Não se entusiasme tanto ainda. O emprego ainda não é seu._o homem pronunciou sério.

Apontou o sofá que estava em frente ao seu e o enfermeiro sentou-se.

_Ah, claro. O meu paciente/cliente ainda tem que me testar, esqueci. Muito bem. Onde ele está? Posso fazer o teste agora mesmo._disse entusiasmado.

_Não o verá ainda._o outro foi sucinto.

_Mistério..._Armando fez uma cara assustada arregalando os olhos comicamente.

_Vejo que é um palhaço, Armando Scoth Lee._disse o outro contrariado.

_Cara, não sou idiota: você sai de sua mansão e vai ao meu emprego ordinário, descobre tudo sobre a minha vida desgraçada, a minha mãe, o meu emprego...corrigindo, ex emprego no hospital, me faz um teste drive com um homem daqueles...

_Dois._anunciou Rodrigo.

Armando perdeu o senso de humor e ficou sério.

_Dois o quê? Não vai me dizer que o meu terceiro cliente...

_Também foi mandado por mim. Eu precisava ver até onde você aguentaria, para ver se estaria apto a ocupar o cargo que vou lhe oferecer.

_Espere aí..._Armando chegou para a frente, sentando-se na beirada do sofá e o apontou com o dedo, muito sério._Também estava ali durante o meu encontro com o terceiro cliente, então?

_Não. Mas gostaria de saber: por que não aceitou as algemas?

Armando suspirou irritado. Definitivamente, odiava algemas.

_Ok, isso já está me enchendo o saco. Vamos encurtar o assunto: que tipo de homem é o seu irmão, afinal? É do tipo que algema, estupra, humilha? Ele é o quê? Um velho safado e sádico que só sente prazer quando algema e tortura os outros, é isso que quer me dizer?

_Por que não aceitou as algemas?_repetiu o empregador como se não tivesse ouvido o que Armando dissera.

O enfermeiro umedeceu os lábios avaliando se deveria responder, mas temendo perder um emprego melhor, num lugar melhor e, ele implorava mentalmente, para um patrão melhor do que o Gordo.

_Elas são tão necessárias assim? Afinal, você mesmo viu que eu não preciso de algemas, pois sou muito submisso. Seu irmão não terá necessidade das algemas, lhe garanto.

_Fale sobre o padre Everton.

Armando sentiu que perdera o fôlego, por um momento: lembrar-se do padre ainda lhe dava calafrios.

_Mas que porra, cara!_alterou a voz, irritado._Puta que pariu, viu?! Você é do quê, afinal? Do FBI? Pra que investigar a minha vida desse jeito, cara?

_Já lhe disse: o meu irmão é doente e você irá trabalhar dentro desta casa, caso ele o aceite. Sou um irmão zeloso e preciso garantir a segurança e a integridade física dele e de todos que aqui residem, inclusive eu.

Armando passou a mão no rosto imaginando até onde ele saberia de sua vida. Mais uma vez, temeu pelo assalto à joalheria.

_Ok, o que quer saber, afinal?_tentou se controlar agarrando-se à ideia de se livrar de dona Suzana e do Gordo.

_Fale do padre...e fale de sua mãe e por que ela ficou presa por dez anos.

Era incrível como falar do padre lhe tirava as forças e o deixava sem ação, mas falar da mãe o deixava pronto para agir.

_Meu Deus, isso só pode ser alguma pegadinha._levantou-se decidido._Posso ir embora? Isso aqui já deu pra mim!

_Pra onde você iria? Para o seu quarto com um colchão velho, uma geladeira minúscula, esperar até que lhe roubem os últimos pertences...a pensão do Gordo...você não quer voltar pra lá e você sabe disso._ a voz do homem se mantinha calma e controlada.

Armando andou de um lado a outro do quarto, cada vez mais irritado com aquela situação.

_Pra que tudo isso, cara? Por que fazer isso comigo? Vai querer o quê? Minha alma também? Desembucha logo e fale que porra de emprego está me oferecendo, merda?!

Agora foi a vez do empregador suspirar profundamente:

_Ok. A cada pergunta que você responder...eu responderei a uma pergunta sua. Se quando terminarmos, você ainda sentir vontade de ir embora, prometo que mando o Nestor te deixar exatamente no ponto em que lhe apanhou. O que me diz, Armando Scoth Lee?

O homem apontou para o sofá e Armando decidiu sentar-se novamente. Ele estava certo: pra onde ele voltaria? Para dona Suzana ou para o Gordo?

O medo do primo Zeca, a impossibilidade de continuar naquela profissão de prostituto se arriscando a que algum cliente o machucasse seriamente...as dívidas com o Gordo...o apartamento frio e quase vazio...pegar todos os clientes rejeitados pelos seus colegas de trabalho...pensou desanimado e se conformou, afinal.

_Você é um cara sortudo, senhor Rodrigo...Conseguiu encontrar a pessoa mais fodida, desesperada e mais necessitada do mundo, acredite. Por mais terrível que seja o que pretende me oferecer, duvido que seja pior do que a vida miserável que estou levando e o senhor parece saber perfeitamente disso.

Armando engoliu. Suspirou novamente e se resignou a fazer o jogo dele.

_Ok. O que quer saber?

_Fale-me do padre.

_Aquilo não era um padre!_Armando quase rosnou._Aquilo era um demônio!

GÊMEOS: ENTRE A LUZ E A ESCURIDÃO/ versão light-não contém cenas de violênciaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora