Todas As Coisas Mais Simples (Romance Gay)

Vinte e Um

Atravessamos a entrada principal do Albuquerque. O sol nascente tingia o céu de laranja e refletia nos vidros das janelas, criando um espetáculo de luzes e sombras que parecia nos engolir. Como se fosse um palco iluminado, todas as atenções se voltam para nós: Laryssa e eu, os primos Tierne. Eu, o gay, ao lado dela, a grávida vadia que ousou desafiar as convenções sociais e agora carrega no ventre uma vida. Quanta hipocrisia! Os alunos nos observavam com olhares indiscretos e comentários sussurrados que cortavam como lâminas. Caminhamos com passos firmes, conscientes de que estávamos desafiando não apenas eles, mas o mundo e todas as normas impostas por ele.

O corredor principal se estendia à nossa frente, longo e imponente, como se nos desafiasse a continuar. E lá estava Angelina, a abelha rainha, cercada por suas abelhas operárias e os zangões do time de futebol. Ela nos encara com um misto de nojo e superioridade, como se a nossa presença ali fosse uma afronta aos seus valores. Mas eu não me importo. Não importo com mais nada. Sei agora que não preciso dever satisfação a ninguém. Que o que sinto por Tiago é mais forte do que qualquer opinião alheia, mais intenso do que qualquer julgamento. E que eu possuo uma família, que irá me acolher, mesmo não sendo os meus pais biológicos.

Acompanho Laryssa até o seu armário, onde Caio a aguardava com um sorriso largo e braços abertos. Eles se envolvem em um abraço afetuoso. Caio pede que eu os deixe sozinhos, e eu concordo em silêncio.

Continuo seguindo pelo corredor movimentado, sentindo o olhar de desconhecidos sobre mim. Sem Laryssa ao meu lado, sinto que a exposição me deixa vulnerável, com a sensação de que qualquer erro será ampliado por esses olhares julgadores.

Quando chego ao meu armário, sou recebido por um desenho grotesco e insultante com uma legenda escrita em letras garrafais: "BICHA". Minhas mãos tremem enquanto fecho o armário, um peso e uma onda de raiva me invade. Como pode alguém ter tanta insensibilidade ao ponto de procurar ofender alguém que não lhe fez mal, e ainda por cima com algo tão insípido e sem valor para a vida de qualquer um?

Meus pensamentos são interrompidos pelo aparecimento de um rosto familiar e amigável. É Danilo. Ele sorri para mim, e sua presença reconfortante me acalma. Danilo me oferece uma tapioca e me convida para conversar em um lugar mais tranquilo antes da aula começar. Eu aceito, e ele me leva até o pátio da escola, onde nos sentamos sob a sombra de um salgueiro.

O silêncio pairava sobre nós enquanto degustávamos nossas tapiocas. O sabor doce e reconfortante da massa me distraía momentaneamente da verdade que agora Danilo conhecia. Eu não sabia como ele soube, mas sabia que ele sabia. O ar estava carregado com a tensão de um segredo revelado, mas Danilo se manteve firme ao meu lado, oferecendo-me seu apoio incondicional.

Danilo nunca foi alguém que precisa de explicações. Desde que me lembro, ele sempre se manteve positivo e acolhedor, aceitando a vida com suas consequências. Quando fui brutalmente espancado por Nicholas e seus amigos, acusado de ser gay, Danilo fechou a cara para todos. Estava disposto a ser chamado de bicha e a enfrentar as piadas para me proteger. Ele não se importava com os rótulos, preferia ter a minha amizade do que qualquer outro status social.

Sem dúvidas, ele é a primeira pessoa que merece ouvir por mim e saber toda a verdade sobre o que eu e Tiago vivemos e sentimos um pelo outro.

Ele me olha com seus olhos gentis e compassivos. Sem dizer uma palavra, sinto que ele quer dizer que está tudo bem, que tudo ficará bem, e que estará comigo para o que der e vier.

— Terminei com a Angelina. — Ele diz.

— Sério? — pergunto.

Ele assente com a cabeça.

— Você sumiu. — conclui. — Fiquei preocupado, cara. Espero que esteja tudo bem com você... com sua família.

Ele coça a nuca, buscando as palavras perfeitas para dizer, mas suas expressões são tão claras quanto uma tela em branco esperando ser pintada. Seus olhos me estudam cuidadosamente, como se pudesse enxergar através de todas as minhas camadas e me conhecer verdadeiramente.