Capítulo 4

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Vera nos guia pelo o que parecia ser um labirinto repleto de corredores sem fim, com inúmeros aposentos. A cada quarto duas moças, a cada dupla de moças uma ama, que apressadamente tentava cumprir com seus resignados deveres. Algumas das virgens que passaram por mim eram deslumbrantes, seus vestidos sendo cuidadosamente colocados enquanto suas criadas penteavam seus cabelos. Eu ouço risadas, conversas altas, até as damas se arrumavam alegremente. Tudo parecia estar normal para elas e algo me dizia que apenas eu e Diane pensavamos o contrário.

Finalmente o infinito caminho acaba, no seu fim havia uma porta alta, indo até o teto. A senhora que nos trouxe até aqui passa as mãos por sua roupa e tira de lá uma chave. Noto que é a mesma que ela usou para destrancar nosso quarto mais cedo. Penso na possibilidade de ser uma chave universal, se assim for, isso pode com certeza ser uma boa oportunidade para fugir daqui.

A porta a nossa frente é destrancada e aberta. Uma enorme sala se extende diante de nós, o espaço era bem aberto e arejado. Haviam mesas redondas espalhadas por todo lugar, cada uma com um par de cadeiras. É claro que não estavam vazia, na verdade, o salão estava lotado. As mulheres sentadas conversavam animadamente, eu só conseguia ouvir o som confuso de todas vozes juntamente com o barulho das colheres batendo no interior das xícaras de chá e o tilindar dos talheres raspando nos pratos. Se todas essas meninas estão aqui, então elas devem ter passado pelo mesmo que eu e foram trazidas para concorrer ao título de rainha, mas por que ninguém toma nenhuma atitude? Nós estamos num número muito maior aqui, se nos rebelarmos, quem sabe não se criaria uma abertura?

- Sentem-se - diz Vera, apontando para uma mesa no canto da sala, havia dois pratos com uma espécie de sopa dentro e alguns talheres, eu e Diane sentamos uma de frente para outra - Podem comer.

Ao ver Diane atacar o seu prato, eu faço a mesma coisa, não como desde ontem a noite, estou morta de fome, tenho que admitir. Eu não sei quando vão me alimentar de novo, não posso deixar essa chance passar.

- Não, não, não! Desse jeito não! - Eu paro de comer e a observo - Vocês até parecem porcas comendo! Onde estão seus bom modos? Onde suas mães estavam com a cabeça, em?

Eu abro minha boca para responder, mas me calo quando percebo que todas as outras garotas que estavam presentes no amplo cômodo agora olhavam para nós três, eu odeio ser o centro das atenções. Sinto meu corpo encolher diante de todos os olhares e julgamentos. Fico encarando meu prato de sopa, muda.

- Vou lhes ensinar a como comer corretamente - ela continua o sermão - Primeiro, a faca deve ser utilizada na mão direita e o garfo na esquerda - diz ela olhando para Diane - Quanto à alimentos que precisem de apenas um talher, use-o na mão direita. E também, na hora de cortar os alimentos, evite picar vários pedaços de carne ou salada de uma vez só. Corte-os à medida que você for comendo. Outra dica importante é ao levar a comida à boca, não incline seu corpo até a mesa. Mas sim, traga o talher até a sua boca. Entenderam?

Nós assentimos com a cabeça. Acho que tudo o que queriamos era voltar a comer, sem mencionar que todos parassem de nos encarar.

- Como eu devo me sentar? - pergunto, levantando meu olhar numa súbita coragem.

- Posicione-se na cadeira com as costas eretas, sem se debruçar sobre a mesa. Não encoste os braços e os cotovelos na borda da mesa, apenas o punho pode ficar levemente encostado.

Depois de passar a tarde inteira aprendendo várias coisas sobre etiqueta, as quais provavelmente vou me esquecer na hora H, eu e Diane passamos mais ou menos uma hora sendo arrumadas por Vera. Ela trocou nossas roupas denovo, dessa vez eram vestidos de gala diferentes de tudo que já tive acesso antes, nossos cabelos estavam devidamente arrumados em tranças altas, eu mal conseguia respirar entre o banho de perfume e o corsete que me sufocava. Agora nós estávamos no meio de um salão festas, eu, Diane e mais umas 100 garotas, aguardando a Rei André chegar.

