Então ensine ela a pecar

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 O almoço do primeiro dia de dezembro é decisivo para mim. É hoje que Ramirez dirá o que precisamos fazer para sermos promovidos. Quer dizer, para eu ser promovido. Então, falta exatamente um minuto para ele entrar nesta sala onde estou sentado - em uma mesa gigante com duas pontas, com onze representantes de lugares diferentes exalando competição pelos poros - e dar as diretrizes do que ele quer.

A porta se abre. Isso me dá um nervoso daqueles.

Ramirez entra e se senta. Nem olha para nós. Somos como vermezinhos perto dele. Eu sei que eu disse que ele foi um nerd um dia, mas as coisas definitivamente mudaram. Assim, ele ainda tem as sequelas de uma adolescência de isolamento social, como óculos fundo de garrafa e uma pancinha saliente, mas agora os óculos são da coleção mais cara da Dior e a pancinha tá coberta por uma blusa social cujo preço vale mais que qualquer bolsa que você tenha (ai).

Ele dá uma fungada e pigarreia enquanto tira alguns papéis da maleta de couro. Imagino que sejam planos que ele quer que cumpramos. Ninguém fala nada ainda. Apenas respiramos.

— Estão atrasados — ele resmunga, olhando no fundo de nossos olhos. Desesperados, todos se olham, buscando uma explicação; é que todos chegaram bem cedo, com no mínimo uma hora de antecedência. Na verdade quem estava atrasado era ele. — Brincadeira! — ele exclamou. Que ótimo, uma piada. Porém, ninguém riu. Todos ficaram estressados. Ramirez revirou os olhos. Como eu disse: sequelas do isolamento social - ninguém ri de suas piadas.

Eu sorri sutilmente para uma bela mulher sentada à minha frente, e ela se desestabilizou um pouco, tensionando os ombros. Pisquei e ela mordeu o lábio. Uhh, adoro uma mulher ousada. Mas aí o chefe começou a falar.

— A La Madre se tornou uma grande marca de perfumaria e de cosméticos nos últimos cinco anos. De fato, nosso crescimento foi exponencial, foi... interestelar! — ele esperou para ver se alguém sacava, mas... duvido muito que alguém ali tenha assistido Star Trek na juventude. Ele pareceu muito frustrado e prosseguiu: — Bem, como eu dizia, não há dúvidas a respeito da qualidade de nosso trabalho como líder de vendas. Na última semana, a Exame escreveu um artigo estrondoso sobre o sucesso da La Madre no empreendedorismo. Alguém sabe o que ela disse sobre nós?

Levantei a mão. Ramirez assentiu.

— Algo entre Chanel e Avon, e cem por cento profissional.

Aquela mulher lambeu os lábios com a minha resposta. Acho que hoje tenho um encontro.

— Isso mesmo, sr.Vaz. — Ramirez pouco se importou com a minha demonstração. — Chanel? Qualidade. Avon? Popularidade. Todos concordam que na América do Sul somos um dos nomes mais populares entre as pessoas? — Ninguém discordou. Ramirez bufou e tirou os óculos. — Esse é o problema.

O que?

— Enquanto um artigo indefinido nos definir, nossa empresa será um fracasso — agora todos fizeram "oh!" horrorizados. — Nós, temos, que, ser, o, nome, mais, popular. A marca mais usada. O perfume mais comprado. O batom mais famoso!

Acho que agora eu tô sacando. É tipo uma crise existencial, quando você é a Katy Perry, só que ainda não ganhou um Grammy. E parece que o nosso Ramirez aqui quer muito o seu Grammy.

— As últimas pesquisas de mercado revelaram que o povo que mais usa perfumes e cosméticos é o povo brasileiro. Brasil, Brasil... É quase um continente. Quase 300 milhões de pessoas. E mesmo nessa crise horrível, os brasileiros continuam comprando: perfume, creme, maquiagem. Isso é ótimo, se não fosse de quem eles têm comprado. Da nosso maior concorrente continental, a Vitta. — Ramirez distribui papéis para cada um de nós. Isso é novidade. — O desafio desse Natal é bem simples. Destruam a concorrência. Comam um delicioso peru. E sejam promovidos.

A Maldição dos Homens Bonitos #CPOWحيث تعيش القصص. اكتشف الآن