— Enquanto ainda estamos juntos, vivendo esse último ano, precisamos continuar sendo os mesmos — Caio replica. — Sei que quando esse ano acabar, muito do que éramos irá embora. Querendo ou não, a amizade é uma coisa passageira, mas enquanto ainda estivermos juntos, não devemos temer o futuro, devemos realizar momentos que ficarão na memória. Por isso vocês todos estão aqui hoje.

— A amizade só é passageira quando se permite que ela seja — retruco.

Angelina tateia seus dedos na mesa, forçando uma expressão reflexiva.

— Sabe, Igor? Você é tão fofo — e pisca com malícia — que as vezes acabo te achando meio "afetado".

— "Afetado"? O que quer dizer com isso?

— Sei lá. Sensível demais... Digamos... Gay.

A comida quase para na garganta quando ouço as palavras maldosas da menina. Caio me encara consecutivamente como se esperasse alguma reação embaraçosa minha. Todos os outros o seguem e fixam o olhar em mim, com exceção de Laryssa, que mantem uma expressão insossa na face. Anita não pisca, embora imite Laryssa com seu olhar indiferente, enquanto Tiago parece querer dizer algo.

— Posso saltar na cara dela agora ou espero acabarmos de comer? — embora ameaçadora, a voz de Laryssa soa serena enquanto come seu sanduíche lotado de bacon.  

— Calma, linda! Não estou querendo ofender ninguém. É que é difícil, quase raro, encontrar garotos tão sensíveis como o Igor.

— Você compreende o que fala? — Laryssa questiona.

— Claro que sim. Aliás, adoro os gays! Os acho super divertidos e amáveis, por sinal.

— Nem todo gay é "super divertido e amável" — Tiago adverte. — Isso é uma generalização absurda. Às vezes é melhor ficar calada, algo que você deveria aprender.

— Tanto faz. Aqui não tem nenhum gay mesmo. Ou tem? — ela me encara com o cinismo de sempre e depois volta a comer.

— Meu irmão é gay — Laryssa retruca — e ele nem sempre é pomposo. Ele é humano como qualquer um de nós e também vive seus dias amargos. Às vezes ele consegue, até mesmo, ser mais insuportável que eu. Não é por ser gay que se tornou um personagem caricato de algum sitcom.

Angelina se cala, mas mantém o ar de desdém até quando saiu do cômodo, mantendo a sua pose. Enquanto isso, eu torcia para que Laryssa repetisse o que fez ontem. Ela merecia.

No meu quarto, separo uma muda de roupa no fundo da mochila, visto-me e deito na cama na espera de Caio e Danilo. No ócio, capto o celular do bolso e por impulso vou até a galeria de fotos. Numa pastinha haviam algumas fotografias do ano anterior, de todos nós cinco. Era meu aniversário de dezesseis anos. Anita e Caio ainda namoravam, assim como Elena e Danilo. Eu estava no meio dos dois casais; sorrindo. Não consigo lembrar o que estava sentindo, então prefiro apenas pensar que meu sorriso era genuíno, que eu realmente estava feliz ali, aproveitando o momento com os meus amigos.

Mal noto quando Anita rasteja pelo quarto, melancólica. Senta-se ao meu lado na cama e de viés confere o que estou vendo no celular. Ela sorri delicadamente.

— Esse dia foi incrível — ela parece relembrar de algo. — Não tem nem um ano, mas parece que já faz tanto tempo. Éramos tão mais próximos...

— Meus pais ainda pareciam normais. Ou, pelo menos, tentavam parecer.

Anita acaricia minha face e finaliza num abraço carinhoso.

— Amanhã teremos um jantar em família na minha casa — diz enquanto se afasta. — O meu pai convidou meu tio e alguns membros da igreja. Gostaria que você estivesse comigo.

Todas As Coisas Mais Simples (Romance Gay)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora