5 - Suposições, Chás da Tarde e Comunicados

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- Então, você acha que seu pai está fazendo isso apenas por causa de um acordo comercial!? - A Sayuri parecia chocada quando falei para ela, na segunda-feira.

Nós estávamos a caminho do salão, no final da tarde.

A gente se conhece desde os dez anos de idade, quando o pai dela se tornou embaixador e sua família se mudou para Verittas. Me lembro perfeitamente do primeiro dia em que aquela garotinha japonesa, com óculos enormes apareceu na Nicola Tesla e surpreendeu todas as meninas metidas que tiravam onda com a cara dela achando que ela não falava a nossa língua; porque ela fala português fluentemente e talvez até melhor do que nós, para falar a verdade.

Tipo, a Sayuri, que é filha do embaixador do Japão, tem tipo o QI acima da média e é super estudiosa, então, ela sempre tira as melhores notas.

Não que eu não goste de estudar. Mesmo. Por incrível que pareça, eu até gosto, mas estou ciente e conformada que nunca vou ser tão inteligente quanto a Sayuri.

Na época, eu não tinha nenhuma amiga e, na verdade, eu era hostilizada pela maioria dos alunos. Bem, se você precisa andar com um guarda-costas atrás de você para todo lado, as pessoas podem não ficar exatamente ansiosas pela sua amizade. Além disso, eu admito, não era exatamente um primor de menina. Não com meus dentes tortos e sobrancelhas de taturana. A Sayuri ficou na sala de aula durante o intervalo, lendo As Crônicas de Nárnia, que era minha paixão literária naquela época, em uma edição japonesa! Eu praticamente surtei e comecei a falar desenfreadamente sobre o livro.

Pensando bem, se a Sayuri fosse uma pessoa normal, a sua atitude correta teria sido sair correndo igual uma capivara de perto de mim, a pirada. Mas em vez disso, ela começou a agir da mesma forma. E nós nos tornamos amigas naquele momento. Duas das pessoas mais excluídas e fracassadas da escola.

- Exato -respondi. - Acho que ele só está pensando na influência política de uma possível união.

- Mas o que o seu pai ganharia com isso?

- Meu pai vai praticamente virar sócio de Vendredi quando e se, eu me casar. Você sabe, meu pai é um pouco obcecado com conquista de território. - Dei de ombros, displicente e acrescentei: - Acho que ainda tem a ver com o território que perdemos em mil novecentos e bolinha.

Alcançamos o salão e procuramos nossos lugares, que já eram marcados, deixando nossa conversa para mais tarde. Veja bem, a cada três meses, a escola promovia um encontro entre todas as meninas da escola, de todas as séries. A ideia era que nós conhecêssemos as outras garotas, interagíssemos com outras culturas e tal. Mas no fim das contas, acabava sendo só mais uma forma de tortura. Esse lance de ser obrigada a sentar-se há uma mesa com outras três meninas fora do seu círculo social, não é exatamente divertido.

Todo mundo estava falando sobre a Alice ter tirado um cara para dançar, sexta-feira, no baile da condessa Barbisan. Bem, ninguém falou exatamente para mim - porque eu sou a escória da escola e, de qualquer forma não é como se eu não tivesse coisas mais importantes para me preocupar -, mas era o boato que estava rolando. E, tipo, a princesa Alice é filha do rei e rainha do Reino de Sortie, uma colônia francesa. Ela é a garota mais popular da escola, a queridinha da mídia, loira, olhos azuis, pele perfeita, rosto angelical, sempre impecável... Resumindo: a Alice faria inveja à Barbie. O grande problema era que, na frente das câmeras e dos holofotes, a Alice era imensamente doce e educada e pró ativa e preocupada com a natureza. Mas longe de tudo isso ela era meio egocêntrica e prepotente. Sério, ela chegava a ser cruel com as outras garotas da escola muitas vezes. Tipo comigo, a Sayuri e todas as outras garotas desprovidas de uma beleza devastadora, como a dela. Mas isso nunca impediu que todos os rapazes se apaixonassem por ela o tempo todo.

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