Era uma sala bem extensa, o chão era forrado por pisos pretos e brancos que intercalavam entre si, formando um padrão que parecia um tabuleiro de xadrez. As janelas eram enormes e principalmente, altas. No entanto, infelizmente estavam todas fechadas, as cortinas num tecido aveludado vermelho estavam amarradas para que ninguém consiga sair. Além disso, haviam soldados e guardas por toda parte, eu podia até encarar meu rosto no reflexo da lâmina de suas espadas, alguns possuiam armas que eu nunca tinha visto antes.

- Diane, quanto tempo isso vai demorar? Eu não 'tô conseguindo respirar dentro desse vestido.

- Eu não tenho ideia. Só espero que isso acabe logo - ela boceja, sentindo-se entediada.

Finalmente escutamos um barulho, algumas cornetas tocaram e a porta do salão se abriu, todos olham em sua direção. De lá saiu um homem, aparentava ter uns 45 anos, cabelos pretos com alguns indícios de fios brancos na raiz, alto e com roupas pretas com detalhe em dourado. Cochichos ecoaram entre as paredes do enorme lugar.

- O Rei André acaba de chegar - o homem diz.

As garotas formam então uma fileira horizontal, umas dos lados das outras. Atrás do rapaz de preto entra um mais novo, mais alto, esbelto, esse tinha cabelos loiros e devidamente penteados, usava um traje de realeza na cor azul cobalto, mesmo de longe eu podia enxergar os traços finos de linha nas bordas, costuradas a mão. A pele dele é branca, seus olhos azuis e no topo de sua cabeça permanecia uma coroa amarela, quase da mesma cor de seu cabelo.

- Olá, damas de Urbe - sua voz masculina preenche o salão.

Ouvi-se suspiros de algumas das jovens ali presentes. Não é possível que elas estejam apaixonadas por ele, ele nos raptou e nos obrigou a aprender um monte de bobagens! Não importa o nível de burrice, ninguém deveria ser tão tonto assim, o que ele prentende com todo esse show? Ele caminha em direção a nossa fileira, passando em frente as damas, observando-as, analizando-as, uma por uma. Houve algumas garotas que lançaram sorrisos ou olhares sedutores. "Pff, perda de tempo" eu penso quando ele passa na minha frente, fechando a cara.

Depois de dar uma boa olhada em todas nós, ele pega na mão de uma das garotas, sorrindo. Ela é levada até um dos quatro canto da sala, ficando lá. O princípe repetiu isso com mais outras vinte e por fim disse:

- As garotas que eu selecionei, estão fora. As que ficaram na fileira, parabéns, estão dentro, por enquanto - Disse ele, e por um momento, nosso olhos se encontram, ele da um sorriso, eu não retribuo, pelo contrário, reviro os olhos impaciente. Ele solta uma curta risada sem som e dá as costas saindo do cômodo.

"Idiota" reclamo mentalmente. Então quer dizer que o primeiro julgamento dele sobre a futura esposa foi apenas a aparência? Isso é ridículo, uma rainha tem que ser muito mais do que um rosto bonito. Mesmo assim, as garotas que tiveram um destino "infeliz" são retiradas a força da sala pelos guardas. Algumas choram, outras imploram, mas no fim, todas são retiradas da sala, sobrando assim, contando comigo e com Diane, oitenta moças.

- Deus! O que foi isso? - Eu me viro falando com Diane que estava ao meu lado o tempo inteiro.

- Isso vai ser difícil - Ela responde vendo Vera caminhando em nossa direção.

- Parabéns, vejo que as duas passaram, sorte a de vocês. - Fala Vera, sorrindo.

- Sorte? Eu não vejo por esse lado - minha única companheira responde, passando a mão por sua pele escura e brilhante.

- Silêncio! - Diz a outra, autoritária - Vamos, levarei vocês ao quarto.

E assim ela fez, seguimos Vera até chegar no corredor de antes,ainda iluminado pelos candelabros na parede. Alguns minutos se passavam quanto mais fundo adentrávamos, passando pelos incontáveis quartos. Chegando na nossa porta, a última, adentramos sem muita escolha e ouvimos Vera dizer antes de nos trancar lá dentro.

- Boa noite, senhoritas.

Um Amor Inesperado.Where stories live. Discover now